Mulheres do azeite ajudam a colocar o Brasil no mapa de produções premiadas
Na mitologia grega, a oliveira foi criada pela deusa Atena durante uma disputa com Poseidon, o deus dos mares. Ela teria vencido o embate presenteando a humanidade com um fruto que representa a paz, a sabedoria, a prosperidade, a esperança, a união dos povos e o rompimento de fronteiras sexistas.
Em meio à pandemia, foi criado o grupo Women in Olive Oil (WIOO - womeninoliveoil.org), que reúne as mulheres líderes da indústria, chefs, agricultoras, químicas, provadoras, educadoras, importadoras, exportadoras, sommeliers, pesquisadoras e varejistas do azeite de oliva. Entre duas mil participantes, provenientes de mais de 40 países, ao menos dez delas são do Brasil.
Criado pela sommelière e CEO americana Jill Myers em abril de 2020, o grupo começou numa rede social como um perfil fechado, uma mulher foi convidando a outra. Assim vieram as representantes brasileiras, caso da sommelière Glenda Haas, produtora do azeite Lagar H em Cachoeira do Sul (RS), que estreou no mercado em 2020, com uma produção muito pequena, e já ganhou quatro medalhas em concursos internacionais.
"Temos um propósito de vida, um elo em comum, a paixão pela oliveira e pelos azeites", diz Glenda, que mora em São Paulo, mas está acompanhando a colheita de azeitonas no Sul.
A proposta do WIOO é criar laços que unem todas as mulheres em todos os níveis da cultura do azeite, promovendo mudanças globais positivas, nas áreas de saúde e nutrição, educação, boas práticas ambientais e agrícolas, economia circular e a igualdade de gênero."
Brasil se destaca - com elas
Por muito tempo, fez parte do senso comum que o Brasil não tinha terroir para produzir azeite. Isso, contudo, acabou se revelando um mito.
Na edição 2020 do BRAZIL iOOC International Olive Oil Competition, três azeites nacionais ficaram entre os dez da lista "top": Sabiá (a maior nota do concurso), Olivas do Sul e Capolivo. Além disso, seis marcas ganharam medalha de ouro: Pura Oliva, Lagar H, Olivas do Sul, Oliq, Prosperato e Andorinha.
Uma boa parte desta produção campeã é conduzida por mulheres. A azeitóloga e avaliadora Ana Beloto — que também faz parte do grupo Women in Olive Oil — ajudou a criar alguns azeites em Maria da Fé (MG), junto com a Carla Borriello, dona de um grande olival e do Azeite Carlota, da chef Carla Pernambuco, de São Paulo.
"Ali nasceu a primeira azeitona legitimamente brasileira que se chama Maria da Fé. Além de uma varietal que sumiu na Itália e se adaptou bem aqui, a Grappolo", informa Ana, anunciando que já temos até azeites biodinâmicos.
Para a mestre e doutora em Botânica Carol Zambon, uma das referências no assunto, hoje temos variedades de oliveiras brasileiras que são fruto de melhoramentos genéticos da Epamig — Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais.
Há dezenas de varietais, mas alguns se desenvolvem melhor no Brasil. Muito comuns por aqui são as espanholas Arbequina e Arbosana, a grega Koroneiki, e as italianas Grappolo, Coratina e Frantoio.
A engenheira agrônoma Edna Bertoncini, cujo doutorado é sobre azeites, explica que Arbequina e Arbosana produzem um azeite mais suave. Koroneiki, Picual e Grappolo geralmente apresentam azeites com notas de amargor e picância. A Coratina é muito amarga, muito picante, ideal para blends.
Não por acaso, são estas as azeitonas utilizadas pela jornalista Bia Pereira, que é sócia do marido Bob Costa na produção do azeite Sabiá, em Santo Antônio do Pinhal (SP), que ganhou 18 prêmios internacionais em 2020 e entrou no guia "Flos Olei", que seleciona e publica os 500 melhores azeites do mundo.
Olivoturismo
Uma tendência cada vez mais forte é o olivoturismo, em fazendas que recebem visitantes para conhecerem o azeire recém-extraído e com o máximo de frescor. Também neste setor há destaques femininos.
Exemplo disso é a Azeiteria Brasil, plataforma de olivotours e cursos criada pela sommelière Ana Tassia Blazoudakis.
Um mundo muito novo, estamos construindo a história do azeite brasileiro", conclui.
Maior vitrine está no Sul
Estado dono de 90% da produção nacional de azeites, o Rio Grande do Sul abriga mais um exemplo de mulheres "azeiteiras".
Três irmãs e a mãe da família Albornoz Ferreira iniciaram, em 2014, o plantio de oliveiras, em Santana do Livramento (RS). À frente dos negócios, Virginia Albornoz tem até uma linha de azeites de oliva para crianças.
O portfólio da Casa Albornoz contempla cinco rótulos de azeites, mel, nozes, kits para presentes com estes produtos e também uma linha de cosméticos veganos, produzidos à base de azeite de oliva. Em breve, um azeite defumado e uma cerveja fermentada com azeite de oliva, mel, capim-limão e camomila.
Outro nome em destaque é a produtora Rosane Abdala, que tem uma fazenda em Caçapava do Sul, onde produz o Azeite Don José, junto com o filho Ricardo Abdala. O lançamento foi em 2018, e a expectativa é produzir mais de mil litros de azeite, entre Arbequina, Koroneiki, Coratina e Arbosana.
Fio maravilha
A alavancada da produção também se reflete no consumo. Nos últimos dez anos, segundo o azeitólogo Marcelo Scofano, o Brasil é o país que mais cresce em consumo medido em volume, 10% ao ano. Nós importávamos 56 mil litros de azeite em 2010, e no ano passado, mais de 100 mil toneladas.
Azeite é versátil. Para harmonizar, Ana Beloto sugere que alimentos com sabores intensos, como bacalhau e carnes ou com especiarias, devem ser preparados e finalizados com azeite frutado maduro, com notas de amêndoas com média picância e amargor.
Já alimentos condimentados, temperados e amargos, como folhas verdes escuras, devem ser equilibrados com azeites verdes, jovens, frescos e frutados intensos com mais picância e amargor.
Finalizando, para doces, sobremesas, coquetéis, massas, crustáceos e alimentos como queijos, o ideal é azeite com notas doces e mais suaves.
Uma dica: tenha sempre dois azeites de oliva; um clássico e suave para cozinhar, refogar e finalizar as comidas do dia a dia e um extra virgem intenso para finalizar pratos mais condimentados."
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