O wasabi que você come não é wasabi; entenda a contradição
O que se compreende como wasabi é aquela pastinha verde colocada no canto dos combinados de sushi. Muitas dela, porém, não apresentam nem zero vírgula alguma coisa por cento da planta.
São produzidas à base de mostarda ou de raiz-forte (vegetal de origem europeia da mesma família do japonês) e levam corante mais aromatizante na composição. Elas tentam reproduzir a experiência gastronômica original.
Diferentemente da pasta, que arde as narinas sem dó, porém, o wasabi fresco tem picância delicada e complexidade. Os óleos essenciais dão certa doçura e um toque herbáceo.
Se o wasabi de verdade é melhor, por que, então, não é esse que comemos?
"Ele é chato", resume bem Telma Shiraishi, embaixadora da gastronomia japonesa no Brasil e dona do restaurante paulistano Aizomê.
A explicação extensa é que a planta cresce num microclima específico das montanhas do Japão, principalmente nas regiões de Nagano e Shizuoka, onde está o Monte Fuji, e não é lá muito de se adaptar.
"Ele precisa de alta altitude e de água gelada e abundante. Além disso, demora dois anos para alcançar o tamanho comercial. Isso se não tiver nenhum imprevisto ao longo desse tempo", diz o agrônomo Vinicius Abuno.
Ele e a família são um dos poucos aventureiros pelo mundo a encarar o desafio de cultivar wasabi fora do país oriental. A produção teste em Pilar do Sul, no interior de São Paulo, é única do Brasil.
Para chegar ao que eles têm hoje, foram seis anos de pesquisa, muitas viagens e a implementação de uma tecnologia especial. Mesmo assim, atualmente só conseguem atender o restaurante Murakami, em São Paulo. Vinícius crava:
A produção sempre estará aquém da demanda".
Telma contextualiza: "depois do "boom" do sushi vieram as versões industrializadas que mimetizam o aroma, o sabor e a picância do wasabi. Não se trata de querer enganar. O produto fresco não atende o sushi que é consumido no mundo inteiro".
Quilo a R$ 1.420
Uma prova disso é o próprio Japão. Lá, o uso da iguaria fresca fica restrito a poucos restaurantes que conseguem a mercadoria e, mais do que isso, que podem pagar por ela.
O espanhol Gerard Barberan, chef executivo e sócio do paulistano Kurô, às vezes traz para a cozinha do seu restaurante exemplares cultivados na Catalunha e conta que, na Europa, o preço do quilo sai por até 230 euros — ou R$ 1.420.
Tamanha valorização faz com que mesmo as versões industrializadas que possuem de 0,5% a 1% de wasabi se destaquem, em preço e qualidade, em meio às inúmeras opções com sabores artificiais.
Não à toa, os cozinheiros que conquistam a planta, da qual utiliza-se o caule, seguem alguns protocolos, como ralar na hora para não perder as propriedades e evitar misturas.
"Normalmente, o wasabi vai por cima do sushi e não é recomendado colocar shoyu. O wasabi não é, nem nunca vai ser, o personagem principal do sushi, mas potencializa o peixe e qualidade técnica do chef", diz Vinicius.
Demanda do público
Se por um lado o acesso complicado à iguaria é motivo de frustração para os cozinheiros entendidos de culinária japonesa, por outro, a raridade faz com que o produto ainda não seja um objeto de desejo por parte dos clientes.
Gerard fala sobre a sua experiência com o público:
O wasabi não é procurado pelos consumidores como um atum bluefin, por exemplo. Trouxe para o Kurô porque quero ter produtos frescos, não porque algum cliente me pediu."
Apesar de estar longe de ser a maioria, quem tem a chance de provar uma vez, é claro, fica vontade de comer de novo. Como querer não é poder, por ora vamos de pastinha.
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