Brasileira enfrenta morte de amiga e pandemia ao cruzar a África
Quando as notícias do surgimento do novo coronavírus começaram a se espalhar pelo mundo, no início de 2020, a brasileira Marina Pedroso (@womanifests) estava na Tanzânia, fazendo uma trilha no monte Kilimanjaro, a montanha mais alta da África.
"Passei seis dias na montanha e, durante este tempo, fiquei offline. Quando voltei da expedição, foi a primeira vez que ouvi falar da covid. Retornei para o mundo online e estava este caos", conta ela.
Na época, Marina havia acabado de começar um mochilão com o intuito de cruzar o continente africano e, depois, desbravar grande parte da Ásia.
Seu objetivo consistia em ficar na estrada por aproximadamente dois anos e, também, tentar chegar à Europa. Mas o coronavírus impactaria todos estes planos.
Subir a mais alta montanha africana pareceu um preâmbulo para outros grandes desafios que iriam surgir no caminho.
Nos meses seguintes à trilha do Kilimanjaro, a brasileira enfrentaria verdadeiras provações, que incluiriam lidar com a morte de uma amiga, atravessar um inesperado cenário de guerra e superar os desafios impostos pela pandemia.
Do paraíso à tragédia
Marina começou sua viagem na África do Sul, onde desbravou cartões-postais como as montanhas Table Mountain e Lion's Head, que oferecem vistas incríveis para a Cidade do Cabo.
Em Moçambique, o destino seguinte, visitou praias paradisíacas e fez amizade com a população local. "Os moçambicanos são um povo caloroso e encantador. Eles falam português e amam dançar. Em vários momentos, lembrei do Brasil", diz.
O ingresso na Tanzânia, por sua vez, foi presenteado com um safári no Parque Nacional Serengeti (um dos melhores lugares para admirar vida selvagem no mundo), passeios em praias de Zanzibar e com a trilha do Kilimanjaro.
As notícias iniciais do surgimento do coronavírus não impediram que a brasileira entrasse no Quênia, no final de fevereiro de 2020. Mas foi neste país africano que tudo mudou: em março, o governo queniano decreto lockdown e Marina ficou sem saber o que fazer.
"Naquele momento, um amigo propôs que eu ficasse, sem custo nenhum, em seu apartamento na cidade de Mombasa, que estava desocupado. Foi algo que caiu do céu", relata.
Foi nesta época que Marina lidou com um dos grandes baques de sua jornada.
Sua amiga brasileira Rachel Varoto, que estava vindo de Uganda para encontrá-la em Mombasa, faleceu durante o trajeto, em decorrência de complicações por conta de malária. Ao passar mal e ser levada a um hospital, ela teria tido seu atendimento negligenciado pelos médicos, receosos de que ela estivesse contaminada com coronavírus.
Aquilo me deixou muito mal. Foi muito difícil estar sozinha durante a pandemia e, de repente, perder uma amiga viajante, que era uma inspiração para mim", lamenta Marina.
Solidão e guerra
Junto com o luto, veio o isolamento.
Por conta dos impactos da pandemia no mundo das viagens, Marina interrompeu seu mochilão e acabou ficando por quase nove meses no Quênia (o plano inicial era estar no país africano por apenas 20 dias).
"Foi triste passar meu aniversário sozinha e me perguntar o que seria do meu sonho de viajar pelo mundo", conta ela.
Mergulhei em incertezas. A pandemia praticamente causou a morte do amanhã, a morte do futuro. Não dava para planejar basicamente nada".
Coisas boas, porém, também aconteceram neste período. Adepta de realizar trabalhos voluntários em suas viagens, ela usou seu tempo para ajudar pessoas durante sua estadia no Quênia, conseguindo viabilizar, com um benfeitor local, o pagamento dos estudos de uma menina de 12 anos que vive em situação de pobreza no país.
"Também aproveitei a interrupção da viagem para ler muitos livros, escrever mais e encarar a vida de uma nova maneira, com a visão mais focada em mim mesma e no presente. A pandemia nos mostrou que o futuro é totalmente incerto".
E, passados quase nove meses, Marina finalmente conseguiu deixar o Quênia e seguir com sua jornada.
O destino: a Etiópia, que colocaria a brasileira dentro de outra situação tensa.
Quando ela ingressou no país, no final de 2020, havia acabado de estourar uma guerra entre o governo etíope e um grupo opositor que atua no norte desta nação africana.
"Quando cheguei à Etiópia, o norte do país estava todo bloqueado, por causa do conflito. E o norte era a região que eu mais queria conhecer, pois lá está a Depressão de Danakil. Mudei os planos e acabei indo para o sul do país, no Vale do Rio Omo".
Não seria fácil, entretanto, escapar totalmente das consequências da guerra.
Marina conta que, certo dia, do hostel em que se hospedou na cidade etíope de Awassa, ela ouviu uma mulher gritando de maneira desesperada em uma casa ao lado. Logo em seguida, descobriu que a pessoa acabara de saber que um parente seu havia morrido no front bélico.
É uma situação que eu não estava preparada para viver. Naquele momento, senti que a guerra estava muito próxima de mim".
Enfim, o Egito
Mesmo com tantos obstáculos, Marina finalmente conseguiu chegar ao Egito no último mês de dezembro.
E aquilo representou uma enorme realização para sua viagem: ir da África do Sul ao território egípcio — países que ficam, respectivamente, no extremo sul e no norte do continente africano - é considerado um grande feito por muitos mochileiros.
E, para Marina, foi como se a primeira etapa de sua jornada estivesse finalmente prestes a ser concluída.
"No trajeto, aconteceram mil coisas que poderiam ter me feito desistir da viagem, parar tudo e voltar ao Brasil. Precisei ter muita resiliência. Ter chegado ao Egito me dá a sensação de que posso fazer qualquer coisa", comemora ela.
E a brasileira só tem vivido bons momentos na terra dos faraós: nos últimos meses, ela se encantou com a grandiosidade das pirâmides de Gizé, mergulhou no Mar Vermelho a partir da Península do Sinai e conheceu o oásis de Siwa, onde passou o Réveillon.
Seu plano é ficar no Egito até o final de março e, depois disso, seguir viagem.
Não sei qual será a minha rota. Depende muito de quais países estarão abertos. Mas ainda quero cruzar o Oriente Médio e rodar pela Ásia".
Depois de sobreviver a um começo difícil de viagem, ela garante: "ainda não tenho data para voltar ao Brasil".
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