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Como é Rodrigues, uma das ilhas paradisíacas mais remotas do planeta

JON ARNOLD IMAGES LTD/ALAMY
Imagem: JON ARNOLD IMAGES LTD/ALAMY

Anthony Ham

BBC Travel

05/06/2022 11h02

Na primeira vez que visitei a pequena ilha vulcânica de Rodrigues, estava convencido de que havia algo errado quando o avião começou a descer.

Lá embaixo, o Oceano Índico se estendia de forma contínua até o horizonte inalcançável. Não havia sinal de terra, muito menos uma pista grande o suficiente para pousar com segurança um avião 737. Onde o piloto imaginou que iríamos aterrissar?

Olhei ao redor da cabine. Ninguém estava em pânico. Os moradores locais dormiam neste momento, ou ninavam despreocupadamente crianças no colo.

Não houve nenhum anúncio do capitão, a não ser pedir educadamente aos passageiros que apertassem os cintos e à tripulação que preparasse a cabine para o pouso. Respire.

Passaram-se 10, talvez 15 longos minutos até que algo, alguma coisa, interrompesse a monotonia lá embaixo: um arco de ondas brancas, de quilômetros de extensão, quebrou não em terra, mas no próprio oceano.

Então, finalmente, Rodrigues, e seu pequeno e pacato aeroporto no extremo oeste da ilha, apareceram.

Nada pode te preparar para a primeira vez que você chega a Rodrigues.

A pequena ilha vulcânica é cercada por uma lagoa, onde os moradores pescam polvo - WALTER BIBIKOW/GETTY IMAGES - WALTER BIBIKOW/GETTY IMAGES
A pequena ilha vulcânica é cercada por uma lagoa, onde os moradores pescam polvo
Imagem: WALTER BIBIKOW/GETTY IMAGES

Isolada a 600 km a nordeste das Ilhas Maurício, à qual pertence, e perto de nenhuma outra forma de relevo, Rodrigues é um mundo em si. É também uma das ilhas habitadas mais remotas do mundo.

Quando vista de cima do lado oeste, Rodrigues é um lugar estranho e belo de círculos concêntricos de oceano, lagoa e terra que se abrem e fecham.

As ondas marcam os limites externos da localidade, circundando uma lagoa verde-água praticamente perfeita.

A lagoa, por sua vez, circunda a ilha principal, uma longa coluna verde cercada de praias e acompanhada por ilhas menores.

A ilha se eleva até seu cume a leste antes de afundar de volta na lagoa. E as ondas mais uma vez anunciam a retomada do horizonte eterno.

Se Rodrigues fosse uma prisão, seria impossível escapar. Mas o isolamento sempre foi um aliado da ilha, protegendo-a do mundo e da sua barulheira.

Rodrigues entrou para a história humana documentada em 1528, quando os primeiros navios chegaram.

Ninguém morava na ilha naquela época e, se a tripulação de algum navio que passava desembarcou aqui antes desta data, não deixou registro de sua passagem.

Rodrigues ficava demasiado ao sul e demasiado a leste das movimentadas rotas comerciais e ventos alísios que ligavam a África Oriental à Península Arábica e à Ásia.

Mesmo quando os navios portugueses, holandeses e franceses, desviados de sua rota, se abrigavam esporadicamente em Rodrigues ao longo do século 16, eles permaneciam apenas tempo suficiente para reabastecer seus suprimentos de alimentos.

Na maioria das vezes, isso significava tartarugas gigantes e o solitário-de-rodrigues, um pássaro fatalmente rechonchudo que os marinheiros rapidamente levaram à extinção, assim como fizeram com o dodô nas Ilhas Maurício.

Em 1691, o francês François Leguat chegou à ilha com sete huguenotes, fugindo da perseguição religiosa do governo católico francês.

Ao descrever sua chegada, Leguat escreveu que Rodrigues tinha tantas tartarugas gigantes que "era possível dar mais de 100 passos em sua carapaça sem tocar o chão".

Leguat e seus exilados planejaram a primeira colônia em Rodrigues, mas a localização remota (e a falta de mulheres) foi demais para eles: depois de dois anos, incapazes de suportar o isolamento por mais tempo, eles construíram um barco com toras de madeira e fugiram da ilha, para nunca mais voltar.

Hoje em dia, a distância de Rodrigues do resto do mundo é fundamental para o seu charme.

Em tempos pré-covid, aproximadamente 1,5 milhão de turistas visitavam as Ilhas Maurício todos os anos. E apenas 90 mil deles (menos de 6%) viajavam para Rodrigues.

Aqueles que se aventuravam encontravam uma ilha que lembrava as Maurício antes de os turistas começarem a chegar.

Não há engarrafamentos na ilha. Nada é feito com pressa. A criminalidade é quase inexistente.

"Rodrigues é um lugar muito seguro", diz Françoise Baptiste, uma das chefs mais conhecidas das Ilhas Maurício, que vive em Rodrigues há 54 anos.

"Sempre que está quente, o que acontece com frequência, dormimos com as portas abertas."

Parte desta sensação de segurança vem da familiaridade tranquila do lugar. Rodrigues tem uma população de menos de 45 mil habitantes.

Diferentemente do caldeirão demográfico da ilha principal de Maurício, Rodrigues é 90% crioula, seus habitantes carregam em seu passado um mosaico de traços de escravos africanos e colonos europeus.

"Nós herdamos a dança sega da África, o chá da tarde e o bacon dos ingleses e os doces dos franceses", afirma Baptiste.

Rodrigues é uma das ilhas habitadas mais remotas do planetaq - RICARDO STEPHAN/GETTY IMAGES - RICARDO STEPHAN/GETTY IMAGES
Rodrigues é uma das ilhas habitadas mais remotas do planetaq
Imagem: RICARDO STEPHAN/GETTY IMAGES

"Rodrigues é uma vila", acrescenta Laval Baptiste, empresário e marido de Françoise.

"Todo mundo conhece todo mundo."

E, embora muitas vezes tenham que viajar para a ilha principal, Françoise e Laval sempre anseiam pelo estilo de vida lânguido de sua ilha natal.

"Ficamos sempre muito felizes em voltar depois de alguns dias de correria", conta Laval.

Até mesmo a capital de Rodrigues, Port Mathurin, ganha vida apenas de vez em quando — a "hora do rush" dura cinco minutos; há um alvoroço de pequenas atividades sempre que um navio chega ao porto; e o mercado de sábado está praticamente deserto às 10h.

Do outro lado da ilha, Rodrigues é um lugar de prazeres tranquilos.

De Port Mathurin, a estrada serpenteia ao longo da costa norte, rumo a nenhum lugar em particular, passando pelo pequeno povoado de Anse aux Anglais, oferecendo águas calmas e vistas do pôr do sol ao fim de um dia perfeito.

Na parte oeste da ilha, um projeto ambicioso na Reserva François Leguat visa restaurar um trecho da ilha que desce suavemente até a margem da lagoa.

Ao longo dos séculos, colonizadores e marinheiros levaram as tartarugas da ilha à extinção e derrubaram a maioria das árvores.

Nos últimos anos, os dirigentes da reserva estabeleceram a ambiciosa meta de restaurar este canto da ilha para que se pareça, o máximo possível, com a Rodrigues do século 17, antes da chegada de Leguat e seus amigos huguenotes.

Para isso, trouxeram tartarugas gigantes de outras partes do Oceano Índico e plantaram mais de 100 mil árvores nativas de Rodrigues.

Ao longo da costa oeste, perto do pontal conhecido como Pointe du Diable, surgem muitas vezes à beira da estrada estreita armações de madeira, nas quais polvos brancos pendurados balançam com a brisa do oceano.

O polvo é um elemento central da cultura de Rodrigues e um prato básico da sua gastronomia, à medida que "cada morador come polvo duas ou três vezes por semana", segundo Laval.

A pesca do polvo é "praticada principalmente por mulheres desempregadas", acrescenta Françoise.

"Elas fazem isso de manhã cedo. Assim, têm tempo para fazer as tarefas domésticas depois e contribuem para o orçamento familiar ao mesmo tempo."

Capturado com um arpão na maré baixa nos corais rasos da lagoa de Rodrigues, o polvo é uma espécie de obsessão da ilha, tanto que as autoridades locais se sentiram obrigadas a garantir o futuro do seu prato nacional, um curry de polvo perfumado, colocando medidas em vigor para evitar a pesca predatória.

Ninguém pode pescar polvo de fevereiro a março ou de setembro a outubro.

Durante estes meses, diz Laval, os pescadores de polvo são pagos pelas autoridades locais para não pescar fazendo outros trabalhos, incluindo a limpeza das praias locais.

No extremo oposto da ilha, na pequena aldeia de St François, está o Chez Robert et Solange.

Nesta modesta barraca na praia com o charme típico de Rodrigues, servem-se polvos de todas as formas — polvo grelhado, polvo ao curry, polvo e salada de papaia —, além de lagosta e outros frutos do mar frescos.

Toda vez que visito Rodrigues e vou ao Chez Robert, finjo estudar o cardápio. Pergunto o que está fresco. E passo longos momentos, como absorto em pensamentos, olhando para o mar por entre as palmeiras.

Então, no que parece um ritual de iniciação na ilha, peço o polvo. Cada vez que faço isso, sinto que cheguei a Rodrigues pela primeira vez.