Brasileira entra para o Guinness ao atravessar lago de lava: "sem palavras"
Quando Karina Oliani chegou à Etiópia para retirar a permissão para cruzar um vulcão, o funcionário estendeu o documento em direção aos homens da equipe e perguntou: "Quem vai fazer a travessia?".
Ninguém podia imaginar que aquela mulher de 1,66 m de altura ("de manhã, 1,67 m") e cara de "patricinha que desiste na primeira bolha no pé", como ela mesma se define, estava prestes a quebrar um recorde mundial.
Neste 8 de março, Dia Internacional da Mulher, essa médica e aventureira recebeu do Guinness World Records o certificado pela tirolesa mais longa sobre um lago de lava, uma travessia de 100,58 metros sobre uma cratera em brasa constante, no Erta Ale, o vulcão mais ativo da Etiópia.
Estou superfeliz porque a travessia aconteceu em 2017 e só agora teve esse reconhecimento. [Antes de conceder o título] eles investigam tudo, pedem documentos de comprovação e falam com um monte de gente", conta Karina em entrevista por telefone.
Para a travessia de um minuto e meio foram necessários três dias inteiros só para encontrar pontos seguros para instalar o equipamento. Na bagagem, cordas, freios e roldanas capazes de aguentar altas temperaturas, e roupa com tecnologia desenvolvida pela Nasa para ambientes de até 500 °C.
"Qualquer lugar que furávamos para colocar o parafuso, a corda estourava com a tensão. Cheguei a pensar que o projeto tinha ido por água abaixo", lembra Karina, que viajou com uma equipe reduzida formada por um fotógrafo e um cinegrafista, ambos do Brasil, e um canadense especialista em ancoragem.
Mas esses não eram os únicos problemas encontrados.
O vulcão fica no Deserto de Danakil, considerado um dos lugares mais inóspitos do planeta, com chuvas raras e temperaturas extremas que beiram os 50 °C.
Localizado no conflituoso Chifre da África, próximo às fronteiras da Eritreia e do Djibouti, a região sofre também com a ação de grupos separatistas no Triângulo Afar, onde turistas estrangeiros foram sequestrados e mortos em ataques, em 2012 e 2017.
"Eu queria fazer cada um daqueles segundos virarem minutos e fazer a coisa se prolongar ao máximo. Eu não consigo colocar isso em palavras", afirma.
Isso se chama coragem, Karina, para enfrentar o desafio de se impor em um ambiente esportivo, infelizmente, ainda androcêntrico. "Esse mundo continua muito masculino, mas a cultura etíope é muito mais machista do que no Brasil", analisa.
Sem dúvida, foi uma das experiências mais espetaculares da minha vida", define Karina.
Girl power
"Você é louca. Isso nunca foi feito e nunca vai ser feito porque é impossível".
Essa foi algumas das frases que Karina ouviu ao anunciar suas intenções na África, desestímulo suficiente para ela ativar sua girl power e lutar por seu sonho como uma garota.
"Nenhuma marca quis apoiar o projeto e só veicularam quando viram que eu não tinha perdido a minha vida", conta essa médica emergencista que bancou todo o projeto do próprio bolso, cuja façanha foi veiculada no "Fantástico" e no programa "Forças da Natureza", do canal OFF.
Eu fui aquela criança perigosa que buscava os objetos mais altos", brinca Karina.
E desde que concluiu seu curso de mergulho autônomo e fez seu primeiro salto de paraquedas, aos 12 anos, seus desafios aumentam, proporcionalmente, à idade.
Entre os títulos já conquistados estão o de "primeira sul-americana a escalar as duas faces do Everest" e "primeira especialista do continente em emergência e resgate em áreas remotas"; "primeira brasileira a escalar o K2", uma das montanhas mais mortais do mundo, e mais recentemente, a "1ª brasileira a voar com uma mochila a jato".
Karina é também uma das fundadoras do Dharma, instituto que realiza ações humanitárias em destinos remotos dentro e fora do Brasil, e esteve na linha de frente em um hospital de campanha durante a pandemia de coronavírus, no ano passado.
Batalha em várias frentes
Atualmente, ela divide seu tempo também em plantões como emergencista em hospitais da capital paulista.
Para cada projeto em que se envolve, essa médica paulistana faz treinamentos funcionais todos os dias. Mas desde que ganhou 12 pinos em uma perna fraturada na Jordânia, em fevereiro do ano passado, teve que substituir os exercícios de impacto por atividades como remo e natação.
Assim como os vulcões, Karina está em constante transformação.
Na semana da entrevista para esta reportagem, enquanto ela comemorava a liberação médica para voltar aos treinos mais pesados, tinha olhos (e todos os esforços) voltados para seu próximo desafio.
Dessa vez, a "menina perigosa" se prepara para fazer uma travessia polar inédita e está em busca de apoiadores para esse que ela considera "o projeto mais caro que já fiz até hoje".
"Eu tenho certeza que eu também vou realizar esse projeto", cujos detalhes Karina diz que ainda não pode divulgar. "Mas eu prometo não decepcionar", completa.
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