Vertigem, suor e glória: subimos a Trilha da Pedra do Baú, entre SP e MG
Subir a Pedra do Baú, na Serra da Mantiqueira, é do tempo da sua bisavó.
A pequena São Bento do Sapucaí ainda nem sonhava em ser a meca da escalada paulista quando locais já se arriscavam em subidas improvisadas com equipamentos rudimentares.
Atualmente, aquela muralha imponente de 340 metros de altura é o principal atrativo natural dessa cidade a pouco menos de 200 quilômetros da capital.
Escalada pela primeira vez pelos irmãos Antônio e João Cortez, em agosto de 1940, a Pedra do Baú é uma espécie de refúgio e sentinela (daí o nome original Embahú, "ponto de vigia", em tupi-guarani). E foi no final daquela mesma década que a bisavó da escaladora Duda Santos, 19, rompeu padrões.
"Minha bisavó Benedita se orgulhava bastante em contar que a primeira vez que colocou calças compridas foi para subir a Pedra do Baú. Ela achava lindo falar sobre isso", lembra Duda, que começou a escalar aos 14 anos inspirada na experiência da bisavó.
Mas lindo mesmo é ver lá do alto o tapete verde sobre montanhas que se estendem ao longo do Vale do Paraíba, entre Campos do Jordão (SP) e Gonçalves (MG).
A subida
Desde 2019, uma portaria da Fundação Florestal tornou obrigatório o uso de equipamentos de segurança nas faces Norte e Sul da Pedra do Baú, uma subida exigente que segue por Via Ferrata, como é chamada a escadaria de grampos de ferro chumbados na rocha.
A trilha puxada de cerca de 1,8 quilômetros segue por terreno íngreme e irregular até a base da Pedra, onde os participantes são equipados com cadeirinha, capacete e corda de escalada. Dali para frente, caro viajante de primeira escalada, é só controlar o psicológico e aproveitar o visual que se tem nessa caminhada vertical até o cume a 1.950 metros de altitude. Gire a galeria abaixo e veja imagens da trilha.
Lá embaixo, a gente mal consegue visualizar a trilha estreita que risca as fendas do paredão rochoso. É preciso estar lá para entender (e acreditar) no que vem pela frente.
"É super seguro e não tem perigo de queda. A gente vai clipando o mosquetão e todo mundo vai estar conectado em uma corda. Basta ter disposição física", garante o guia de montanha, Antônio Calvo Neto, enquanto administra um emaranhado de cordas e mosquetões, no pé da Pedra do Baú.
Por ali, tudo é uma questão de perspectiva. Conforme a ascensão vai avançando, a gente se dá conta de que do alto, já de costas para o abismo, a experiência é muito menos radical do que se imagina em terra firme.
"A face Norte [por onde a reportagem subiu] não tem tanta vegetação para a gente se esconder. Então a sensação de exposição é maior", descreve Calvo, que tem quase 20 anos de experiência com escaladas, oito deles especificamente na Pedra do Baú.
Foi pelo lado Sul que os irmãos pioneiros conquistaram o cume do Baú, há mais de 80 anos, vencendo paredões de rochas lisas e usando troncos de árvores e fissuras nas rochas para completar a subida.
Não bastasse a primeira conquista, Antônio Cortez protagonizaria, cinco anos mais tarde, a primeira descida com cordas pela face Norte.
Atualmente, o trecho mais longo (e mais tenso) é na Parada dos Medrosos, uma sequência ininterrupta de degraus sem nenhum ponto de apoio. Uma vez nela, o platô seguinte para descanso fica a cem metros dali.
Com duração que varia entre cinco e sete horas, a trilha com alto grau de dificuldade tem no total 3,5 quilômetros de extensão e 600 metros de desnível.
A Pedra do Baú, conhecida também como Bauzão, faz parte de um complexo rochoso com cerca de 30 vias de escalada, formado também pelas vizinhas Ana Chata, famosa por suas escaladas técnicas, e a Bauzinho, trilha fácil de cerca de 30 minutos e vista única da rocha mais famosa da região.
Primeiro refúgio de montanha
Vencidos os atuais 320 degraus até o topo, outra surpresa.
O cume ainda guarda os vestígios do que foi um dos primeiros abrigos de montanha do Brasil, construção de 4x14 metros concluída em 1946 com aporte financeiro de moradores da região e do então empresário Luiz Dummont Villares, o sobrinho de Santos Dumont que fez fama construindo elevadores.
O local, cujas pedras foram dinamitadas para os alicerces do refúgio e os materiais transportados por andaimes e nos ombros de homens, contava com estrutura como caixa d'água para coleta de água da chuva, para-raios e até um sino que era tocado por quem chegava no topo do Baú, de onde se tem vista de 360º da Mantiqueira.
"Mas ao longo dos anos, o refúgio foi sendo vandalizado e hoje só tem o piso. Não tem mais nem as paredes para contar essa história", lamenta Calvo.
Localizado na Mata Atlântica, em meio a campos de altitude e matas de araucárias, o MoNa Pedra do Baú é atualmente parte da Área de Proteção Ambiental Sapucaí-Mirim, uma área de quase 40 mil hectares com gestão compartilhada entre a Fundação Florestal e a prefeitura local.
Criado em 2010 por seu valor geológico, esse Monumento Natural protege a biodiversidade e a paisagem única desse ícone paulista que se transformou em marco cultural e histórico da região.
Dona Dita, a bisavó escaladora, ficaria orgulhosa de ver tudo aquilo.
VAI LÁ
MoNa Pedra do Baú
Para subir a Via Ferrata são obrigatórios agendamento prévio e uso de equipamento de segurança fornecido pelas agências de turismo de aventura, como conectores tipo mosquetões, e cadeirinha e capacete de escalada.
O acesso ao Bauzão é de segunda a domingo, das 9h às 17h, e a saída do parque deve ser feita até às 17h.
Embora não seja obrigatório, é extremamente recomendado o acompanhamento de um guia que conheça a trilha, que não tem sinalização, e técnicas de escalada.
Os valores da subida variam de R$ 130 por pessoa (a partir de 3 participantes) a R$ 165 (duas pessoas).
Quem leva: www.armazemaventura.com.br
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