Bordado na madeira é arte que ousa e aplica texturas em móveis singulares
Domingo, após o almoço, a sala da casa da avó de Lorena Leão virava uma festa: as mulheres da família se reuniam para bordar. As cenas de gargalhadas, o papo, as linhas e o cafezinho mineiro em Ipatinga, Minas Gerais, tiveram um efeito poderoso na vida da menina.
"Cada uma delas tinha a técnica que gostava mais: era crochê, tricô, ponto cheio...uma verdadeira fartura de material e de imagens. Eu era a neta mais velha e fui apresentada assim ao fazer manual", conta.
Da infância à juventude ela viu o Brasil se industrializar e perder o interesse pelo bordado. Ela mesma deixou de lado linhas e agulhas, e quando viu, era uma jovem arquiteta à frente de um escritório fazendo algo que não gostava tanto assim. "Comecei a direcionar meu trabalho para interiores, que era onde me encontrava melhor. Quis estudar Design de Mobiliário e foi aí que surgiu a vontade de assinar algo autoral, com a minha cara."
No curso, precisaria desenvolver uma peça para apresentar na conclusão, em 2014. "Sempre gostei de moda e a forma como ela conta uma história, usando estampa, textura e formas. Quis fazer o mesmo com o mobiliário."
Matéria viva
No caminho, a madeira veio como o suporte ideal. Afinal, Lorena cresceu vendo o pai brincar com madeira maciça, com muita liberdade para explorar as possibilidades do material. Isso a guiou a descobrir sua arte.
Sempre observei a versatilidade da madeira. Ela tem muita força, é viva, tem poder e energia. É muito rica, tem cheiro, textura."
Lorena se desdobrava para surpreender com algo inédito — até que lembrou-se dos bordados da infância. Por mais que fosse ousado bordar madeira, ela via a chance de resgatar o significado que ele tinha em sua vida.
"Era mais significado do que estética. Minha mãe me apresentou o bordado como algo sofisticado, como arte. Eu via processo criativo por trás, quando ela pintava uma renda para compor uma criação. Para mim, era essa construção que interessava."
Logo, bordar móveis foi um caminho natural. "Quando falei para a coordenadora do curso que seria esse meu projeto, ela me ignorou. Cheguei com o primeiro teste e ela mudou de ideia, se encantou. Foi muito desafiador, porque não tinha referência nenhuma na época", conta.
Mídias sociais não tinham a força de hoje. O perfil @lorenaleao_collections é recente e faz parecer que foi rápido esse encontro de Lorena e sua arte. Mas levou ainda um período de quatro anos de teste, um curso de marcenaria a fim de conhecer a madeira certa para cada bordado e otimizar etapas, e ainda outros cursos de Moda.
"É uma produção lenta, levo três dias só para bordar uma peça. No total, o processo leva 45 dias", conta a artista. Entre eles, é preciso descanso: as mãos ganham calos e se machucam. Usa-se mais de seis agulhas importadas, afinal, as nacionais quebram. A linha sintética é a mais resistente, não desfia como as de algodão.
"Levou tempo para descobrir tudo isso. Vejo muito da arquitetura no que faço, e no conhecimento de bordado. Mesclo tudo isso com a parte criativa", explica ela. Por mês é possível ter até cinco peças.
O bordado atravessa gerações
Se há sete anos algumas tias não acreditavam muito, atualmente elas se juntam a Lorena quando há uma encomenda maior. "No começo, quando contei para minha avó, ela ficou em silêncio. Em seguida, veio com quadrinhos, amostrinhas de ponto cruz e crochê para me ajudar. Nunca me esqueço dessa tarde com ela. Foi de uma sensibilidade linda, uma das únicas que me apoiaram", diz Lorena, emocionada.
Sua avó não está mais aqui para ver que a neta lançaria sua marca própria em meio a uma pandemia. O nome da coleção é Fé — à venda em galerias de arte, em exposição na Casacor de São Paulo. E é só o começo.
@s que me inspiram
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