O dia de dona Vânia Oliveira, 63 anos, não deve ter as mesmas 24 horas que o de todos nós. Essa inquieta bisavó de três, avó de sete e mãe de quatro filhos em Maceió, Alagoas, faz render todos os minutos.
É uma lição de vida papear com ela. Sua arte tem cor, emoção, história e brilho próprios, que dão às tradições alagoanas a vibração merecida.
Tudo começou quando ela quis fazer a festa de aniversário de um ano da filha. "Casei com 17 anos para ficar mais independente. Antes, eu só queria saber de jogar basquete, na primeira seleção de Alagoas. Mas nesse dia, descobri que tinha habilidade para as artes. Comecei a fazer festas para ganhar dinheiro e trabalhei muito com isso. Foi uma vida corrida", conta.
Certo dia, Vânia precisou se mudar e começou a trabalhar em uma escola, onde ensinava as professoras a fazer brinquedos com materiais reciclados. "Todas tinham nível superior, menos eu. Buscava mostrar que elas podiam ensinar usando o lúdico", conta.
O tempo passou e, num belo dia, sua irmã telefonou com uma surpresa: havia inscrito Vânia no vestibular para pedagogia. Depois de 35 anos sem estudar, imagine só? Ela passou! "Assim levei o artesanato para a sala de aula", diz ela. Agora ninguém segurava a mulher.
Sempre gostei de cultura popular. Quando tinha qualquer manifestação cultural, sempre estava lá. Isso despertou meu olhar para o artesanato"
Cultura popular
Inspirada nas danças folclóricas de seu estado, Vânia observava os mestres guerreiros fazerem as roupas. "Cada um deles tinha uma identidade própria. Logo, procurei materiais para fazer do meu jeito", conta.
A produção fez sucesso e vieram os incentivos das amigas. A artesã é tão cuidadosa que usa matéria-prima mais leve, a fim de que os clientes levem sua arte para fora do país. "Uso espuma ortopédica para fazer o boi e depois tecidos. Ninguém faz nada igual a ninguém. E eu repasso todo meu conhecimento para que as pessoas façam e ganhem dinheiro também."
Patrimônio vivo de Alagoas
O chapéu de guerreiro mais difícil que saiu das mãos de dona Vânia tinha 90 centímetros de altura e levou mais de um mês para ser finalizado. "Geralmente, o de tamanho normal, que pesa de 8 a 10 quilos, sai em 8 dias. O meu fica mais leve, entre 3 a 5 quilos".
Não é à toa que ela foi homenageada pelo estado como Mestra Patrimônio Vivo. "Amo ensinar as pessoas. Tenho uma paixão imensa pelo artesanato. Quando falo disso, sinto muito orgulho", diz ela, que é secretária da Confederação Nacional do Artesão (Conarp Brasil), vice-presidente da Federação Alagoana do Artesão e membro da IOV (Organização Internacional de Folclore e Arte Popular), além de artesã e professora no Centro de Belas Artes de Alagoas.
Estilo único
Mesmo ensinando sua arte e querendo multiplicá-la para as próximas gerações, dona Vânia jamais se repete — é isso que traz encantamento a quem a observa. "Não gosto da mesmice. Faço 50 chapéus de guerreiro, mas nenhum igual. Fiquei conhecida por eles."
Por mês, saem do ateliê incontáveis bumba-meu-boi, camisas de algodão, tiaras, broches, imãs de geladeira — sempre com tema da cultura popular. "Durmo pouco. Quando morrermos, aí sim poderemos dormir. Temos que aproveitar a vida acordados", ri a efusiva Vânia Oliveira. Uma lição de vida, não?
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