Como é a quarentena no país cujo ditador indica vodca contra covid-19
Localizado no Leste Europeu, Belarus é um dos poucos países do mundo onde, neste momento, o governo não está aplicando amplas medidas de isolamento social por causa do coronavírus.
Além de não impor restrições à abertura do comércio ou à circulação de pessoas, a ex-república soviética chama a atenção por outro motivo: as declarações de seu presidente, Alexander Lukashenko, sobre a pandemia.
No poder desde 1994, Lukashenko classificou a preocupação com a covid-19 como "psicose" e recomendou a ingestão de vodca e o uso de sauna como meios de proteção contra a doença.
Eventos esportivos abertos ao público continuam sendo realizados no país: no final de março, houve até uma partida de hóquei no gelo que contou com a atuação do próprio presidente bielorrusso.
Mas como é a vida de uma pessoa comum em Belarus neste momento? Nossa conversou com três residentes no país, incluindo um viajante brasileiro, para descobrir. Veja o que eles contaram.
Mesmo sem quarentena, pessoas preocupadas
Morador temporário da cidade de Lviv, na Ucrânia, o brasileiro Igor Galli estava realizando uma viagem pela Europa quando eclodiu a pandemia de coronavírus, gerando lockdowns e cancelamentos de voos.
Com as fronteiras ucranianas fechadas, ele conseguiu comprar uma passagem aérea da França para Belarus, onde se instalou na cidade de Brest.
"É um município que fica perto da divisa com a Ucrânia [a cerca de 80 quilômetros de distância]. Quando abrir a fronteira, consigo voltar para casa de maneira fácil", diz.
O brasileiro relata que, em Belarus, não tem quarentena. "Aqui em Brest, inclusive, houve um jogo de futebol na semana passada. Eu passei pela porta do estádio no dia da partida. Se quisesse, era só ter entrado", diz.
Porém, Igor avalia que grande parte da população está, sim, com receio do coronavírus. "Ninguém se cumprimenta, há álcool em gel por todos os lados e muita gente anda na rua de máscara. Cada um faz o que acha melhor para se proteger".
Ele também diz que, mesmo sem quarentena obrigatória ou recomendada pelo governo, muitos estabelecimentos comerciais estão fechando voluntariamente. Quando chegou a Brest, por exemplo, Igor começou a frequentar um estúdio de dança, um antigo hobby seu. "Mas o dono resolveu fechar as portas do estúdio".
Também não há muito movimento em bares e baladas. E o pessoal está mais quieto, mesmo".
Presidente que não é levado a sério
Morador de Minsk, capital de Belarus, e profissional do setor de turismo, o polonês Arnold Góralski não acha que as declarações polêmicas do presidente bielorrusso tenham grande influência sobre a população local.
"Grande parte dos bielorrussos considera o presidente uma pessoa estranha, muito estranha. Então, ele não é levado muito a sério. Parece que, quanto mais ele ignora a situação do coronavírus, mais as pessoas ficam com medo [da doença]", relata Góralski. "Muitos restaurantes e bares não estão abrindo porque as pessoas não querem mesmo sair de casa e preferem pedir entregas em domicílio. Isso faz com que, em muitos aspectos, Minsk esteja parecida com outras cidades do mundo, onde há quarentena".
A diferença é que, aqui, há uma opção de escolha: as pessoas que não têm medo do coronavírus podem sair à rua. Mas muita gente está tomando, por conta própria, a decisão de se isolar e ficar em casa".
Falta de confiança em informações oficiais
Moradores de Belarus convivem com incertezas relacionadas ao número de infectados e mortos pela covid-19 no país.
"Ninguém sabe exatamente quantos casos da doença há aqui em Belarus", diz Góralski. "O governo diz que está tudo sob controle, mas muita gente não acredita nas informações que são passadas".
O polonês ainda diz que, frequentemente, os canais de televisão oficiais do governo bielorrusso nem trazem notícias sobre a covid-19. "Às vezes, eles ignoram o coronavírus e preferem falar sobre outros assuntos. Parece que vivemos em um mundo perfeito".
De acordo com o Ministério da Saúde de Belarus, havia, até o dia de 28 de abril, 12.208 casos confirmados, 1993 curados e 79 mortos pelo coronavírus no país.
Assim como Góralski, o brasileiro Igor Galli afirma não ser possível confiar totalmente nos números de casos de covid-19 divulgados pela mídia de Belarus: "Não há como saber sobre o nível da pandemia aqui", avalia.
O brasileiro conta que está com um nível maior de preocupação neste momento. Quando vai ao mercado, evita aproximar-se das pessoas e usa álcool em gel todo o tempo. "Estou me cuidando e resguardando", diz.
Rotina dentro de casa, mas com saídas
Mesmo sem toque de recolher em Belarus, as três pessoas entrevistadas por Nossa disseram que têm passado boa parte do dia dentro de casa.
"Eu trabalho do meu computador, estudo russo e estou conseguindo fazer tudo isso de dentro de casa", relata Galli, que alugou um imóvel em Brest até conseguir voltar à Ucrânia. Mas ele conta que sai à rua para fazer compras, realizar atividades físicas e comer em restaurantes que seguem abertos.
Já a estudante universitária bielo-russa Anna Gavryushina, que mora em Minsk, diz que "sua universidade mandou os alunos para casa e, agora, está realizando aulas à distância". Ela tem aproveitado seu tempo para contribuir com o sistema público de saúde do país: recentemente, Anna participou de uma campanha para fabricar e doar máscaras para médicos e enfermeiros de hospitais locais.
Góralski, por sua vez, que trabalha na organização de viagens turísticas, também diz que tem feito home office. "Há muitas empresas de tecnologia em Minsk e a maioria delas mandou os empregados para casa, trabalhar remotamente".
O que fazer em Belarus quando a pandemia passar?
Apesar de ser um país obscuro para muitos brasileiros, Belarus é um lugar com interessantes atrativos turísticos.
Esta é a terceira vez que o brasileiro Igor visita este território do Leste Europeu e, como passeios para fazer por lá depois da crise do coronavírus, ele indica a Floresta de Bialowieza, que fica na fronteira com a Polônia.
Trata-se de uma das últimas áreas de floresta primária da Europa, com fauna e flora riquíssimas. "A região é lar, por exemplo, dos bisões-europeus", conta.
Ele também recomenda, como ponto turístico, o forte da cidade de Brest, construído no século 19 e que, durante a Segunda Guerra Mundial, foi palco de uma batalha histórica entre o Exército Vermelho e forças armadas nazistas.
Além disso, cita a capital como local a ser visitado. Lá, existem atrativos como a gigantesca Praça da Independência (uma das maiores praças da Europa, com cerca de 7 hectares) e a linda Igreja Vermelha, erguida no começo do século 20 e com uma chamativa arquitetura neorromânica.
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