Inflação do turismo chega a 16,75% e voos estão 50% mais caros
Os avanços da vacinação contra a covid-19 no Brasil neste segundo semestre de 2021 têm aumentado a demanda por viagens nacionais e internacionais — mesmo com o real cada vez mais desvalorizando frente ao euro e ao dólar.
Com tanta procura em um tempo ainda de restrições e adaptações da indústria turística, viajantes estão enfrentando um considerável aumento de preços no setor. É a chamada "inflação do turismo": mesmo nas viagens domésticas tudo está mais caro. Ao longo dos últimos doze meses, a inflação acumulada no turismo brasileiro é estimada em 16,75%, segundo levantamento de Mariana Aldrigui, presidente do Conselho de Turismo da FecomercioSP.
Com exclusividade para Nossa, a pesquisadora levou em conta na elaboração do levantamento dados referentes aos custos de transporte, hospedagem, pacotes de viagem e alguns atrativos culturais. A estimativa não inclui gastos com alimentação.
O maior aumento ficou por conta das passagens aéreas (50,11% em doze meses), seguido por aluguel de veículos (19,94%), pacotes turísticos (16,76%) e hospedagem (4,44%). Considerando o IPCA geral de 10,67%, a variação real da "inflação do turismo", segundo a pesquisadora, estaria 5,49 pontos percentuais acima da inflação brasileira.
Planos revistos
A alta inflação geral no Brasil pressiona o poder de compra de viagens para inúmeras famílias. "O valor que tínhamos separado para viajar após nossa segunda dose da vacina não é mais suficiente para a viagem que pretendíamos fazer a Portugal", conta Ricardo Seroni, de Indaiatuba, interior de São Paulo.
Com a inflação no Brasil e o euro e o dólar impraticáveis como andam, mudamos o destino para o Nordeste brasileiro e encurtamos a duração da viagem para adequá-la ao que podemos pagar nesse momento", lamenta.
Por outro lado, há um número importante de pessoas que, após a segunda dose da vacina, estão deixando agora o isolamento social e querendo matar o desejo de viajar novamente o mais rápido possível. E isso também impulsiona os preços para o alto.
"Os preços aumentaram, sim, de forma geral. É a velha lei da oferta e da procura", afirma Jacque Dallal, proprietária da Be Happy Viagens.
Toda a demanda reprimida da pandemia veio praticamente de uma vez só e os fornecedores estão 'tirando a barriga da miséria mesmo' ", diz.
O turismo nacional segue em franca ascensão e registrou a quinta alta consecutiva no ano, segundo levantamento do Conselho de Turismo da FecomercioSP, com base nos dados da Pesquisa Mensal de Serviços, do IBGE. De acordo com o levantamento, em agosto passado o turismo nacional faturou 12,7 bilhões de reais, 33,3% a mais em relação a 2020, acumulando alta de 6,3% no ano.
A procura pelas viagens nacionais tem sido tão grande neste segundo semestre que diferentes hotéis e pousadas em distintos destinos brasileiros bateram recordes históricos de ocupação em julho e agosto. "Muitos hotéis brasileiros com 15, 20 anos de existência estão fazendo em 2021 o melhor ano de sua história", conta Jacque Dallal.
Aumento indiscutível de preços no setor
Mariana Aldrigui, professora e pesquisadora da EACH/USP e presidente do Conselho de Turismo da FecomercioSP, é taxativa:
Não há dúvidas de que todos os preços dos serviços ligados ao turismo aumentaram ou aumentarão nas próximas semanas".
Segundo Mariana, há um contingente muito grande de pessoas com renda disponível para realizar viagens que estão consumindo e gastando mais do que antes.
Além do aumento considerável na demanda em relação à restrição de oferta destes tempos pandêmicos, Mariana explica que o maior volume de brasileiros escolhendo viajar no Brasil em função da desvalorização do real em relação ao dólar também contribui para esse aumento de preços por aqui.
"As condições econômicas se deterioraram muito rapidamente, com elevação dos preços de insumos básicos e combustíveis, inflação e consequente perda do poder de compra das famílias. Isto quer dizer que o preço das passagens aéreas, por exemplo, terá aumento em função da elevação do dólar, que determina o preço do combustível da aviação, e também uma pressão em função da demanda", explica.
A professora faz também uma ressalva importante ao fato de tantos empresários desta indústria não conseguirem manter preços antigos em função dos aumentos generalizados no custo das matérias-primas.
Isso, infelizmente, cria mais uma situação preocupante: a impossibilidade de aumentar as equipes de trabalho, adiando ainda mais a recuperação de empregos no setor turístico", lamenta.
Ela explica também que, após tanto tempo de paralisação da indústria turística sem isenção de impostos e custos mínimos operacionais, este é também o momento do setor adequar os preços à capacidade de pagamento da demanda que existe hoje.
Mas ela pede cautela com os ajustes: "Se considerarmos que a situação econômica não é reversível no curto prazo, a preocupação passará a ser o efeito das reclamações de consumidores que não conseguirem realizar viagens dentro de seu orçamento, gerando comentários negativos e de alto índice de compartilhamento nas redes sociais", teme.
Aquecimento do mercado supera prognósticos
Segundo levantamento da ABAV (Associação Brasileira das Agências de Viagens), o mercado turístico está mesmo superaquecido no Brasil, com procura altíssima para todos os períodos e temporadas — mesmo com a oferta ainda reduzida em tantos hotéis, companhias aéreas e prestadores de serviços.
No momento, a maior demanda é para viagens com embarque imediato ou em datas bastante próximas, sobretudo envolvendo destinos como Bahia, Alagoas, Pernambuco, Caribe, Dubai, Maldivas, Portugal, Espanha e, desde o anúncio da reabertura, EUA.
A procura por saídas de Natal e Réveillon também está em alta, acima de 60% nas últimas semanas, segundo o mesmo levantamento. E o Carnaval 2022 já conta com aumento da demanda, principalmente para destinos do Nordeste. Os pacotes mais procurados atualmente são para viagens em família (32,1%).
Assim, o turismo doméstico já está próximo dos níveis pré-pandemia e o internacional finalmente começa a retomada, ficando entre 40% e 50% dos níveis anteriores neste momento, segundo a ABAV.
Das agências de viagem pesquisadas, 34,6% estimam aumentar o faturamento em pelo menos 60% nos próximos 12 meses. 80,8% delas acreditam na retomada do faturamento em índices próximos ao período pré-pandemia em dois anos. E 76,9% das agências registraram também aumento de novos clientes, corroborando a valorização do segmento durante a pandemia. Vale lembrar que agências não têm ingerência no preço final do pacote ou serviço (aéreo, hotéis, locações de veículos, receptivos etc).
A paranaense Ana Guerra justifica esses números crescentes. Desde a segunda dose da vacina, procurou uma agência de viagens pela primeira vez em nove anos e já reservou três viagens diferentes até o Carnaval, incluindo uma internacional.
Os preços estão muito altos, sim, para todos os destinos; mas a minha vontade de viajar depois de todo esse tempo em casa é maior que tudo isso", brinca.
Produtora de moda, Ana conta que decidiu mexer nos investimentos, antes pensados para o longo prazo, e utilizá-los agora nas viagens. "Não quero mais deixar para amanhã as viagens que posso fazer agora porque não sei como será o amanhã", filosofa.
Alta das viagens internacionais também
No mercado de viagens internacionais, as buscas por passagens aéreas, hotéis e pacotes também estão superaquecidas, com demanda maior a cada nova reabertura de fronteira internacional para brasileiros. Com a abertura dos EUA, por exemplo, só a procura por passagens aéreas ligando os dois países cresceu até 450% para algumas companhias aéreas.
Depois de o setor enfrentar no ano passado a pior crise de sua história, hoje, de cada dez agências de viagem brasileiras, seis já estão recontratando funcionários. Muitas bateram recordes de vendas nos últimos meses e a procura por pacotes domésticos já está quase no mesmo patamar pré-pandemia, sobretudo focando no verão brasileiro.
No levantamento da ABAV, agentes e consultores de viagem apontaram como principais entraves para a real retomada do turismo internacional as incertezas sobre quando será o final da pandemia, a malha aérea ainda reduzida, a ausência de um padrão nas regras de admissão de turistas estrangeiros em diferentes países e, é claro, a gigantesca desvalorização do real.
Bruno Vilaça, proprietário da Superviagem, confirma que estamos vivendo uma demanda superaquecida com a abertura das fronteiras e a proximidade com a alta temporada.
Mas a oferta de voos ainda enxuta, com muitas companhias ainda com voos limitados para o exterior e necessidade de recomposição de caixa, limitam a oferta de promoções mais agressivas nesse momento. Sem contar a taxa de câmbio desfavorável como nunca antes visto no Brasil", afirma.
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