"Sempre me senti diferente": a metamorfose de Eduardo ao excêntrico Supla
Eduardo Smith de Vasconcellos Suplicy é o nome escrito na certidão de nascimento do artista que conhecemos como Supla. O filho mais velho dos políticos Marta e Eduardo Suplicy é um conhecido de longa data do público brasileiro, principalmente pelo seu visual: cabelo platinado espetado, camiseta com estampas de banda de rock e acessórios no pescoço e orelhas.
Vestido exatamente dessa forma, ele apareceu para a chamada de vídeo da entrevista para Nossa: "Eu não sigo as regras, fuck the rules. Nunca gostei de me enquadrar em nada. O legal é nossos belos defeitos", se define na conversa, enquanto mistura palavras em português e inglês.
Assim como o vocabulário misto, o visual para que Eduardo Smith se transformasse na figura do Supla, como o que conhecemos hoje, teve seus primeiros passos nos Estados Unidos, onde morou até os 8 anos de idade com os pais, quando ambos ganharam bolsas de estudo.
"Quando cheguei lá, todo mundo usava camisetas de futebol americano e eu do Flamengo, Vasco e Santos", relembra. "Sempre me senti um pouco diferente, tanto lá como aqui".
O estilo floresceu ainda em seu retorno ao Brasil, onde passou a morar com a sua avó. Um dos seus vizinhos foi um dos propulsores para que o cantor começasse a se interessar pela música e a criar as combinações de roupas, inspiradas por David Bowie, Mick Jagger, Billy Idol, entre outros.
"Nós sempre nos fantasiávamos de acordo com nossos ídolos", conta. "Eu me vestia como o Ringo Starr, claro, porque era o baterista".
Esses artistas dos quais eu gostava muito eram pessoas com visuais muito legais. Não era o de sempre. Isso me chamou a atenção. Os terninhos cortados, as outras roupas. Me identificava com isso".
E como qualquer um que já passou pela adolescência, sabe como essa época pode ser cruel para os que se atrevem a se vestir de forma diferente. No entanto, para Supla, esse obstáculo foi facilmente driblado, o que ele credita à confiança que seus pais lhe deram ao longo dos anos.
"Minha relação com meus pais deu muita força para eu ser quem eu sou", destaca. "Vestir uma roupa, andar desse jeito. Se eu não tivesse tido amor, confiança, não teria sido assim".
Cabelo à la Bowie
O desejo pelos fios loiros, quase brancos, começou da paixão pelo surf, quando ainda morava na Califórnia, nos EUA. A mudança, entretanto, ganhou força depois que ele foi a um show de David Bowie, na Alemanha, aos 16 anos de idade.
"Era aquele cara que eu admirava, com o cabelo bem loiro", relembra ele sobre como o artista britânico se apresentou na época.. "Quando voltei ao Brasil, isso se intensificou. Pensei: 'quer saber? vou misturar todas minhas referências e virar o Supla'".
A mistura citada por ele inclui The Clash, Sex Pistols, Generation X, entre diversas outras bandas de rock.
"Existem milhares de outros nomes, mas esses foram pessoas que eu inseri em mim e virei um caldeirão", explica. "A gente é feito do que a gente gosta e mistura isso. No começo, é natural você imitar a pessoa que curte, depois desenvolve o próprio estilo".
Esse estilo, nas palavras dele, se comunica com a liberdade de expressão.
"Quem diz que roupa é futilidade, é uma grande bobagem", opina. "A roupa marca a história. Você vê fotos e as roupas determinam a época em que as pessoas viveram. Ela faz parte da nossa cultura".
É uma bobagem falar isso sobre a moda. O que não pode fazer é ficar cego por ela seguindo tendências, blinded by fashion".
Sem medo de navegar entre o masculino e feminino
Com fotos de saia estampando o feed do seu Instagram e com top croppeds, como no filme protagonizado ao lado da apresentadora Angélica e Os Trapalhões, Supla, hoje com 54 anos, parece não se importar quanto ao gênero do departamento das roupas que escolhe.
"É tudo uma questão de se expressar, me sentir bonito", diz. "Ter um corpo bom para me vestir assim. Não tenho mais o que tinha com 18 anos, mas ainda dá", brinca.
Não é porque você chegou em uma idade que não pode desfrutar de sua sexualidade na hora de se vestir".
A menção de Supla sobre idade nos leva até o fenômeno que ele tem se tornado nas redes sociais entre as gerações mais novas, que compartilham com ele penteados como o seu e ganham um espaço em seu Instagram.
"A molecada gosta do meu estilo por eu ser sem filtro, apesar de que a gente só mostra o que a gente quer", reflete ele sobre a influência.
A identificação gerada entre ele e jovens da Geração Z é vista pelo cantor como algo gratificante. Ao opinar sobre o assunto, ele diz acreditar ainda que sua presença vai além de pessoas imitando seu cabelo platinado, que, na verdade, pode ser apenas uma forma de mostrar concordância com seus pensamentos, seja no âmbito artístico ou político.
"Quero que eles arrumem o estilo deles, mas é muito legal os jovens dizerem que se inspiraram em mim, de alguma forma, e criarem a sua própria personalidade", completa. "É achar o seu estilo e seguir nessa. O punk é isso, você descobrir seu próprio estilo".
Moda como ferramenta política
Embora ainda não fosse famoso pela sua arte na época da ditadura militar no Brasil, entre os anos de 1964 e 1985, a forma com que se vestia, de alguma forma, servia como bandeira de resistência — além, é claro, de outros diversos pontos, como a música.
Na conversa, Supla complementa declamando alguns trechos da música "Humanos": "Eu não aguento, eles querem me controlar/Querem me obrigar a ser do jeito que eles são/Cheios de certezas e vivendo de ilusão/Mas eu não sou nem quero ser igual a quem me diz/Que sendo igual eu posso ser feliz".
"Eu sou um pouco mais jovem que a galera do Titãs, Legião Urbana e Ultraje a Rigor, peguei um pouco mais amaciado, mas ainda tinha problema", conta. "Uma vez tomei garrafa na cabeça porque eu tinha cabelo branco, nem era famoso. Aleatoriamente, só por ser assim e estar com uma roupa diferente".
O episódio, como conta o cantor, aconteceu nos anos 1980, enquanto ele pilotava uma moto na avenida Faria Lima, em São Paulo, e foi abordado por dois grupos de pessoas, em carros diferentes.
"Logo quando comecei a pintar meu cabelo de branco, fui espremido contra um poste. Quando desci para chutar o carro dele, tinha uma Mercedes atrás e um dos caras deu uma garrafada na minha cabeça (na época podia andar sem capacete). Eles me pisotearam".
Meu cabelo ficou branco e vermelho de sangue, tenho uma cicatriz até hoje".
Supla conclui então a história com uma reflexão, que serve desde para o episódio em questão até os dias de hoje. Para ele, para seus fãs e para quem mais quiser ouvi-lo.
"Se eu quiser pintar o cabelo, usar uma roupa diferente, ninguém nunca vai poder dizer para mim como posso ser feliz".
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