Por que depois de reabrir na pandemia restaurantes voltam a fechar?
Foram semanas sem poder abrir aos clientes, seguindo rígidas exigências impostas por governos no mundo todo, o que os colocou na maior crise de suas histórias.
Quando finalmente puderam voltar a atender seu público diante de um relaxamento das medidas de distanciamento social, alguns restaurantes se viram obrigados a voltar a fechar as portas.
Foi o caso do Aponiente, considerado um dos melhores restaurantes da Espanha, país drasticamente afetado pelo novo coronavírus, com algumas das piores taxas de transmissão de toda a Europa e cerca de 30 mil mortos pela doença.
Localizado na região de Cádiz, no sul do país, o restaurante com três estrelas Michelin enfrentou um pequeno surto de infecção entre funcionários e foi obrigado a trancar as portas no final de agosto, após apenas seis semanas da reabertura oficial.
Comandado por Ángel León, conhecido como "o chef do mar" por suas criações como uma mortadela de peixe e o uso de plânctons nas suas receitas, o restaurante testou todos os seus funcionários depois que um deles apresentou sintomas: 3 dos 60 estavam positivos.
A saída foi senão encerrar as atividades mais uma vez até que tudo estivesse seguro para poder garantir a saúde dos "nossos clientes e nossa tripulação", como disse o comunicado do restaurante.
"Responsáveis com a situação e com tristeza de não permitir que nossos comensais possam desfrutar do restaurante, comunicamos que nossas instalações permanecerão encerradas temporariamente e de forma voluntária até que possamos ter segurança em reabrir", continuava. O Aponiente retomou novamente as atividades no começo de setembro.
Remoto, mas não inalcançável
Mesmo caso ocorreu com o KOKS, restaurante de destino que fica nas remotas Ilhas Faroe, na Dinamarca, e onde a covid-19 parecia estar sob controle: todos os turistas são obrigados a apresentar testes para entrar no arquipélago.
Localizado em Leynavatn, o KOKS tem uma proposta local de servir ingredientes que só poderiam ser produzidos ali, como mexilhões de 300 anos e cordeiros autóctones assados, já que poucas coisas chegam às ilhas.
Mas isso não impediu o vírus de infectar um dos funcionários da equipe do chef Poul Andrias Ziska, que dirige o restaurante, com duas estrelas Michelin.
Como resultado, todos os funcionários tiveram que ser colocados em quarentena, o que levou o chef a ter que encerrar o restaurante por duas semanas. "Tem sido um ano tão incomum que essas coisas nem me surpreendem mais", disse o chef a um jornal local do arquipélago de 50 mil habitantes.
Infecções comunitárias
Em Portugal, o auge do verão faz o governo tomar medidas para evitar que as praias ficassem lotadas, como o controle de entrada de banhistas. Mas na Comporta, litoral a pouco mais de uma hora de Lisboa, os contágios ganharam manchete por terem se intensificado em restaurantes bastante populares.
Dois estabelecimentos pertencentes a um mesmo grupo de empresários, a Ilha do Arroz e o Museu do Arroz, preocuparam as autoridades por terem sido focos de infecções comunitárias da covid-19.
Dos 39 testes realizados com as equipes — que, por vezes, circulavam entre os dois espaços — 18 deram positivo, além de quatro familiares também contaminados.
O surto, que já foi controlado, depois do fechamento dos restaurantes e de quarentenas imposta a todos os infectados, causou efeitos negativos também a outros restaurantes da região.
O Cavalariça, um dos mais conceituados restaurantes da Comporta, que coleciona críticas positivas nos jornais locais, veio às redes sociais expor as consequências.
"Só hoje, vamos com 9 cancelamentos de reservas, 40 pessoas que, por seguirem o que dizem as 'notícias', resolveram alterar seus planos", publicou em seu Instagram.
O efeito vai além dos restaurantes onde ocorrem os contágios: a restauração dessas localidades acaba por carregar consigo a pecha negativa noticiada, mesmo que sigam protocolos rígidos de controle.
O que está em jogo, mais do que o cuidado que precisam passar aos clientes, é a capacidade dos restaurantes e outros estabelecimentos de serviço de seguirem funcionando sem colocar em risco suas equipes — o que pode obrigá-los a fechar e criar uma imagem negativa junto aos frequentadores, afetando ainda mais a economia local.
Focos de contágio
Nos EUA, desde que os restaurantes puderam abrir em alguns estados, restaurantes se tornaram foco de contágios. Em Maryland, 12% dos novos casos registrados em agosto foram rastreados em restaurantes, e no Colorado, 9% dos surtos gerais foram ligados a bares e restaurantes.
Segundo reportou o The New York Times, cenários parecidos ocorreram em outras partes do país. "Dados de estados e cidades mostram que muitos surtos comunitários do coronavírus neste verão se concentraram em restaurantes e bares", noticiou o jornal.
Além dos lares de idosos, das prisões, dos frigoríficos e das fábricas, bares e restaurantes se tornaram grandes focos de contágio em território americano.
A situação no Brasil
De acordo com Paulo Solmucci Jr, presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), o Brasil ainda não passou por situação semelhante.
Não tivemos nenhum conhecimento de surto no Brasil ou de trabalhadores que tenham se infectado, exigindo ações desse tipo"
É preciso lembrar que, no Brasil, a retomada é mais recente do que na Europa ou em outras regiões.
Mas o executivo aponta que, em cidades onde esses estabelecimentos permaneceram abertos por mais tempo (sem quarentenas rígidas) ou que quase não fecharam, como Campo Grande e Vitória, casos de surtos, mesmo pequenos, não foram reportados.
Solmucci lembra que é imprescindível que os bares e restaurantes sigam as medidas de segurança estipuladas pelos órgãos de saúde especialmente para seus colaboradores. Não adianta apenas investir em medidas aos clientes, ele pontua.
Manual anti-covid
Em uma cartilha de prevenção enviada a bares, restaurantes, cafeterias e outros estabelecimentos do ramo, a Abrasel indica medidas como a que os "colaboradores devem vestir uniforme somente em local de trabalho" e que é preciso "atenção redobrada no contato entre entregadores e fornecedores com funcionários".
O documento ainda destaca que "o colaborador deve ser afastado em caso de constatação" dos sintomas da doença e de como os empresários precisam se ater a "distâncias de pelo menos um metro" para as equipes.
Minha expectativa é que não tenhamos questões de emergências como essas por aqui"
Paulo Solmucci Jr
Agora que em muitas cidades do Brasil os restaurantes puderam voltar a funcionar, depois de pressionar seus governos sob o argumento de que poderiam fechar para sempre, e precisam ter cuidado para que as portas permaneçam abertas. E não sejam obrigados a voltar a trancá-las.
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