Rodízio de churrasco ainda é moda? Conheça a história do espeto corrido
Sentar-se à mesa, colocar para cima a cor verde do sinalizador e receber no prato picanha, maminha, coraçãozinho, linguiça e mais uma porção de lascas de carnes que saem dos espetos levados pelos garçons de um lado a outro do salão.
Esse sistema de rodízio até parece banal depois de anos de consolidação, mas em décadas passadas representou uma verdadeira revolução. Criado no Brasil em meados de 1960, o serviço causou euforia no país e não demorou a conquistar o mundo.
O que o rodízio fez para o Brasil é impressionante. Quem provava queria saber mais sobre o país, sobre como comprar terras e investir. O conceito virou uma embaixada", diz o empresário gaúcho Arri Coser, à frente do NB Steak desde 2013.
Assar carnes no espeto é tradição desde o fogo de chão. De acordo com Arri, o Rio Grande do Sul contava com algumas casas de carne à la carte no início da década de 1960. "Chamava-se espeto parado. Era um tripé que era colocado na mesa para apoiar o espeto e deixar ele lá". A carne só era trocada a pedido do cliente.
Ideia com vários "autores"
O pontapé para a criação dos rodízios foi fazer o espeto "correr" diante dos convidados. Segundo a Associação das Churrascarias do Estado de São Paulo (Achuesp), o primeiro a lançar moda teria sido a Churrascaria 477, em Jacupiranga, na divisa do estado de São Paulo e do Paraná.
A fim de solucionar a confusão dos garçons pelo excesso de público provocado pela festa do Senhor Bom Jesus de Iguape, o dono, Albino Ongaratto, resolveu que os funcionários serviriam todos os espetos de mesa em mesa.
O pesquisador das tradições gaúchas Antônio Augusto Fagundes endossa a versão de que o rodízio surgiu na Churrascaria Matias, em Sapiranga (RS). Já o ex-caminhoneiro e churrasqueiro Jandir Caumo é o terceiro a reivindicar a autoria.
Inspirado no restaurante Tia Maria, de Caxias do Sul (RS), onde as bandejas de comida eram trocadas assim que as pedidas esfriavam, ele implementou o espeto corrido em 1968, na Churrascaria Blumenauense, de Quatro Barras (PR).
Independentemente do local de nascimento, a dança dos espetos permitiu que os clientes saboreassem mais variedades de carne sem nem precisar olhar o cardápio. O preço fixo também abriu o apetite dos gulosos. Tornou-se possível comer, comer e comer sem pensar em quanto cada mordida somaria à conta final.
Mais opções do que uma boca pode provar
Comer à vontade carnes sempre quentinhas se espalhou como conceito pelas beiras das estradas e tornou-se um ícone dos caminhoneiros e viajantes.
"Na época, era comum ter um corte de porco, um de cordeiro, um de frango e dois de boi: a costela e uma parte da alcatra", diz Arri. Os acompanhamentos, servidos em bandejas de alumínio, limitavam-se em polenta, mandioca, farinha, arroz e feijão.
Quando chegou às cidades, o rodízio ganhou uma estrutura melhor. Em 1970, surgiu o bufê. Com ele, os comensais passaram a ter mais opções do que seus paladares poderiam provar.
Os cortes de carne também se multiplicaram. Passou a ser mais comum ver uma churrascaria com vinte opções diferentes de espeto do que com cinco. E então chegaram às mesas picanha com alho e coração de frango.
Para dar conta de tanta comida, criou-se o sinalizador de papelão em forma de bolacha. Usado até hoje, a ideia é colocar o lado vermelho para cima quando o estômago dá o aviso de "chega".
O salão também acompanhou as mudanças com a instalação de ar-condicionado, cadeiras confortáveis e adega climatizada. A brigada teve que se adequar a regras de etiqueta, entre elas segurar o espeto da mesma forma.
Um cliente me dizia que o rodízio unia a rapidez do fast food americano, a elegância do serviço francês e a fartura dos italianos."
Apreciado pelo mundo
Apostando em fartura e variedade, as churrascarias ganharam terreno fora do país no fim de 1990 e começo dos anos 2000. A experiência gastronômica de estilo brasileiro conquistou não só a América do Norte, como a Europa, a Ásia e a Oceania.
Além de contar com a iniciativa de grupos brasileiros, como a Fogo de Chão e o Barbacoa, o setor ganhou força com o investimento de estrangeiros. Mesmo sem nacionalidade brasileira, muitos fundaram marcas de sucesso usando o churrasco em rodízio como chamariz.
"Quando eu estava à frente dos negócios fora, sempre vendi a ideia de que fazíamos a cozinha do Sul do Brasil para dar abertura para alguém fazer a cozinha da Bahia, da Amazônia e de outros lugares", afirma Arri, que abriu uma unidade da Fogo de Chão em Dallas, nos Estados Unidos, em 1997, cerca de vinte anos após fundar a rede em Porto Alegre.
O jeito mais fácil de mostrar a cultura do país é pela alimentação. O rodízio deu o primeiro passo."
A vez da "degustação de carnes"
Em 2011, Arri Coser vendeu a sua participação no Fogo de Chão por US$ 230 milhões (cerca de R$ 1 bilhão na cotação atual) para a gestora de investimentos GP. A saída, porém, não foi um adeus do especialista aos negócios de carne.
Dois anos mais tarde, ele se juntou aos sócios da Na Brasa, fundada em 1990 em Porto Alegre. O negócio mudou de nome para NB Steak e estreou um novo conceito. Em vez de rodízio, Arri propõem um menu de degustação de carnes.
Os cortes são preparados direto na grelha de acordo com a ordem do cliente. Picanha e fraldinha são os únicos que seguem no espeto, mas só correm até a mesa quando são chamados.
"Quis eliminar os desperdícios. O bufê, por exemplo, trazia uma grande perda diária que me incomodava muito. Também passamos a olhar para a saúde e a quantidade de gordura em cada carne."
O novo serviço oferecido por Arri mantém a proposta inaugurada pelos rodízios: a de comer carnes à vontade a um preço fixo. É cada vez mais raro, porém, encontrar steakhouses abertas recentemente que compactuem com a mesma ideia.
Fartura da churrascaria saiu de moda?
Arri defende que não se trata do fim de uma tendência, mas da saturação dela.
"Já existem unidades suficientes em São Paulo e outras capitais. Por isso, o investimento necessário para fazer uma churrascaria que consiga competir no mercado de hoje é altíssimo".
Nesse cenário, a entrada no setor de negócios familiares, sem sócios investidores, é bem difícil. Mesmo quem tem o aporte financeiro, segundo ele, precisa achar uma brecha. "Às vezes só é possível abrir uma nova casa se alguma outra fechar. No varejo, isso é mais comum."
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.