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Cardápio em QR Code: praticidade ou perrengue para clientes e restaurantes?

QR Code em restaurantes - Getty Images
QR Code em restaurantes Imagem: Getty Images

Gabriela Mendes

Colaboração para Nossa

13/04/2022 04h00

Ninguém nunca imaginou que um simples código de barras daria motivo para tantas controvérsias. Desde o início da pandemia da covid-19, os QR Codes chegaram, ao que tudo indica, para ficar, principalmente no cardápio de restaurantes.

Apesar de terem sido adotados por muitos estabelecimentos, o que ainda se observa é uma grande confusão: de um lado pessoas que não suportam esse tipo de tecnologia e se atrapalham com seus celulares. De outro, aqueles que ficam aliviados pela agilidade de escolher a comida sem ter que esperar o atendente trazer o menu. Mas, afinal, os QR Codes representam mais praticidade ou perrengue para os restaurantes e consumidores?

Nascido no Japão, em 1994, o QR Code ("Quick Response Code" ou "código de resposta rápida") foi criado para rastrear peças de veículos na indústria automotiva. Ele ficou restrito às fábricas até a popularização dos smartphones, em 2010. A partir daí, os códigos em quadradinhos tiveram uma certa fama, principalmente no setor da tecnologia e algumas pessoas até tatuaram a novidade na própria pele, com códigos de barras personalizados. Mas a tendência ficou relativamente morna e os QR Codes não geraram um grande frenesi.

Tudo mudou com o início da crise sanitária, em 2020. De um dia pro outro, as superfícies de contato eram vistas como um grande risco de contaminação e os cardápios de restaurante estavam na lista vermelha, já que passam na mão de várias pessoas. Não havia álcool em gel que aguentasse. A única opção viável, naquele momento, era adotar a versão digital.

O QR Code nos restaurantes ganhou força total durante a pandemia - Getty Images - Getty Images
O QR Code nos restaurantes ganhou força total durante a pandemia
Imagem: Getty Images

Praticidade aliada à sustentabilidade

Mesmo depois do aumento da vacinação e da baixa de contaminações, muitos restaurantes resolveram adotar os QR Code e abandonar de vez os cardápios de papel. Eles viram que a tecnologia oferece mais praticidade, podendo mudar com facilidade itens e preços no menu, sem ter que fazer uma nova impressão.

Para os consumidores, a principal vantagem é a agilidade de chegar ao restaurante e não precisar esperar o atendente para escolher o prato. Como afirma a designer Ana Luiza Pirá:

A dinâmica do lugar fica muito mais simples. Quando o garçom chega, já sei o que pedir, justamente porque tenho 'livre acesso' ao cardápio. Além de ser mais sustentável, pois não gasta papel, tinta, não precisa ser descartado"

Indo mais além, já existe em muitos lugares cardápios inteligentes que até substituem a função do atendente, como é o caso das redes Starbucks e Pizza Hut. O cliente escaneia o QR Code, escolhe os itens, faz o pedido e paga, tudo em seu smartphone. Rápido e fácil, para quem tem um celular moderno e uma internet rápida, claro.

A rede Olivia Saladas, com casas em São Paulo e no Rio de Janeiro, adotou desde o início os cardápios digitais - Reprodução Instagram - Reprodução Instagram
A rede Olivia Saladas, com casas em São Paulo e no Rio de Janeiro, adotou desde o início os cardápios digitais
Imagem: Reprodução Instagram

É assim que funciona Olivia Saladas, com filiais em São Paulo e Rio de Janeiro. O restaurante, que inaugurou em 2016, já nasceu com a proposta da união da sustentabilidade com tecnologia, aderindo, desde o início, aos cardápios digitais.

No entanto, antes da pandemia, só existia o sistema de tablet, como um atendente virtual. Foi só durante a crise sanitária que eles também viram a necessidade de complementar com o menu em QR Code, evitando filas e facilitando os pedidos separados em cada mesa. Segundo Ana Letícia Sebben, sócia e diretora de comunicação do Olivia:

O motivo de optar pelo cardápio digital veio da preocupação da gente não querer gerar lixo, porque os cardápios físicos são feitos de papel e plástico e precisam ser renovados com frequência"

Restaurante Olivia Saladas no bairro do Itaim, em São Paulo - Reprodução Instagram - Reprodução Instagram
Restaurante Olivia Saladas no bairro do Itaim, em São Paulo
Imagem: Reprodução Instagram

Porém, mesmo com todas as facilidades que a tecnologia traz, a equipe vem discutindo a possibilidade de ter, ao menos, um cardápio físico em cada unidade. Quando alguma pessoa não consegue fazer o pedido pelo meio digital, é preciso que um atendente dê o suporte necessário.

Segundo Letícia, "às vezes a gente até entra na discussão se ele é necessário ou não porque algumas pessoas pedem. É uma possibilidade para ter como apoio, mas ainda não colocamos em prática".

De volta ao mundo analógico

No sentido contrário, o Teva Vegetal, no Rio de Janeiro, aderiu ao QR Code por conta das restrições sanitárias e agora está voltando ao cardápio de papel.

Inicialmente, a ideia da versão digital parecia ótima, já que eles adicionaram muito mais informações além da descrição dos pratos, como fotos, detalhamento dos itens e dos produtores parceiros. A opção de trocar os ingredientes sem ter que passar pela gráfica, facilitou muito, porque o Teva se baseia em comidas sazonais.

Porém, depois de um tempo, a casa não se adaptou e vai relançar o cardápio físico. A equipe observou que a versão em QR Code dispersa os clientes, por estarem o tempo todo olhando para seus celulares. As telas pequenas acabam não estimulando a leitura de todas as informações extras que foram adicionadas. Outro ponto importante, como relatou Rafaela Ramos, responsável pelo marketing do restaurante:

"A interação com a equipe de salão é prejudicada, pois os clientes acabam pedindo menos sugestões de pratos, nossa equipe é menos estimulada a explicá-los e acaba atrapalhando as vendas. No menu impresso, além de ser mais direto quanto a descrição dos pratos, também tem o objetivo de comunicar visualmente o nosso conceito, pela escolha do material, cores e diagramação".

Restaurante Teva, no Rio de Janeiro: cardápio digital diminuiu a interação entre clientes e a equipe do salão - Reprodução Instagram - Reprodução Instagram
Restaurante Teva, no Rio de Janeiro: cardápio digital diminuiu a interação entre clientes e a equipe do salão
Imagem: Reprodução Instagram

Outro ponto é que a versão digital acabou gerando mais gastos para o Teva. Apesar do QR Code não ter custo, o restaurante iniciou o sistema de entrega no início da pandemia e, para criar o delivery e o menu digital, teve que contratar um serviço que custa R$ 250 por mês. Antes, os cardápios eram impressos na própria casa, em uma folha de papel normal que ficava dentro de uma proteção plástica.

Do lado dos consumidores, o QR Code também pode representar ainda mais perrengue do que praticidade, como é o caso da barista Joana Fortuna. Para ela, a complicação é ainda maior porque seu celular é antigo e não tem o leitor do código direto na câmera. Por isso, se ela frequenta algum restaurante que não tenha cardápio físico, fica dependente de outras pessoas para escolher seu prato. Para Joana, a experiência se perde e ela relata:

Não é que eu não goste, eu entendo que é um facilitador às vezes. Mas às vezes o celular tá sem bateria ou você tá viajando e tá sem internet. Só ter essa opção me dá raiva, é tipo, "se vira", sabe. Quem não tem celular, faz o que? Eu me sinto excluída, tenho que esperar alguém abrir pra eu poder ler e já não acho que é um "bem vindo'"

O QR Code mudou a dinâmica de escolha e de pedidos nos restaurantes - Getty Images/iStockphoto - Getty Images/iStockphoto
O QR Code mudou a dinâmica de escolha e de pedidos nos restaurantes
Imagem: Getty Images/iStockphoto

Cardápio como parte da experiência gastronômica

Em alguns casos, o cardápio é parte essencial do restaurante e ficar olhando para o celular não se adequa a proposta. É o caso do Projeto Sucupira, dos cozinheiros Ursulla Lodi e Gabriel Farley, em Alto Paraíso, na Chapada dos Veadeiros.

O projeto é uma experiência gastronômica, em um jantar intimista, com um menu sazonal em cinco etapas, servido no jardim, à meia luz e ao som da vitrola. O cardápio impresso em papel, apesar de simples, faz parte da decoração da mesa e também é um guia para acompanhar a sequência de pratos. Definitivamente, o Sucupira não combina com QR Code. Para Ursulla:

Os cardápios digitais tem sua praticidade, sobretudo para a cozinha de lugares que recebem muita gente, mas aqui a gente recebe poucas pessoas".

O custo da impressão, que é feita a cada semestre, é de R$ 75, por 15 cardápios impressos.

Ursulla complementa: "acho que depende muito do negócio, mas, de qualquer forma, é preciso ter pelo menos um cardápio físico".

Cardápio do Café do Alto, no Rio de Janeiro - Reprodução Instagram - Reprodução Instagram
Cardápio do Café do Alto, no Rio de Janeiro
Imagem: Reprodução Instagram
E menus impressos do café da manhã - Reprodução Instagram - Reprodução Instagram
E menus impressos do café da manhã
Imagem: Reprodução Instagram

Foi seguindo esse pensamento que o Café do Alto, restaurante nordestino localizado no Rio de Janeiro, optou trabalhar. A casa adotou os QR Codes durante a pandemia, mas sempre teve seus cardápios muito bonitos e elaborados, como parte essencial da identidade visual do restaurante. Por isso, há cerca de um ano resolveram voltar com os menus físicos.

Segundo Renata Volkmann, sócia do Café do Alto:

A gente segue com os QR Codes colados em todas as mesas, mas a grande maioria dos clientes prefere os impressos"

Porém, ela conta que a versão digital funciona muito bem para a carta de bebidas, que tem mais de 50 cervejas artesanais. O cardápio impresso, o preferido para as comidas, é higienizado várias vezes ao dia com álcool em gel, o que desgasta bastante. Dessa forma, precisa ser renovado a cada três ou quatro meses, com um custo de R$ 40 a unidade.

Para Renata, "o ideal é que os cardápios físicos sejam usados de uma forma complementar aos QR Codes".