Por que o champanhe é a bebida oficial de celebrações?
Oscar Wilde, fã devoto de Perrier-Jouët, marca fundada em 1811 e que fazia muito sucesso na Belle Époque, teria dito que "só pessoas sem imaginação não encontram motivo para beber champanhe". Pouco mais de 100 anos depois, uma das mais divertidas comunidades do saudoso Orkut demandava no título: "Pela banalização do champanhe!".
Mas por que o champanhe? De onde veio isso de associar a bebida, e espumantes em geral, a tudo que é tipo de celebração, de formaturas a pódios da Fórmula 1, de bodas a batismos de navios?
Essa fama se deve à realeza francesa, com uma boa mãozinha dos ingleses. Consumidores frenéticos do vinho produzido na região de Champagne, os britânicos foram os primeiros, em 1662, a documentar e buscar uma padronização no acréscimo de açúcar para formar bolhas.
Naquela época, as borbulhas surgiam no vinho acidentalmente, podiam fazer as garrafas explodir e eram vistas como um defeito a ser evitado. Mas com o tempo elas caíram nas graças e os produtores começaram a investigar como domá-las.
Já a relação entre Champagne, a região, e os reis franceses é ancestral. Clóvis, o primeiro rei dos francos, foi batizado em uma igrejinha em Reims em 496. A construção deu lugar a uma catedral, onde, ao longo dos séculos, a maioria dos monarcas da França seria coroada. Reims cresceu, virou a maior cidade da região e é sede de muitas vinícolas locais.
Durante o emblemático e absolutista reinado de Luís 14, que comandou o país por 72 anos, a bebida de Champagne teve um salto de qualidade, graças, em boa medida, às inovações do monge Pierre Pérignon, que envolviam novas técnicas de poda e combinações de uvas.
A era Luís 14 marcou também o início do investimento do país na produção de móveis e espelhos para a nobreza, tido como um dos primeiros passos da dominação mundial do mercado de luxo pelos franceses.
Uma bebida que se desenvolvia, um país que se modernizava, um rei que não conhecia limites de ostentação. Tempestade perfeita para o champanhe, que caiu nas graças da corte do Rei-Sol. No reinado de seu sucessor, Luís 15, a bebida conquistou de vez a nobreza.
No século 18, foram altos e baixos de popularidade, mas de maneira geral a bebida se espalhou para outras casas reais e rompeu as fronteiras da monarquia. Em 1796, George Washington, primeiro presidente dos Estados Unidos, ofereceu champanhe em um jantar oficial da jovem república, lembra a escritora e jornalista americana Becky Sue Epstein em "Champagne: A Global History" (sem edição brasileira).
No século 19, a Revolução Francesa e a Industrial providenciaram outro salto à bebida. A primeira matou nobres aos montes, e aqueles que fugiram comemoravam o fato de estar vivos bebendo champanhe, o que reforçou a relação comemorativa em outros países. A segunda trouxe tecnologias para melhorar produção, armazenamento e transporte. Com garrafas mais resistentes e ferrovias, o espumante ficou mais acessível e democrático.
Durante a Belle Époque, período de efervescência cultural na França e na Europa entre o fim do século 19 e o começo do 20, as já consagradas casas de Champagne, como Veuve Clicquot e Möet et Chandon, passaram a investir em publicidade ligando seus produtos aos momentos de alegria e celebração.
"Anúncios em jornais, especialmente em épocas próximas ao Natal e ao Ano Novo, associavam encontros familiares com champanhe", escreveu a historiadora Kolleen Guy em "When Champagne Became French" ("Quando o champanhe se tornou francês", sem edição brasileira"), livro que explica como esse tipo de vinho de luxo ajudou a forjar a identidade nacional francesa naquela época.
Desde então, o champanhe se solidificou como bebida para ocasiões especiais. A aura festiva cobriu também os outros espumantes, já que a magia está, em boa parte, nas bolhas inebriantes. Outro fator que explica isso é o preço. Champanhe é, em geral, mais caro que espumantes de outros países, como cava, da Espanha, prosecco, da Itália, ou os premiados espumantes brasileiros. E é muito mais caro do que as populares sidras industrializadas.
No século 20, o champanhe enfrentou guerras e epidemias que ameaçaram seriamente sua existência. Mas, mesmo que o mundo ficasse mais triste com a sua extinção, ainda haveria bolhas escalando taças e brindes com outras bebidas. Isso não aconteceu, o que já é um motivo para celebrar. Tim-tim.
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