Extrovertido e espontâneo, ele se tornou um dos mais conhecidos influenciadores digitais brasileiros residentes no Japão, com quase 800 mil seguidores no YouTube. Com foco em muitas curiosidades — e bizarrices — da cultura japonesa, em 11 anos seu canal "AquiPode — A vida no Japão" acumula cerca de 67 milhões de visualizações, 90% delas acessadas do Brasil.
Nascido e criado em São Bernardo do Campo, Leandro Hiroshi Doi, 32, conhecido na internet como Hiro, chegou ao arquipélago quando tinha 9 anos, sem saber nada da língua japonesa.
Diferentemente de muitos imigrantes de sua faixa etária e com trajetórias semelhantes, ele não foi matriculado em escola japonesa e concluiu o ensino médio em uma das dezenas de escolas brasileiras existentes no Japão.
Aprendi japonês praticamente lendo mangás e assistindo a animes e programas de TV", conta o youtuber, que também costuma inserir elementos da cultura pop nipônica em seus vídeos.
Com a intenção de economizar dinheiro para fazer uma faculdade no Brasil, em 2007 Hiro começou a trabalhar como operário em uma fábrica, a exemplo da maioria dos decasséguis (como são chamados os descendentes de japoneses que migram para trabalhar, a princípio temporariamente, no Japão).
No fim de 2008, com a crise econômica mundial, ele foi um dos muitos brasileiros demitidos e passou meses desempregado. Já familiarizado com o idioma, em 2009 começou a trabalhar como tradutor em escolas, emprego em que permaneceu por sete anos.
Nasce uma família youtuber
A criação de um canal no YouTube se deu de forma despretensiosa, em maio de 2010, em parceria com um amigo. "Éramos dois jovens que queriam se expressar de alguma maneira e, inicialmente, a proposta era comentarmos algumas notícias, um formato comum hoje em dia", lembra Hiro.
O nome AquiPode, diz, é inspirado em uma expressão que usavam muito em seu dia a dia, para questionar algumas coisas que "não se pode" fazer no Japão e tentar justificar algum ato proibido que cometiam.
Se havia algo que não se podia fazer, a gente costumava rebater: 'Ah, mas aqui pode!'. E resolvemos adotar essas duas palavras como nome do canal."
Só depois surgiu o subtítulo "a vida no Japão". A dupla percebeu que muitos internautas tinham curiosidade de conhecer o cotidiano do país que tanto fascínio desperta em muitos jovens brasileiros e começou a gravar vídeos sobre o assunto.
"Meu amigo precisou voltar para o Brasil em 2013, quando passei a filmar sozinho. E o público seguiu crescendo, enquanto fui ganhando mais experiência e tendo novas ideias", lembra Hiro.
Um personagem muito bem-humorado, então, passou a fazer participações nos vídeos: seu pai Sérgio Tsuyoshi, hoje com 70 anos, que na internet se identifica como Karatezudo.
Das bizarrices à desconstrução de clichês
A brincadeira ficou séria mesmo a partir de 2015, quando Hiro chamou a atenção da agência japonesa Breaker, que passou a gerenciar sua carreira digital.
A empreitada passou a atrair patrocinadores e deu mais profissionalismo aos vídeos, que antes eram feitos no formato selfie e passaram a contar com uma equipe de produção. As pautas se tornaram mais elaboradas, sobretudo com as temáticas mais apreciadas pelas centenas de milhares de seguidores.
As coisas consideradas bizarras são as que mais dão audiência, além dos vídeos com conteúdo adulto", relata.
De bizarrices, ele cita como exemplos estabelecimentos comerciais inusitados, como um bar de Tóquio em que o atendimento é feito somente por mulheres musculosas ou o restaurante Momomaru, de Nagoia, em que o garçom é um "tiozão esquisito" fantasiado de Lolita — e que o youtuber chegou a beijar.
Já o conteúdo restrito incluiu, por exemplo, entrevistar uma atriz pornô japonesa e jantar no extinto restaurante Alcatraz, em Tóquio, que possuía temática hospitalar e pratos repletos de referências eróticas ou nojentas, como uma excêntrica gelatina avermelhada servida em um absorvente feminino.
Um dos vídeos marcantes para o youtuber foi gravado no Halloween de 2018, quando, fantasiado de Pokémon, ele se propôs a entrevistar jovens japoneses nas ruas de Shibuya, um dos lugares mais movimentados de Tóquio.
"Estava com receio de fazer perguntas íntimas, algumas delas meio capciosas, mas as pessoas foram muito receptivas e entraram na brincadeira", diverte-se. "Cheguei a pedir japoneses em namoro e uns aceitaram e até me beijaram, algo que eu realmente não esperava."
Atualmente, Hiro mora em Toyota, na província de Aichi, e também trabalha como agente de manutenção de rodovias para garantir um salário fixo. "Viver só de internet é muito instável, é uma renda que oscila muito. E, nesse trabalho nas rodovias, tenho flexibilidade de horários para pedir dispensa quando preciso fazer alguma gravação", explica.
O youtuber espera que seus vídeos sirvam para desconstruir alguns clichês e mostrar outras facetas do Japão para os brasileiros, inclusive os que já residem no arquipélago. "Meu intuito é mostrar que neste país não há só animes e outros estereótipos fantasiosos, e que muitos japoneses não são frios ou fechados, como se imagina.
Gosto de apresentar aos internautas o Japão nu e cru, inclusive seu lado meio 'sujo', sem construir a imagem de um país perfeito que não existe"
Ele se diz feliz quando internautas decasséguis contam ter conhecido algum lugar que viram em seus vídeos.
"Muitos se limitam a circular só por ambientes brasileiros ou ir ao shopping center no fim de semana. E assim deixam de conhecer a cultura japonesa e muitas coisas bacanas ou curiosas que existem no Japão."
AQUI NÃO PODE
Em alusão ao nome de seu canal no YouTube, pedimos que Hiro indicasse sete coisas que um turista não pode fazer no Japão — inclusive, ele saberá disso se vir um japonês fazer um 'X' com os braços, o gesto chamado "damme", que indica uma proibição.
1. Fazer mau uso dos palitinhos. "Existe toda uma etiqueta em torno do hashi. Não se pode balançá-lo sobre a comida, usá-lo para cutucá-la ou enfiar um dos palitos nela. Também é muito mal visto passar a comida de um hashi para o de outra pessoa", explica;
2. Colocar o molho shoyu diretamente no arroz de um sushi;
3. Falar alto ou usar o telefone celular em público ou em transportes públicos;
4. Tirar fotos em concertos musicais. "Fui tentar fazer isso uma vez e, rapidamente, um segurança surgiu colocando a mão na minha lente e exigindo que eu parasse de filmar", lembra o youtuber;
5. Beijar em público;
6. Entrar em um onsen sem se banhar antes. "Onsen é uma espécie de banheira coletiva de águas termais. O propósito dela é apenas relaxar o corpo, mas, antes de adentrá-la, é preciso lavar-se";
7. Usar onsen, piscinas ou academias com tattoos visíveis. "Essa cultura está mudando aos poucos, mas as tatuagens ainda são mal vistaspor muitos japoneses", finaliza Hiro.
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