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Como criar um filhotinho mais sociável? Enfrentar os medos é uma das chaves

Interação e brincadeiras ajudam pet a socializar desde cedo - Getty Images/iStockphoto
Interação e brincadeiras ajudam pet a socializar desde cedo
Imagem: Getty Images/iStockphoto

Juliana Finardi

Colaboração com Nossa

27/04/2021 04h00

Eles garantem índices altíssimos de fofura, mas não é só isso que filhotes de cães e gatos imprimem nesta fase. É também neste momento, que os pets desenvolvem comportamentos típicos da espécie e podem ganhar um vasto repertório para crescerem mais sociáveis, menos medrosos, ansiosos e reativos.

"É nesta fase que ele aprende a ser um cão, quando ainda está com mãe e com a ninhada. A mãe consegue educar esse filhote e dá um limite para aquele que 'toca o terror' sossegar. Ou quando eles querem mamar e a mãe já começa a rejeitar para eles criarem uma independência", explica a veterinária comportamentalista Katia De Martino.

É por isso que os filhotes tanto de cães, como de gatos, não devem ser retirados dessa dinâmica durante os primeiros 60 dias de vida — não 45 como acontece em muitos casos.

Presença da mãe nos 60 primeiros dias de vida é essencial para a socialização dos filhotes - Getty Images/iStockphoto - Getty Images/iStockphoto
Presença da mãe nos 60 primeiros dias de vida é essencial para a socialização dos filhotes
Imagem: Getty Images/iStockphoto

Fase determinante

Após a fase inicial com a mãe e os irmãos, os filhotes partem para uma segunda jornada, uma espécie de "portal", de acordo com a veterinária.

"E essa janela vai se fechando até os 3 ou 4 meses de vida. Até lá, ele deve ser exposto a vários estímulos diferentes com outros cães, outras pessoas, precisa ter esse desenvolvimento de forma muito positiva também com objetos e sons. Enfim, conhecer a vida de forma prazerosa", disse Katia.

Luigi Angelis, e Lara, uma SRD - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Luigi Angelis, e Lara, uma SRD
Imagem: Arquivo pessoal

Foi exatamente o que o analista de dados Luigi Angelis, 30 anos, fez com a Lara, uma SRD que hoje tem 1 ano, mas que está com ele desde filhote.

"Apesar de ela ser o chamado 'cão de pandemia' porque não pudemos sair muito com ela por conta das fases de lockdown, fizemos tudo para socializá-la com outros cães e pessoas na medida do possível, mas ela nunca avançou em ninguém", conta.

Apesar de ter ficado 15 anos sem ter nenhum animal de estimação, Angelis diz que aprendeu com a ONG onde adotou Lara tudo o que precisava saber para socializá-la e que deveria fazê-lo durante os primeiros meses de vida.

Socializa ou protege? Os dois

Muita gente acaba perdendo, porém, a fase "de ouro" dos filhotes exatamente por coincidir com a época das vacinas que é quando, também, muitos veterinários recomendam que os bichinhos não saiam de casa e sejam expostos a riscos relacionados a doenças.

"Há décadas, a classe veterinária recomenda que os cãezinhos só saiam de casa após as vacinas. Então eles ficam confinados dentro das casas e apartamentos sem contato com outras pessoas e animais durante meses. Felizmente, já estão começando a surgir as puppy classes (escolinhas de socialização para filhotes) e mudando esse conceito", disse o veterinário comportamentalista Dalton Ishikawa, fundador da Pet Games.

Sling foi a solução que Katia De Martino encontrou para socializar seu novo filhotinho - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Sling foi a solução que Katia De Martino encontrou para socializar seu novo filhotinho
Imagem: Arquivo pessoal

A dica de Katia é um acessório para bebês humanos, mas que já é fabricado e vendido em grandes petshops, o famoso sling.

"Precisamos expor o filhote a vários estímulos positivos para que ele conheça a vida fora de casa com outros cães, com outros animais e pessoas de uma forma controlada. Os meus cães tiveram contato com cães que já eram vacinados, cães de amigos, de familiares, sempre de uma forma positiva. E conheceram o mundo sem estar em contato com o chão nem com outros animais diretamente, sempre no sling", afirmou.

Brincar e enfrentar medos

Estimular os cães e gatos com brinquedos e brincadeiras durante a fase em que ainda são filhotes é essencial para que eles se desenvolvam com melhor coordenação motora e mais habilidades cognitivas. "Dessa forma, as pessoas preparam os pets para a fase adulta porque eles vão vivenciar e interagir. É muito similar às crianças, que simulam as situações de adultos durante as brincadeiras", explica Dalton.

Filhote de gato brincando - Getty Images/iStockphoto - Getty Images/iStockphoto
Brincadeiras até mesmo com o que causa medo ajuda animal a se acostumar
Imagem: Getty Images/iStockphoto

A veterinária Carla Alice Berl, fundadora da rede Pet Care, vai mais além ao citar os objetos e situações que muitos pets têm medo.

Quando pegamos um filhote até o quarto mês de vida e apresentamos barulhos distintos da rua, objetos como aspirador de pó ou guarda-chuva e associamos a coisas positivas, ele provavelmente vai levar isso para o resto da vida. O mesmo vale para barulhos de fogos de artifício, tiros, trovões, passeios de carro, caixas de transporte e até a ida ao veterinário", diz.

Luiza Julio Campos, voluntária da ONG Desabandone, já faz uma verdadeira rotina de socialização com os filhotes antes mesmo de eles serem adotados. Desde o ano passado, ela já abrigou cerca de 30 cãezinhos em sua casa como lar temporário e, durante a estadia, os submete a estímulos variados.

"Isso ajudará bastante no desenvolvimento deles, socialização e adaptação em qualquer lugar. Aqui no prédio, temos um espaço pet e sempre combinamos com outros donos de cachorros de passear. É ótimo porque podemos deixar todos sem coleira interagindo", disse, ao salientar que todos são vacinados antes de expostos ao contato com os outros animais.

Katia explica que é muito importante expor os pequenos aos mais variados estímulos e que os resultados podem ser colhidos no futuro.

Estímulo com barulhos ajuda pets a superarem medos - Getty Images/iStockphoto - Getty Images/iStockphoto
Estímulo com barulhos ajuda pets a superarem medos
Imagem: Getty Images/iStockphoto

"Quanto mais pudermos expor esse filhote nesta fase, melhor. O tato é importante com texturas de chão diferentes como grama, barro, asfalto, piso frio, liso. Cognitivo também, com brincadeiras para que esse cachorro comece a ser mais inteligente em todos os sentidos tanto para brincadeiras como para formas de conseguir sair de uma determinada situação", afirmou.

De acordo com ela, quanto mais estimulado durante a vida, mais sinapses neuronais (comunicações entre os neurônios) o cãozinho terá e, portanto, menor a chance de desenvolver doenças como o Alzheimer canino.

Interação é essencial

A terapeuta holística e fisioterapeuta Priscila Kodama, 29 anos, sabe muito bem a importância dos estímulos para os cãezinhos. Ela e o marido planejaram cada passo da adoção de Luna, uma SRD dócil e muito grata por ter uma nova família, mas ainda traumatizada pelo abandono.

"Não vejo a hora de levá-la para interagir com outros cães, na casa do meu avô. Sei que essa socialização é muito importante para que ela entenda que existem outros cães, outros humanos, pise na rua, gaste as unhas, e saiba que quando saímos para levar o lixo não vamos abandoná-la", diz Priscila.

Luna ainda teme abandono, mas tutores já se mexem para isso mudar - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Luna ainda teme abandono, mas tutores já se mexem para isso mudar
Imagem: Arquivo pessoal

Katia explica que é muito importante para os cãezinhos que eles tenham "atividade social".

Períodos em que eles estejam na creche, no parque, em contato com outros cachorros ao invés de ficar só dentro de casa. Porque se não for muito estimulado, pode ser que ele não se reconheça como cachorro. Além disso, pela falta de exposição do filhote aos estímulos, ele pode ter problemas no futuro como medo, ansiedade e reatividade."

Para "consertar" a situação, já na idade adulta, os especialistas recomendam um trabalho de adestramento com profissionais experientes.

"É preciso associar aqueles momentos de medo dos pets a algo agradável para desviar o foco. Então, com barulhos de chuva, por exemplo, o tutor dá um brinquedo recheável ao pet. Com o passar do tempo, ele vai ficar tão concentrado no petisco, no brinquedo, que nem vai perceber o barulho que antes era motivo de medo. E assim vão sendo trabalhados os gatilhos para ele não se apavorar", explica Ishikawa.