Como Dubai, Rio de Janeiro quer se tornar polo de nômades digitais
A pandemia da covid-19 provocou a maior crise já enfrentada pela indústria turística no Brasil e no mundo. Mas o setor vem sendo ajudado por uma das mudanças mais significativas do período: o avanço sem precedentes do home office.
Viajantes misturando trabalho e lazer já representam um mercado com potencial estimado de 44 bilhões de novas reservas hoteleiras por ano. De olho nisso, o Rio de Janeiro espera se tornar um grande polo para nômades digitais (profissionais que trabalham remotamente) na América do Sul. A cidade lançará ainda em junho (sem data confirmada), nacional e internacionalmente, uma campanha inteiramente focada neste segmento.
Diferentes destinos já vinham se tornando grandes centros de atração para esse público há anos, da região sul da Tailândia a Tbilisi, capital da Geórgia. Mas o crescimento desse mercado durante a pandemia foi tão significativo que estimulou mais destinos a buscarem também esse nicho.
Dubai, por exemplo, fez recentemente uma campanha internacional para atrair nômades digitais dispostos a morar por pelo menos um ano no emirado, oferecendo inclusive vacinação contra a covid-19 como chamariz. A Ilha da Madeira criou uma vila com espaço de trabalho e internet gratuitos para quem se inscrever no seu programa de nômades digitais.
Agora o Rio de Janeiro também espera atrair uma fatia importante deste mercado. A cidade promete oferecer uma série de atrativos para os interessados em fazer da "Cidade Maravilhosa" seu endereço temporário.
Paraíso "nômade"
Principal cartão postal brasileiro, o Rio de Janeiro apareceu recentemente em 14° lugar em uma pesquisa promovida pelo Club Med sobre as 20 cidades mais amigáveis do mundo para nômades digitais (a melhor do mundo, segundo o estudo, seria Phuket, na Tailândia).
Com o slogan "seja carioca o tempo que quiser", a nova campanha a ser lançada pela RioTur e Prefeitura do Rio de Janeiro espera cativar a atenção de boa parte desse público e transformar a cidade em um grande hub de nômades digitais. Diferentes estabelecimentos parceiros — entre hotéis, hostels, espaços de trabalho e serviços em geral — prometem oferecer infraestrutura e atrativos especiais.
Escritório na praia
"Todos querem ser 'cariocas' em algum momento", defende Daniel Travassos, proprietário do Surfclub Longboard Paradise, no Recreio, que tem atraído diferentes perfis de nômades digitais durante a pandemia.
Engenheiros, arquitetos, fotógrafos, ambientalistas e advogados misturaram ali trabalho e lazer. Nos últimos 3 meses, o público internacional cresceu e já representa 15% dos hóspedes da casa. O conta com espaço de co-working com internet de alta performance, provedor próprio, poltronas adequadas e, é claro, vista para a praia.
Trabalhar em um paraíso como o Rio de Janeiro e poder aproveitar a pausa entre as reuniões para surfar ou aulas de ioga, por exemplo, é o diferencial do nosso negócio. Aqui damos vida à música da banda Charlie Brown Jr. 'Meu escritório é na praia' ", brinca.
Uma das usuárias do Longboard Paradise é a maranhense Yandressa Karine, que nunca tinha praticado nomadismo digital antes. Mas, trabalhando em home office desde o começo da pandemia, acabou fazendo dele um estilo de vida.
Uma viagem para Ubatuba, que deveria durar 5 dias, graças ao trabalho remoto acabou se estendendo por três meses. Depois disso, trabalhou remotamente também em Florianópolis, Maraú, Itacaré e, hoje, no Rio de Janeiro.
O sueco Muezz Vestin, que dá aulas online de língua sueca, também acaba de concluir com sucesso sua primeira experiência como nômade digital. Graças ao irmão que resolveu passar férias no Rio de Janeiro e se encantou pela cidade, Muezz, que nunca tinha visitado o Brasil antes e confessa ter tido medo dos altos índices de criminalidade e da pandemia descontrolada no país, resolveu se arriscar. Em pleno inverno europeu, viajou para a capital carioca disposto a passar três meses misturando férias e o trabalho remoto.
Segundo Muezz, o principal desafio foi encontrar um lugar para ficar a partir do qual pudesse realmente trabalhar com qualidade. Acabou dividindo sua estadia entre o Selina Copacabana e o Surfclub Longboard Paradise. Aprovou a experiência em geral e adorou a "vibe" dos cariocas.
Foi maravilhoso! E conheci pessoas incríveis. Estou muito feliz com esse novo estilo de vida nômade que acabei de encontrar pra mim", diz entusiasmado.
Mercado em ascensão
Com o crescimento da tendência do trabalho remoto mesmo no pós-pandemia, alguns operadores de turismo também passaram a se dedicar a esse filão. A Passion Brazil, especializada em destinos brasileiros, vem recebendo também demanda de estrangeiros nesse nicho.
"Temos cliente que ficará dois meses em trabalho remoto em São Paulo, outro que ficará três meses com a família no Rio", conta Mariana Rosa, CEO e fundadora da Passion Brazil. "Estamos criando e negociando novos produtos em destinos brasileiros para esse público, em propriedades que tenham a infraestrutura necessária para tal", conta.
Para os grandes hotéis, a adaptação a esse nicho do mercado foi bastante simples. Mas alguns empreendimentos precisaram investir em mudanças estruturais importantes para se adaptarem de maneira eficiente (como internet de alta performance, nova rotina de limpeza, criação de cantos de trabalho de qualidade etc). Afinal, esse tipo de hóspede passa muito mais tempo na acomodação e depende da infraestrutura local para desempenhar sua função.
O setor de aluguéis de temporada colhe também os louros dessa tendência em ascensão. O CEO do Airbnb, Brian Chesky, declarou recentemente que sua empresa está agora muito mais ligada a viver e trabalhar do que a viajar. Segundo ele, mais de 24% de seu negócio já está associado à ideia de morar em um destino, com permanências em um mesmo imóvel por períodos superiores a um mês.
O paulistano Rogério Silveira engrossa essas estatísticas há mais de dez meses. Nesse período, alugou imóveis de temporada em três estados e cinco cidades diferentes, por temporadas de pelo menos quatro semanas em cada um.
De Gonçalves, MG, à capital carioca, Rogério sempre procurou imóveis que lhe oferecessem o maior contato possível com a natureza, conciliando trabalho, lazer e distanciamento social.
Foi a forma que encontrei de não enlouquecer vivendo e trabalhando 24h por dia dentro do meu apartamento de 54 metros quadrados", conta.
Propostas para diferentes orçamentos
O movimento dos nômades digitais já existe há muito tempo, mas a indústria turística acredita que 2020 mudou isso em definitivo. Inclusive em termos de acessibilidade financeira, com mais opções para distintos tipos de orçamentos.
A rede hoteleira Selina investe nesse nicho há bastante tempo. Fundada em 2015, a marca já nasceu voltada para o estilo de vida nômade.
Com jeito de hostel, suas propriedades oferecem quartos individuais e compartilhados, além de espaços de convívio social e co-working. Com seis unidades no Brasil, lançou a mais recente delas, o Selina Copacabana Rio, no posto 5 da capital carioca, em plena pandemia. A rede criou também nos últimos meses um "programa de assinatura" inédito no mercado, que permite que seus hóspedes se movam livremente entre diferentes propriedades da marca por uma taxa fixa mensal ou anual.
A Uliving, fundada em 2012, também se beneficia do crescimento desse movimento. Voltada ao público jovem, oferece aluguel de quartos individuais ou compartilhados em unidades no Rio de Janeiro, São Paulo e Ribeirão Preto, com contas todas pagas em uma só mensalidade. A marca também aposta no sucesso da nova campanha carioca voltada para os nômades digitais.
"O Rio de Janeiro atrai pessoas de todo o Brasil e do mundo, proporcionando diversidade e troca cultural, que acreditamos ser o grande diferencial para o crescimento individual", defende Juliano Antunes, CEO e cofundador da rede.
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