A pandemia chega à carta de vinhos: que rótulos beberemos nos restaurantes?
Quem não tomou uma taça de vinho nos últimos seis meses que atire a primeira rolha. A pandemia deixou todo mundo em casa e incentivou os mais devotos à bebida a encher suas adegas, armários ou geladeiras.
De acordo com a Ideal Consulting, que acompanha o mercado, o Brasil assistiu a um crescimento de 27,8% no volume comercializado no primeiro semestre em relação ao mesmos meses do ano passado.
Se considerarmos apenas período de janeiro a junho, o consumo por pessoa passou de 2,13 litros, em 2019, para 2,37 litros, em 2020. Em julho e agosto, a média foi ainda maior: 2,81 litros.
Os números empolgantes estão relacionados à bebericagem dentro de casa, que veio como uma consequência dos tempos pandêmicos. É uma espécie de ânsia de viver o agora e até de espairecer em meio ao enclausuramento provocado por uma realidade caótica.
O que antes era ocasião especial, virou necessidade",
Marcelo Copello, especialista em vinhos
Os restaurantes, em contrapartida, viram minguar os brindes in loco. Com o salão fechado de março a agosto, a maioria dos estabelecimentos focaram na comida e adaptaram as operações para levar suas especialidades na porta dos clientes.
Soluções diversas e diminuição da carta
Enquanto restaurantes tentaram vender seus estoques para clientes fiéis ou colocar parte da carta no menu de delivery, bares dedicados exclusivamente à pedida, como o Elevado e o Sede261, ambos em São Paulo, apostaram em kits entreguem em domicílio e experiências virtuais.
Rafael Ilan, sócio-administrador do Bardega e do Bocca Nera, foi no caminho contrário. "Aproveitei o tempo para negociar com os fornecedores e preparar a equipe", explica.
Para a reabertura, além de se preocupar com as novas normas sanitárias, ele precisou traçar uma nova estratégia de venda.
Reduzimos o número de rótulos para evitar perdas e colocamos o rodízio a um preço ainda mais atrativo".
No 'velho normal', quem ia ao Bocca Nera provava quinze vinhos à vontade por 89,90 reais. Hoje, os clientes pagam menos, 59,90 reais, e têm uma experiência restrita, de oito rótulos, entre eles exemplares de espumantes, brancos, tintos, rosés e de sobremesa. No Bardega, onde o consumo é à la carte, a oferta diminuiu 33%.
No restaurante Cantaloup, um dos primeiros a colocar uma bonita adega em meio às mesas do salão, a redução foi ainda mais significativa. Ao cortar 67% das opções, o calhamaço que exibia 457 rótulos deu lugar a uma lista de 150 garrafas acessada por QR code.
"Passou a ser inviável. Tivemos que focar no que o consumidor de fato toma. Por mais que gostássemos de ter vinhos maravilhosos, se não vende, não funciona", explica o sócio da casa, Daniel Sahagoff.
No italino Vinheria Percussi, o sócio Lamberto Percussi relata dois movimentos distintos. Primeiro, quando o serviço estava parado, eles esvaziaram o estoque de importações exclusivas com a venda a preços convidativos para pessoas que já conheciam e frequentavam o local.
A partir de agosto e, principalmente, com a volta do funcionamento durante o jantar, o consumo na mesa voltou a ser significativo. "Agora estamos repondo a carta que deu uma boa enxugada pensando em opções econômicas, cujo preço para o cliente final vai de R$ 70 a R$ 140, e também nas mais bacanas, que saem a partir de R$ 300", conta.
Questão de preço
A pandemia trouxe não só um fornecimento irregular de vinhos como também provocou uma flutuação cambial significativa.
"Câmbio e impostos sempre foram pontos estratégicos a serem avaliados quando falamos de posicionamento de preços. O cenário pouco favorável nesse terreno fez o consumidor buscar vinhos mais simples para o seu dia a dia", esclarece Juliana La Pastina, vice-presidente do Grupo La Pastina.
Neto Carvalhal, diretor da importadora Casa Flora, acredita que, se continuar havendo uma alta cambial, a perspectiva não é positiva no quesito preço: "corremos o risco do vinho ter valores ainda maiores".
O aumento do dólar e do Euro influencia diretamente no quanto pagamos por uma garrafa importada. Funciona assim: por mais que o preço de um vinho na fonte continue o mesmo, ao ser transformado para real, sentimos que ele fica mais caro.
"A reação a isso é o importador ir buscar na origem rótulos alternativos, mais baratos, ou negociar o valor. Isso é comum e acontece em momentos de crise, como em 2014", explica Marcelo Copello.
A grande questão, segundo ele, é que o consumidor dificilmente está disposto a pagar mais pelo produto:
Vinhos de entrada são os mais consumidos. E não acho que isso vá mudar. Mas os importadores e os donos de restaurantes vão ter que rebolar para conseguir uma qualidade semelhante no mesmo valor final".
Outra consequência do aumento de preços por parte dos cliente é o medo de se arrepender investindo mais. "O restaurante acaba preferindo apostar em rótulos mais certeiros e conhecidos do consumidor, que, por sua vez, não quer arriscar e errar", entende Otávio Lilla, da Mistral.
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