Da foice na cana às mãos no barro: a transição de Sil da Capela em artesã
Fernanda Fadel
De Nossa
04/05/2020 04h00
Hoje com 40 anos e artista, Sil se dedicou ao trabalho duro no canavial desde os oito anos de idade, para ajudar no sustento da família de 11 irmãos na cidade de Capela, interior de Alagoas. "Quem vive no corte de cana, vive só para sobreviver. É um trabalho muito pesado, grosseiro e pouco reconhecido".
Por 13 anos, esteve manejando o peso de uma foice varando de sol a sol em meio ao campo até que a maternidade mudou os anseios da alagoana.
Moldando um novo destino
Mãe de uma garota autista, há 20 anos, ela entrou para uma associação de mães de crianças com deficiências onde frequentou oficinas de artesanato. Em uma delas, conheceu o Mestre João das Alagoas, um dos grandes nomes da cerâmica de seu estado, e foi da magia das mãos dele que Sil deixou a dureza da lavoura para o esmero de um ateliê.
Costumo dizer que eu renasci depois que conheci o barro"
"Eu nunca tinha visto uma peça de arte em barro na minha vida, e me apaixonei desde esse primeiro dia que conheci. Lembro que fiquei ansiosa para aprender a fazer", relembra Sil.
A primeira figura que moldou com as próprias mãos foi um burrinho, esculpido em terra de solo massapê, em homenagem ao pai, que era cambiteiro.
Encantada com o novo mundo infinito que havia encontrado nos moldes da massa amarronzada, Sil levava o barro para casa para treinar e, no período de três meses, dominou a técnica e vendeu sua primeira obra — um de seus burrinhos, por R$ 5.
O primeiro comprador foi o galerista e colecionador de arte popular de Maceió, Jerônimo Miranda. "Dali em diante, minha vida mudou. Ele começou a comprar mais peças, a fazer encomendas e meu trabalho começou a ser divulgado.
Obras com marcas registradas
Nenhuma peça de Sil é idêntica à outra, mas em muitas delas há sempre a imponente árvore jaqueira.
Outro carimbo evidente é o orgulho de suas raízes. "Quero mostrar a beleza do nosso nordeste, do nosso povo", exalta Sil, que também burila cajueiros, casebres, igrejinhas, presépios, cenas singelas na argila com um estilo que lhe é muito gracioso e próprio.