Roda gigante surgiu há 400 anos e sofreu influências até da Torre Eiffel
Canela deverá ganhar uma este ano. Oferecerá uma vista a 60 metros de altura, dentro do parque Mundo a Vapor. Foz do Iguaçu inaugurou a sua em dezembro. É igual à instalada no Rio de Janeiro dois anos antes, ambas com 88 metros. São Paulo começou a erguer a sua, um pouquinho maior, em 2021. Balneário Camboriú, capital nacional da verticalização, já garantiu a sua, é claro.
A corrida maluca das rodas gigantes, que parecem cada vez menos atrações de parque de diversões do que instalações voltadas exclusivamente ao turismo, segue uma tendência internacional. No ano passado, o mundo conheceu a nova maior roda do mundo. Com 250 metros de altura, ela foi instalada na cidade que se especializou em bater recordes do tipo, Dubai.
Desde a década de 1990 isso vem acontecendo. Mas, naquela década, era um fenômeno regional, restrito ao Japão, que a cada par de anos, mais ou menos, ganhava uma roda gigante cada vez maior.
Até que Londres criou um novo paradigma na virada do milênio. Em 2000, a margem sul do Tâmisa ganhou a London Eye. Com 135 metros e a meros 400 metros do Big Ben, ela rapidamente se transformou em atração turística popular, ícone britânico e símbolo de uma cidade em transformação.
Não bastava ser a mais alta. Tinha que aparecer em todas as fotos de turistas a partir de então.
"Por que a amamos tanto?", perguntava um artigo do jornal inglês "The Guardian" em 2007.
Talvez ela seja um testemunho da relação contraditória que nós, britânicos, temos com nossa própria tradição."
Uma gigantesca e moderna estrutura de metal cravada em uma das paisagens mais conhecidas e tradicionais do mundo (e reconhecida justamente por tanta pompa e tradição) não era lá a fórmula mais óbvia de sucesso. Era para ser uma atração temporária, mas deu tão certo que ela ficou.
Apesar de ser, sem dúvida, a mais famosa do mundo, a London Eye foi a mais alta por apenas seis anos. Depois vieram uma na China, outra em Cingapura e uma nos Estados Unidos. Foi essa, em Las Vegas, que acabou destronada pela roda de Dubai.
No livro "Eye: The Story Behind the London Eye" ("A história por trás da London Eye", vários autores), o premiado arquiteto britânico Richard Rogers assina um texto que resume o encanto da roda londrina:
"A London Eye fez por Londres o que a Torre Eiffel fez por Paris: dar a ela um símbolo e fazer com que as pessoas subam sobre a cidade e a vejam lá de cima. Não apenas os especialistas ou os ricos, mas todo mundo. Eis a beleza: é pública e acessível e está em uma bela posição, no coração de Londres."
História antiga
A Torre Eiffel, aliás, inspirou o surgimento da roda gigante moderna. Ela foi concebida para a Exposição Universal de 1889, em Paris.
Naquela época, o evento, que existe até hoje, focava nos avanços tecnológicos dos países. As maiores inovações da ciência, maravilhas da engenharia e inventos que mudariam o mundo eram apresentados ali. A torre seria o cartão de visitas da cidade para o mundo. Muitos críticos caíram matando, como é sabido, mas ela se impôs e não deixou mais a paisagem do Campo de Marte.
A Exposição de 1889 foi uma das mais emblemáticas da história. Thomas Edison, já uma celebridade, atraía multidões para seus inventos. Gustave Eiffel assombrou a todos com sua torre, que contava ainda com uma novidade ainda pouco conhecida, desenvolvida pelo americano Elisha Otis, chamada elevador.
O sucesso de Paris criou expectativas para o evento seguinte, marcado para Chicago, em 1893. Inventores de todos os cantos dos EUA iniciaram uma corrida para tentar bolar uma estrutura tão ou mais emblemática que a Torre Eiffel.
Então um engenheiro teve uma ideia diferente. George Ferris queria construir uma roda para levar as pessoas ao céu.
A princípio ele desenhou uma roda com 91 metros de diâmetro, para que a borda externa, se fosse esticada em linha reta, tivesse aproximadamente a altura da Torre Eiffel", explica Norman D. Anderson no livro "Ferris Wheels: An Illustrated History".
Mas, "após semanas de estudo, decidiu-se que uma roda de 91 metros não funcionaria melhor do que uma de 76 metros, então o projeto foi reduzido."
Mesmo mais humilde que a Eiffel em dimensões, o invento foi um estouro. Nos EUA, o termo para roda gigante é "Ferris Wheel", ou "roda de Ferris", até hoje. O jornal "The New York Times" cobriu a Exposição e destacou a novidade, ainda em obras:
"Todos que passavam pelo [parque Midway] Plaisance paravam para forçar os olhos em direção ao céu e ver os intrépidos operários removendo uma massa de andaimes da roda gigante areada e apertando os raios para colocar os grandes carros que darão a volta nela no dia 15 de junho pela primeira vez."
A estreia do invento foi limitada para 5 mil felizardos, e depois para "milhares de visitantes da Exposição, que esperaram pacientemente para passear na grande roda de aço e ferro", noticiou o mesmo jornal, após a inauguração. "Foi um grande dia para a engenharia civil em geral e para o inventor Ferris em particular."
Como foi a experiência? Segue a reportagem:
Ninguém teve medo de subir a bordo dos 36 carros, de 40 lugares cada, mas algumas mulheres, e também homens, experimentaram uma sensação desagradável no movimento da roda, o que os fez resolver não subir e descer novamente".
História ainda mais antiga
A roda de Ferris é considerada a mãe das rodas gigantes modernas. Ela inspirou o surgimento de outras, na Europa, dando início à primeira corrida maluca das rodas, semelhante àquela a que estamos assistindo hoje. Já no ano seguinte surgiu uma maior, na Inglaterra.
A mais famosa da época, e ainda em funcionamento, embora tenha sido reconstruída após um incêndio, é a Roda Gigante Vienesa, ou Wiener Riesenrad, na capital austríaca. Construída em 1897, tem 212 metros e foi a mais alta do mundo por mais tempo, de 1920 a 1985. É um ponto turístico popular de Viena e apareceu em alguns filmes de Hollywood, como "Antes do Amanhecer".
Mas a roda do americano Ferris não foi a primeira do mundo. Bem antes dela já havia a ideia de uma estrutura com cadeiras suspensas que giram para cima e para baixo. Há evidências de rodas gigantes primitivas na Bulgária do século 17, então parte do Império Turco-Otomano.
Na capital do império havia outros exemplares. Pietro Della Valle, um artista e viajante italiano que peregrinou pelo Norte da África, o Oriente Médio e a Índia no século 17, registrou, em 1615, uma grande roda em Constantinopla (atual Istambul):
Fiquei encantado ao me ver arrastado para cima e para baixo em tal velocidade. Mas a roda girou tão rapidamente que um grego que estava sentado perto de mim não aguentou mais e gritou 'chega, chega!'"
As rodas gigantes cresceram e ficaram cada vez mais suntuosas. Mas, nesses 400 anos, uma coisa não mudou. Sempre tem quem sente náuseas lá em cima.
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