Como Porto de Galinhas quer liderar a retomada do turismo no Brasil
Ipojuca tinha apenas dois casos suspeitos de covid-19 quando a prefeitura decretou, em 17 de março, o fechamento de escolas e a proibição de eventos com mais de 100 pessoas. Dois dias depois, o município da região metropolitana de Recife restringiu o acesso às praias e vetou o comércio na areia. No dia 22, as praias fecharam de vez, em um movimento que acabou seguido pelo resto do estado.
A atração turística mais famosa da cidade, os passeios de jangada em Porto de Galinhas, estava suspensa. Inevitavelmente, Ipojuca sentiu o baque da quarentena, como em todos os lugares onde o turismo tem papel relevante na economia.
Pernambuco registrou perdas de R$ 6 bilhões entre março e setembro, segundo a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC). Cerca de 1,2 mil estabelecimentos do setor de turismo fecharam as portas no estado. Quase 109 mil empregos formais na área foram eliminados.
Destino virou "cidade fantasma"
Como mais de um quarto da população de Ipojuca trabalha com turismo (por volta de 25 mil pessoas), o choque foi enorme.
A prefeitura criou um benefício de R$ 500 a trabalhadores informais que viviam do turismo. Cerca de 4 mil pessoas recebem o auxílio desde abril, em uma série de medidas que contou também com um programa de plantão psicológico aberto a toda a população e com a redução do salário da prefeita, Célia Sales (PTB), da vice-prefeita e de secretários.
Hotéis não foram obrigados a fechar as portas, mas, com impedimento de viagens, falta de voos e fronteiras fechadas, na prática eles ficaram sem hóspedes e suspenderam as atividades. Sem clientela, muitos guias de turismo ficaram sem serviço.
Foi o caso de Júnior Borges, da Luck Receptivo - a tradicional agência de viagens e passeios pernambucana chegou a dispensar mais da metade dos funcionários em algumas cidades em que atua. "Fiquei quatro meses fazendo entrega de aplicativo com minha moto", lembra Júnior.
Não tinha turista. Teve guia que foi fazer máscara para a pandemia. Foi muito suado, muito sofrido."
A maioria das pessoas em Porto de Galinhas adotou as medidas necessárias de isolamento. Até as esculturas de galinhas e galos que enfeitam o centro do povoado ganharam máscaras. "No começo todo mundo respeitou. Ninguém na rua, parecia cidade fantasma, cena de filme, como se estivesse abandonada", lembra Júnior.
A primeira morte foi registrada em 14 de abril. A ela se seguiram mais 91 óbitos até o fim de setembro, quando o município de 97 mil habitantes não registrou mais nenhum caso fatal.
Reabertura com alertas
Os hotéis que integram a Associação dos Hotéis de Porto de Galinhas (AHPG) começaram a reabrir no dia 26 de junho. Com a situação mais controlada, as praias aos poucos foram reabertas e os banhistas, também aos poucos, retornaram. Mas logo eles chegaram aos montes.
No Sete de Setembro, 20 mil carros circulavam por Porto de Galinhas, um fluxo maior do que no mesmo feriado do ano passado.
"Foi preciso pedir ajuda aos meios de comunicação para lembrar as pessoas que a pandemia não tinha acabado e que era preciso respeitar as regras", diz a assessoria de imprensa da prefeitura de Ipojuca, que avaliou que o volume de gente era um reflexo dos meses de confinamento. O pessoal queria extravasar.
No feriado estadual de 19 de outubro (dia do comerciário), Porto de Galinhas estava razoavelmente cheia, com direito a uma pequena fila no acesso às jangadas para o passeio nas piscinas naturais. Mas, segundo comerciantes locais, a situação ainda estava longe do que eles consideram uma praia lotada.
Havia guarda-sóis aglomerados e praticamente nenhum banhista de máscara, quando a recomendação é tirar a proteção facial apenas para banho de mar e consumo de comidas e bebidas. Entre ambulantes e funcionários de restaurantes, o uso da máscara era muito mais comum, mas não unânime. Em outros feriados, o cenário foi semelhante, apesar de haver placas e avisos recomendando distanciamento social, máscara e álcool gel por todo lado.
Nova rotina
As mudanças trazidas pelo coronavírus ao turismo vieram para ficar, pelo menos até que todo mundo esteja vacinado. A AHPG montou, em parceria com o Real Hospital Português, de Recife, e a Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), um manual de boas práticas de higiene nos hotéis, com o intuito de preservar a saúde de trabalhadores e hóspedes.
Para o turista, as grandes mudanças são o uso de máscara, obrigatório nas dependências do hotel, e os serviços de bufê: em alguns hotéis, você precisa escolher o que quer e só depois é servido. Em outros, deve usar luvas descartáveis ao montar o prato.
Às vezes é difícil se comunicar por trás da máscara na boca, da proteção plástica no rosto e da barreira de acrílico no balcão. E quem estava acostumado a se aboletar no bufê e comer de tudo no café da manhã sem pensar muito pode ter mais dificuldade - afinal, é preciso informar, por exemplo, a grossura da fatia de bolo, quantas fatias de fruta vai querer, se quer tudo no mesmo prato ou separado.
Pense, diga, aponte: todo o café da manhã entrou no esquema da tapioca. Mas são pequenas mudanças, banais e irrisórias diante de tal situação. O estresse, no fim das contas, está todo nos ombros dos funcionários de hotéis e pousadas, que precisam passar o dia com essas proteções.
Mas, com medidas como essas, o trabalho voltou.
Graças a Deus o setor está se recuperando, os motoristas estão sendo chamados de volta, os guias retomaram o serviço", celebra Júnior.
De olho no pós-pandemia
Não é de hoje que Porto de Galinhas é um dos lugares mais procurados por brasileiros para férias. Em uma pesquisa divulgada em julho pela Omnibees, empresa de sistemas de reservas de hotel, Porto ficou entre os cinco destinos mais desejados para o pós-pandemia.
A situação tende a ser mais favorável para a vila à medida que a pandemia perde força. Com dólar nas alturas e uma maior procura por destinos de natureza, sem aglomerações das grandes cidades, destinos de natureza ganharam força.
Eduardo Tiburtius, presidente do Porto de Galinhas Convention e Visitors Bureau (CVB), entidade que representa as empresas de turismo de Porto confia no crescimento do destino no pós-pandemia. "Além de estimular o cliente nacional doméstico, que sempre foi o nosso principal mercado, a permanecer viajando dentro do país, o aumento da moeda também abre as portas para que turistas estrangeiros possam conhecer as potencialidades de Porto de Galinhas, assim que houver a reabertura total das fronteiras."
Antes da pandemia, 30% dos turistas no balneário eram estrangeiros, a maioria argentinos. Em abril, o CVB iniciou um treinamento online com mais de 3 mil agentes de viagem brasileiros e estrangeiros para vender o destino, de olho na reabertura.
Para atrair os turistas que já estiveram em Porto, o centrinho e a rede hoteleira investiram em algumas novidades, como o Farol Porto de Galinhas, uma torre de 14 m, com mirante 360º, aberta em dezembro de 2019.
No fim de 2020, ele inaugurará um bar de vinhos em parceria com a Miolo - a vinícola gaúcha, que já está no Vale do São Francisco, vai aumentar sua presença no Nordeste.
Já o Porto de Galinhas Resort & Spa investiu em uma nova piscina e em um spa de alto padrão. Entre 30 de novembro e 2 de dezembro, a vila sediará um evento voltado aos profissionais do turismo no Brasil, que deve movimentar R$ 26 milhões em negócios.
Também em dezembro o centrinho irá ganhar um centro de atendimento ao turista.
Sabemos que o turismo no mundo todo está passando por mudanças, mas desde o início da pandemia temos feito ações que garantem que o turista venha para o nosso litoral com segurança", diz a prefeita Célia Sales, reeleita para um novo mandato.
O aquecimento do mercado é visível nas ruas. Por onde se olha há placas de futuros resorts e outros empreendimentos. Porto de Galinhas parece se sentir pronta para sair melhor da pandemia.
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