'A moda do Rio vem do morro': marca propõe um novo estilo carioca
Rafael de Oliveira nasceu em Mato Grosso. Já Chola Tello, no Peru. Há quase dez anos, o encontro dos dois amigos em um hostel no Rio de Janeiro deu luz à Retropy, uma marca de roupas que se inspira no "carioca belo, mas não polido" para a produção de suas peças — que conquistam identidade e relevância própria no Instagram. Tudo isso no caminho contrário ao previamente consolidado.
Na mais recente campanha de verão da marca, intitulada "Meninos do Rio", a dupla realizou um ensaio no emblemático bairro de Copacabana. Um dos cartões postais da capital. As fotos são protagonizadas por modelos negros "sem cabelo de gel e o peito liso depilado", como reforça o diretor criativo e fundador Rafael de Oliveira em entrevista para Nossa.
Essa imagem, inclusive, é um dos pilares para a construção de identidade da marca e a quem ela propõe vestir.
"É muito cômodo colocar um menino branco na praia para uma campanha em Copacabana", diz Rafael. "Não é sobre usar roupa de seda na praia. Quem faz a praia acontecer é o barraqueiro, quem vai colocar sombrinha na praia, quem vende o mate. São todos pretos".
Ainda sobre a abordagem, Rafael complementa:
A potência estética do Rio hoje não é Tom Jobim, Niemeyer. Não é isso mais. A gente já não mora mais nesse lugar de elite que teve acesso a muitas coisas. Hoje, a moda do Rio vem do morro. Os dois grandes produtos estéticos do Rio são o funk e o carnaval."
Antes disso, a história da Retropy dava os primeiros passos quando a peruana Chola Tello comprou uma máquina de costura. A intenção era criar roupas para uso próprio. As peças então começaram a despertar curiosidade dos que as viam nas ruas. Foi quando Chola se juntou a Rafael para dar um pontapé inicial para a marca — que despontava a partir da divulgação "boca a boca".
A união dos dois para criar uma etiqueta já começou de forma não convencional. Isso porque Rafael se formou em arquitetura, enquanto Chola em agronomia. Aos poucos, o estilo carioca descomprometido, embora meticuloso, da Retropy ganhava forma.
O início com sete camisas rapidamente virou uma produção de 100 roupas: "Tudo aconteceu numa avalanche de despreparo. Fomos aprendendo errando", brinca Rafael.
As primeiras vendas começaram no Facebook e posteriormente migraram para o Instagram — onde uma imagem literalmente vale mais do que mil palavras.
"A moda tem essa sedução imagética, muito da potencia do mercado de moda está na imagem. É muito louco hoje tendo mais conhecimento e observação de mercado, eu fico vendo que, pouco é sobre produto, e muito é sobre imagem, mood e o lifestyle", opina Rafael, citando a relevância conquistada por grifes internacionais, tais como a Balenciaga a e Jacquemus.
Iroicamentoe, o trabalho nas mãos de dois não-cariocas, ainda assim, fez da Retropy uma marca "terrivelmente carioca". Por mais que ambos flertem com informações da moda que são do mundo, a versão produzida por eles buscam trazer as particularidades do Rio.
"Acho que o Rio é uma cidade bonita, sensual. Então, existe algo meticulosamente pensado. Acho que o menino que a Retropy cria tem isso: ele está de regata, sandália, bermuda, mas está pensado como bonito", detalha Rafael. "No fim das contas ele quer estar bonito. Não existe um contra-comportamento, porque por mais que a gente esteja dentro de uma estética de descompromisso, é um descompromisso com finalidade plástica, do belo".
Eu sou um homem preto. Acho muito bizarro esse lugar elitista que a gente leva para as coisas de moda. A moda não pode morar em um lugar que reproduza aristocracia e privilégios, ou seja, apenas o belo que já é consolidado. É preocupante as pessoas ficarem replicando o Rio enquanto bossa nova, orla, Ipanema. A 'era de ouro do Rio'. Mas que era é essa? De arquitetura europeia, moda europeia? Gucci em frente à praia?
Marca nacional com identidade
Rafael de Oliveira cita a identidade como um dos pilares principais da Retropy. Para ele, é cômodo fazer uma marca nacional copiando as europeias: "Nem tudo precisa ser regionalista e tropical, mas considero um desserviço olhar para o Brasil, em 2022, e ser bege, minimalista, ser apático. Tenho preguiça disso. É uma concepção equivocada de ser chique."
Essa abordagem fica evidente na página oficial da Retropy no Instagram. As cores ganham vida e ilustram a visão da dupla sobre quem ocupa, de fato, o Rio de Janeiro.
"O genérico por mais que seja de fácil leitura e abrangente, ele não fideliza", opina. "Acho que o minimalismo tem um caminho muito perigoso que é esse de não pertencimento. Ele não conta historia nenhuma, é global."
Nesse caminho, o mato-grossense tem uma busca para a etiqueta criada ao lado de Cholla: uma assinatura.
"Quero que as pessoas tendo orgulho de estarem usando a marca. Não pelo peso de etiqueta, que na minha opinião é algo velho para a moda. Nem pelo preço ou pelo fato de ser de 'seda pura'. Mas pela história que a marca conta."
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.