Sem máscaras nas ruas, Dinamarca sorri para a ideia de vida "pós-pandemia"
Basta sair por uma das portas do Aeroporto de Copenhagen-Kastrup, na capital da Dinamarca, que a nova realidade do país se impõe para os locais e visitantes.
Nas ruas, nas lojas, nos restaurantes e até no metrô que conecta o maior aeroporto dos países nórdicos ao centro da cidade, é praticamente impossível ver uma pessoa sequer com uma máscara de proteção a cobrir o nariz e a boca.
Desde 3 de fevereiro, o governo dinamarquês decidiu abolir o uso de máscaras de sua população como parte da flexibilização das medidas preventivas contra a covid-19 — com exceção dos aeroportos e dos hospitais, claro.
Foi o primeiro país da União Europeia a fazê-lo, mesmo quando as taxas de infecção estavam entre as maiores da Europa — com 46 mil novos casos diários em média na última semana, recorde para o país.
O pacote, anunciado pelo governo — e criticado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) —, tem como base a ideia de que a doença precisa ser tratada como uma endemia: ou seja, que precisamos lidar com ela como fazemos com as gripes — o termo foi que a covid-19 já não representava um "risco social elevado" para uma população com mais de 90% de pessoas vacinadas e chegando a 65% com a dose de reforço.
Muitos casos, poucas mortes
A baixa taxa de mortes foi certamente o que ajudou os representantes a optarem pela decisão polêmica, que teve pronunciamento contra por parte de membros da OMS, de que ainda "não é o momento de acabar com todas as restrições de uma só vez".
O fim da obrigatoriedade do uso de máscaras é talvez a medida mais visível da política local com relação à nossa fase da pandemia, em que já não existem regras de distanciamento nem de capacidade máxima para os estabelecimentos comerciais e eventos.
E, pelo sorriso estampado na cara dos dinamarqueses, a ideia de normalidade pode mesmo trazer um novo sentido para os países à medida que a restrições vão sendo levantadas.
"Desde o final do ano passado, estava sendo muito difícil ter trabalho", diz Danesh Khan, o taxista paquistanês que me leva até uma zona periférica da cidade.
Aqui, muita gente se acostumou a ficar sem máscara, voltar a usá-la foi um martírio", afirma.
Já em outubro do ano passado, a Dinamarca flexibilizou o uso da proteção e de outras medidas quando a pandemia parecia mais controlada no país. Mas veio a ômicron e transformou o cenário local — e em boa parte do mundo.
Apreensão no ar
O medo de que tudo voltasse aos padrões dos primeiros lockdowns deixou o mundo apreensivo. A alta taxa de transmissibilidade da nova variante colocou ainda mais pressão sobre os governos — e, em alguns casos, também nos hospitais.
Na Dinamarca, as internações chegaram a 1.300 casos em um único dia de fevereiro, ainda que o país tenha contabilizado uma taxa de mortes bem baixa (4.068) pelo número total de contaminados (cerca de 2,3 milhões).
Mas nada que assustasse de fato a população, aparentemente. Pelas ruas de Copenhagen, o clima que vi é o de "liberou geral". Nos arredores do Tivoli, o parque de diversões mais famoso da cidade, que reúne em torno de si muitos bares e restaurantes, grupos de jovens se reúnem para beber e conversar sem qualquer distanciamento ou preocupação.
Nos trens de ônibus e transportes públicos, os únicos que parecem ainda dispostos a cobrir os rostos são os asiáticos e alguns pouquíssimos idosos. Em 20 minutos esperando pelo trem na Estação Central, não houve uma pessoa sequer que utilizou o dispenser de álcool em gel do lado da catraca principal.
"Claro que os casos se alastraram. É impossível não conhecer alguém que não esteja infectado", diz a confeiteira portuguesa Matilde Urbano, que trabalha em um café local, o Apotek 57.
Mas acho que, mesmo assim, as pessoas se sentem mais seguras do que nunca", acrescenta.
Quase normal
Realmente, a sensação geral é mesmo de segurança. Como se existisse uma bolha em torno da cidade que desse cabo do vírus antes dele pensar em chegar. As lojas estão cheias, os hotéis chegaram a 80% de capacidade e os restaurantes não têm disponibilidade de reserva.
"Não temos mesas disponíveis para as próximas três semanas", me escreve o chef Jonathan Tam, do recém-aberto Jatak, que virou uma febre na cidade.
Mas te mantenho informado em algum caso de desistência: tem gente cancelando todos os dias", esclarece, sobre os novos positivos.
Para sorte dos clientes dele e para minha consternação, nenhum aparentemente foi infectado no final de semana em que passei lá. Curioso é que o público é quase todo local: o inverno é baixa temporada de estrangeiros por conta do frio (que se manteve entre os 0ºC e os 3ºC) e muita gente ainda se sente insegura de viajar.
"Aqui, as pessoas querem prestigiar os comércios e serviços locais mais do que nunca", explica o também chef Henrique Castilho, do Apollo Bar. Em tempos em que as restrições já não existem, os moradores querem sair de casa mais do que nunca, em clima quase pré-pandêmico.
Em todos os casos, o governo tem se esforçado para mostrar que optou por um bom caminho. Por isso, nem tudo é tão livre assim: embora não obrigue que seus visitantes tenham certificado de vacinação ou que consigam comprovar que já estiveram infectados, é exigido que, nesses casos, as pessoas sejam testadas assim que entram no país.
Os testes do tipo antígeno ou PCR podem ser feitos no próprio aeroporto de forma gratuita (como em todo o país, aliás, inclusive para turistas). Em algumas situações, também é obrigatório manter isolamento por 10 dias acompanhado de perto pelas autoridades locais. Uma prova de que estão cuidando dos seus.
Devidamente vacinado (e recuperado de uma infecção recente), pude sair direto do aeroporto para uma vida de normalidade que, desde o início da pandemia, não presenciava. Foi estranho andar sem máscara pelas ruas. Mas confesso que foi também libertador.
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