A moda preta brasileira ocupa as passarelas do SPFW com o Projeto Sankofa
À frente do Projeto Sankofa estão Rafael Silvério, co-criador da startup de inovação social VAMO (Vetor Afro Indígena na Moda) e a modelo Natasha Soares, também criadora do movimento Pretos na Moda. A novidade na edição N51 do São Paulo Fashion Week leva oito marcas comandadas por estilistas negros para as passarelas do maior evento de moda no Brasil.
As marcas que participam dessa edição de estreia são: Meninos Rei, Naya Violeta, Mile Lab, Santa Resistência, Az Marias, Silvério, Ta Studio e Ateliê Mão de Mãe. Todas elas são "apadrinhadas" por outros nomes veteranos no SPFW e foram escolhidas por meio de dois processos seletivos.
A primeira foi dentro do VAMO — onde já existem marcas participando ativamente do grupo. O júri do Vamo conta com Natália dos Anjos (coordenadora do Senac Faustolo), Luiza Tamashiro (pesquisadora e fundadora do Relab Criativo que desenvolve pesquisa com pessoas com deficiência), o fotógrafo Hick Duarte e o Squad (célula de inteligência para afroempreendedores).
A segunda foi através do júri Sankofa, que tem Luanda Vieira (Vogue), Natasha Soares (Pretos na Moda) e Camila Yahn (FFW).
"A moda preta brasileira é muito mais diversa do que os estereótipos que nós estamos acostumados a ver", diz Rafael Silvério em entrevista para Nossa. "Temos oito marcas, algumas delas bebem diretamente dessa fonte da diáspora africana, mas existe minha marca, por exemplo, que vai para um outro viés, que é quase americano".
O que a estreia dessas oito marcas tem a acrescentar para o evento, na opinião de Silvério, que se apresenta também no último dia de desfiles (27), é mostrar como elas também possuem visões sobre diversas peças na moda, como a alfaiataria e o patchwork, por exemplo.
"A gente só tem três afroempreendedores [no São Paulo Fashion Week]. Quando colocamos mais oito, finalmente a gente alcança um número muito maior", diz Rafael.
"São oito identidades, raciocínios e abordagens diferentes", acrescenta Natasha durante a conversa.
O que mais me impactou é termos conseguido essa diversidade dentro de marcas pretas. Uma coisa que a gente falou muito quando a gente estava recrutando as marcas, era que queríamos sair dos estereótipos".
Natasha Soares
Durante todo o projeto, as marcas participantes do Sankofa contarão ainda com o apoio de um grupo formado por diferentes profissionais, da área de marketing à jurídica, para os seus negócios.
"Precisamos traçar uma estratégia para que as marcas conseguissem se solidificar e andar com as próprias pernas", explica Rafael. "Existem algumas deficiências que muita gente não sabe a respeito. Cada um teve uma uma formação e uma experiência. A partir disso, estamos entendendo qual a necessidade de cada uma e implantar as soluções caso a caso."
Natasha reforça que o trabalho voluntário segue um caminho de sucesso para que, futuramente, os eventos sejam mais igualitários e diversos.
"Acho que estamos em um caminho muito bom", opina. "Precisamos de tempo e recurso, sabe? Porque gente disposta a trabalhar é o que a gente mais tem visto. "A dificuldade que temos hoje é de acessibilidade à via financeira, que permite que a gente consiga abranger e transmitir maiores ensinamentos."
Existe ainda uma não-educação e não-letramento sobre essas questões raciais, por mais que tenhamos evoluído nos últimos anos."
Um processo de renovação
Enquanto no ano passado o acordo para que 50% dos modelos contratados pelas marcas brasileiras para desfilar no SPFW fossem negros, a presença do Projeto Sankofa no evento tem, hoje, o intuito de trazer renovação.
"Acredito que, no período de um ano, a gente conseguiu integrar muita coisa que não esperávamos", opina Natasha. "O que é importante para mim é ouvir o nome dessas marcas no mercado".
Para Rafael, é importante destacar também que as mesmas possibilidades sejam oferecidas para todos os criadores, de forma com que "as passagens fiquem abertas".
"As meninas abriram o caminho", diz ele. "Quando eu cheguei para conversar com o Paulo Borges [idealizador do SPFW], ainda existiam muitas coisas a serem conversadas, mas batalhas mais intensas já tinham sido levantadas".
Não adianta a gente falar sozinho, né? Acho que é sobre isso: conseguirmos introduzir essas mentes criativas dentro do mercado, independente do tempo que elas tenham de vida, para que consigam se destacar fora do line-up do evento".
O movimento feito pelo Sankofa em 2021, nas palavras da dupla, serve para abrir portas para que novas marcas ocupem esse espaço no futuro.
"Se muitos não tivessem chegado antes, a gente não conseguia atuar agora", complementa Rafael. "Provavelmente, virão novos estilistas, e estamos felizes por fazer parte desse processo, para que eles consigam ser absorvidos com mais facilidade, pois ainda é um caminho com muitas pedras".
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