SPFW N51: otimismo e looks glamourosos pós-apocalípticos brilham no 3º dia
Os desfiles das marcas João Pimenta, Juliana Jabour e Neith Nyer levaram para a edição de número 51 do São Paulo Fashion Week, nesta sexta-feira (25), uma sensação que muita gente tem sentido em casa: estamos cansados de estar tristes.
No evento, feito completamente remoto, João Pimenta voltou a falar de respiração, mas dessa vez com uma coleção colorida e vibrante; Juliana Jabour já está pronta para a festa após o apocalipse, com moletom e vestidos de ziberline; e a estreante Neith Nyer fez um desfile com plateia inspirado no filme "Xuxa contra o Baixo Astral".
Gloria Coelho
Sob o tema "Mulher do Amanhã", Gloria Coelho mostrou uma coleção eclética. O movimento hippie dos anos 1970, oversize dos anos 1980 e o grunge dos 1990 foram as referências da estilista que mostrou uma paleta que vai do azul, passando pelo verde pistache, chegando a off-white e laranja.
Vestidos fluídos com ombros de fora em cores pastéis, camisões listrados abriram o desfile, mas logo deu lugar a vestidos que mesclavam o xadrez em cores como o preto e o verde e vestidos oversized com estampa vintage até chegar à alfaiataria do japonismo, referência que a estilista costuma usar em suas roupas. Botões deixam de ser apenas itens utilitários para ser destaques em gargantilhas e mangas de vestidos e macacões.
Esfér
A primeira marca de joalheria a desfilar na SPFW levou para o evento um vídeo que mistura o surrealismo com a tecnologia. Modelos aparecem duelando com outros seres humanos ou máquina, sem falar em artistas circenses que voam em argolas e tecidos. "Quando fomos desenvolver o conceito do vídeo, a gente tentou revisitar tudo o que a gente já apresentou de imagem e conceito", disse João Viega, um dos criadores da Esfér.
A marca foi criada no ano passado, durante a pandemia, e tem apenas uma coleção, composta por anéis, brincos, colares, pulseiras e ear ciffs cuja inspiração são fragmentos de aros, elos, cápsulas, engrenagens e origamis, que exploram a função das peças de maneira original. Assim, uma argola não está apenas no pulso, mas também no calcanhar. Uma corrente é colar e, também, cinto. Essas composições foram combinadas com peças da Coven.
As peças apresentadas devem ficar no catálogo da Ésfer sem tempo definido, já que a marca preza pela atemporalidade. Ela também procura não limitar as peças a gêneros.
O que desenho eu vejo muito eu usando, mulheres usando, qualquer pessoa. É uma joia que cai bem, independente de quem vai usar. A proposta é ser universal".
Sankofa: Santa Resistência
A princesa Elizabeth De Toro, da realeza do Reino de Toro, na Uganda, foi a inspiração da estilista Mônica Sampaio para criar a coleção que inclui vestido envelope com poás, peças com o rosto de Elizabeth. "Ela sempre foi uma inspiração para mim. Uma mulher transgressora, ela foi uma das três mulheres negras a entrarem na universidade de Cambridge. Foi a primeira negra na capa da Harper's Bazaar. Sendo da realeza africana, ela nunca foi uma mulher limitadora", comentou a artista.
Para homenageá-la, Mônica, adepta do slow fashion, criou vestidos com estampa de poás contrastantes, peças com o rosto de Elizabeth, macacão oitentista com apenas uma alça. Uma elegância que vai para a festa sem abrir mão de sua ancestralidade. "Quis trazer a Elizabeth para os dias de hoje, como se ela vestisse a Santa Resistência.
É uma homenagem às mulheres que vieram antes de mim e às que vestem a marca, porque todas são inspiradoras".
Sankofa: Mile Lab
De camareira do SPFW até uma das estilistas do line-up do evento. Este foi o caminho percorrido por Milena Nascimento, a estilista por trás da Mile Lab. "Saber que voltei para esse lugar, desta forma, é um momento muito mágico", comentou a artista em entrevista após a exibição de seu fashion film. A marca de moda marginal ativista que atua no Grajaú desde 2017 estreou no evento com a coleção Baobá. "Ela fala da presença da força ancestral no povo periférico", comentou.
Os looks, todos monocromáticos em branco, apresentam camisas, vestidos em babado e conjuntos de moletom que se assemelham às roupas usadas nas celebrações da umbanda.
É um olhar com muito amor e carinho pelas roupas de terreiro".
Brancas, imaculadas, com camadas, mas urbanas, que extrapolam os rituais e dançam, rodopiam e levam o axé para o dia a dia. E esse afeto também está presente em detalhes de vestidos, feitos com o tecido de uma cortina deixada pela avó de Milena, que costurava roupas de terreiro.
Juliana Jabour
"Expectations", fashion film da marca Juliana Jabour, mostra um mundo em que as pessoas "se cancelaram", dormiram quando foram privadas do contato humano e, finalmente, acordaram. Com grande estilo. "Foi inspirado nesse período apocalíptico que estamos vivendo, em que se tem vontade de usar roupas mais ousadas, quase uma montação, para fazer as coisas como ir à padaria, ao supermercado", comentou a estilista Juliana Jabour em entrevista após a exibição do filme.
A coleção, composta com 11 looks, sendo 10 deles monocromáticos, foi feita com dois materiais: moletom e ziberline —deste último, foram usados 30 metros do tecido para a produção dos visuais. Assim, saíram looks que misturam o volume estruturado de vestidos de festa com babados, ombros com armações e aplicações com blusões de moletom em uma paleta que brinca com tons intensos e pastéis de vermelho, pink, verde, azul e amarelo.
É a roupa que eu gostaria de usar para sair".
A. Niemeyer
A natureza cura. Foi com esta ideia na cabeça que A Niemeyer colocou modelos desfilando em círculo em um campo verdejante para mostrar sua nova coleção. "A gente nasceu da natureza e a gente carrega essa força, sinergia, de regeneração na gente. E estávamos em dessincronia com isso. A coleção é uma proposta de fazer as pazes com essa natureza, que nada mais é do que nós mesmos", disse Renata Alhadeff em entrevista após a exibição do filme.
São usados tecidos naturais em calças de pijama, vestidos longos e amplos, acinturados, com estampas geométricas ou simplesmente em cores sólidas que vão desde o verde, branco até o castanho. Fora o caminho das modelos, o aspecto circular da natureza e da vida está presente nos jacquares que dão ênfase à energia feminina que vem dela, a pachamama e sua abundância.
Apartamento 03
A coleção "A Roupa da Janela", do Apartamento 03, foi concebida durante o lockdown, que aconteceu no ano passado, o que influenciou diretamente no processo de criação do estilista Luiz Claúdio.
Foi difícil pensar e fazer uma coleção com a cidade toda fechada e tudo o que a gente tinha era a janela".
Ternos oversized e longos, saias secas e bustiês foram desfilados em um fundo que hora era branco, hora era uma projeção do céu. As cores deste último interferiu na paleta que ia do vermelho, ao azul e ao bege, com estampas que lembravam nuvens e árvores ao vento. Franjas bem longas, quase como saias, balançavam como se fosse um sopro de ar, enquanto as rendas enriqueciam em aplicações, em um esforço consciente de dar a sensação de que estamos sentindo as roupas.
"Tenho sentido muita falta de backstage, que é onde as pessoas podem sentir as texturas das roupas. Por isso, quis passar isso pelo vídeo", falou Luiz Cláudio.
João Pimenta
Enquanto na última edição do SPFW João Pimenta falou de respiração de maneira claustrofóbica, com máscaras de rosto inteiro, o estilista preferiu, desta vez, mostrar uma versão mais alegre do mesmo tempo. "A gente está há um tempo muito grande nesse baixo astral", comentou o artista.
É um olhar escapista em cima do trabalho, sair desse lugar triste e trazer um pouco de alegria para esses tempos".
O estilista partiu de tecidos que já tinha em seu ateliê e de mostruários de lojas de tecido para criar uma coleção colorida e vibrante. Tanto na tonalidade como no acabamento dos tecidos. A alfaiataria, foco da marca, surge como figurino de teatro, com mangas e barras bufantes. João Pimenta continua, ainda, a mistura o shape feminino e masculino: os vestidos amplos, com cintura imperial, um sucesso nas últimas temporadas, também estão nos looks da marca. Assim como o polêmico espartilho, que surge, desta vez, por cima da jaqueta puff.
Poder misturar o que teoricamente é do universo feminino e o que é masculino é uma maneira de João Pimenta ser mais livre em sua criação. "Quando penso que estou fazendo roupas para todos, tenho uma liberdade muito grande no uso de tecidos, de formas, volumes. Sei que alguém vai encontrar essa roupa e se identificar com ela", falou o estilista em entrevista. "Quem define a questão do gênero na roupa não é a marca, o estilista, mas quem compra. A pessoa vai definir na forma em que ela veste".
Neith Nyer
A marca de Francisco Terra estreia no SPFW, mas chega ao fim. É que, na realidade, ela foi rebatizada para Rolê. Nessa transição, o estilista, que mora em Paris, na França, se inspirou no "Xou da Xuxa" e no filme "Xuxa Contra o Baixo Astral" para sua nova coleção. "Xuxa, para mim, é uma figura da felicidade, do sonho, e, durante a pandemia, eu revi vários filmes e episódios do programa dela", comentou Francisco, que chegou a trocar e-mails com a Xuxa.
Queria que essa coleção trouxesse minhas memórias felizes da infância, do sentimento intenso que era vê-la descendo da nave".
Apesar da temática divertida, o vídeo da marca teve padrões antigos: teve plateia (com grande parte usando máscara), desfile na passarela e até uma noiva fechando a procissão. Fora isso, as roupas mostradas estão longe do convencional: peças em vinil, shortinhos jeans micro combinados com meia-calça, botas —muitas delas brancas, como as da Xuxa — indo até acima do joelho, sobreposição de elementos como a rede, o tricô e o vinil. Sem falar nos corações que estavam por toda parte: na saia volumosa de um vestido ou no vazamento do bustiê. "É na infância que descobrimos o que é felicidade e o que é tristeza e queria que isto estivesse presente na coleção, falou o estilista.
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