Com peças caríssimas, grifes de luxo e esportivas se unem por público maior
Há poucas semanas, a Balenciaga engajou as redes sociais com um desfile na Bolsa de Valores de Nova York, nos Estados Unidos. Os modelos encapuzados e fetichistas apresentavam a coleção Resort 2023, que nasceu a partir de uma colaboração da grife francesa com a Adidas.
A marca esportiva não se restringiu a essa única parceria. Ao lado da Gucci, lançou uma linha com suas três listras populares em peças que vestiram até David Banda, filho de Madonna.
Mas a Adidas não foi a única a se aventurar no mercado de luxo internacional.
Recentemente, a Jacquemus, adorada pelas irmãs Hadid e Kendall Jenner, mirou nessa mesma estratégia ao se vincular a Nike. Para gerar buzz na mídia, o diretor criativo da label Simon Porte Jacquemus convocou Sydney Sweeney — estrela da série "Euphoria" — para a campanha, em que aparece usando os trajes grifados e esportivos, ainda não lançados oficialmente, em cima de uma moto.
Moda a preços salgados - nem sempre original
Quando as imagens de todas essas roupas começam a ganhar as redes sociais, logo se tornam itens de desejo. Ao mesmo tempo em que surpreendiam grande parte dos usuários pelos preços levados ao extremo.
A colaboração da Balenciaga com a Adidas, por exemplo, estava disponível por valores que transitavam entre US$ 210 e US$ 5,5 mil, cerca de R$ 1 mil e R$ 26 mil.
Já a parceria com a Gucci revelou preços entre US$ 235 e US$ 3,9 mil — em reais, chegando a quase R$ 20 mil.
A surpresa não parava por aí. Enquanto os lançamentos com a grife que levou Lady Gaga aos cinemas traziam suas particularidades, como as estampas e colorações, as peças da Balenciaga, por sua vez, não se diferenciavam muito das produzidas pela Adidas originalmente.
O perfil de moda "Diet Prada" no Instagram, a exemplo disso, zombou ao comparar quanto um cliente gastaria comprando uma roupa da marca esportiva sem e com a collab com a grife. A diferença do visual entre elas eram pouco visíveis, já o preço apresentava um abismo de R$ 7,3 mil.
"O poder de uma logo", destacou o administrador da página com mais de 3 milhões de seguidores. Tão chocante quanto os R$ 10 mil cobrados pelo tênis sujo e rasgado lançado por Gvsalia.
Questão de "pertencer"
"É preciso reconhecer que sim, a 'etiqueta' de luxo por si só traz consigo um aumento de preços bem discrepante", diz Sofia Martelini, estrategista e expert de tendência da WGSN, para Nossa. "O que, para esse mercado, preserva o status de exclusividade, que é quase sempre um pilar essencial para as construções de desejo de consumo".
A especialista da empresa de análise de tendências aponta um fator ainda mais importante: o senso de pertencimento.
Ao desembolsar os milhares de reais, o comprador automaticamente faz parte de um clube exclusivo — mesmo que as roupas não sejam reconhecidas por todo mundo.
"Apenas um real entendedor do mercado pode olhar para um vestido de malha preto com o logo da Balenciaga x Adidas e reconhecer o valor daquilo", completa Martelini. "Tanto em dinheiro quanto em status".
Em inglês, a sigla IYKYK — if you know you know — ou, 'se você sabe, você sabe' é bem popular no mundo da moda justamente por isso."
Além do pertencimento, os preços altos também são vistos em consequência das tiragens menores e processos de produção, que sofrem alterações quando caem nas mãos das grifes: "É aqui que a label de luxo também vai inserir outro pilar essencial, que é a qualidade, tanto de mão de obra quanto de matéria-prima", completa Martelini.
Por que tanto sucesso?
Colaborações entre marcas de diferentes segmentos e mercados acontecem há muitos anos, tendo se tornado uma estratégia chave para fazer barulho e também explorar um mercado e público diferente do seu próprio.
Porém, o boom de marcas de luxo colaborando com nomes esportivos também pode ser explicado por outros fatores além desses.
"Essas parcerias são uma tentativa de ambas as partes de se manterem atuais e relevantes", opina Sofia Martelini.
Para as marcas de luxo, normalmente associadas a conceitos de "tradição", "herança" e até inacessibilidade, colaborar com nomes populares como Nike e Adidas às coloca como algo mais atual, casual e acessível. Se não em preços, em entendimento.
Afinal, não é todo mundo que consegue (ou quer) absorver os conceitos mais subversivos propostos pela Balenciaga de Demna Gvsalia ou o maximalismo excêntrico da Gucci de Alessandro Michele.
Já para as marcas esportivas, colaborar com esses nomes também as elevam para outro patamar, às colocando como marcas-desejo, parte do mercado da alta-moda.
"Com a pandemia nos últimos anos e os consumidores mudando as suas prioridades de consumo de moda, era de se esperar que as marca procurassem por direções mais apelativas para seus consumidores", diz a especialista em tendências. "A ideia de conforto e funcionalidade da moda esportiva aparece como uma solução".
Ou seja, se o consumidor de luxo passou dois anos sem ter onde usar um vestido esvoaçante da Gucci, ele pôde usar um tracksuit da marca em sua collab com a Adidas dentro de casa.
Os rentáveis frutos da união
Além do senso de exclusividade, já que normalmente essas são coleções especiais e que geram bastante buzz, o apelo para o consumidor também está na junção dos signos e elementos típicos de duas marcas distintas em um produto só.
Na coleção da Jacquemus com a Nike, por exemplo, já é possível notar a abordagem de sensualismo simplificado da marca francesa com as formas e materiais de performance da Nike, criando uma estética única e que mesmo assim é associada a dois nomes altamente desejados pelos consumidores.
"É mais difícil que uma marca consiga criar uma coleção tradicional, sem ser uma collab, com o mesmo impacto em termos de reconhecimento", comenta Sofia. "Embora isso aconteça, principalmente entre pessoas que estão mais inseridas no mercado".
Martelini menciona a colaboração entre a Louis Vuitton e a Supreme, lançada em 2017: "É uma coleção até hoje instantaneamente reconhecida"
Assim, as marcas são beneficiadas em um ponto de vista de branding e percepção de marca, ao reforçarem um status "cool" e exclusivo, mas também tem o potencial de criarem peças que venham a se tornar de itens de colecionador.
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