A Balenciaga há nove meses ocupava o posto de "marca mais quente do momento" em relatório desenvolvido pela Lyst Index, plataforma que avalia as buscas no mercado de moda na internet. No entanto, um movimento aconteceu na última avaliação: a Gucci, habituada ao segundo lugar, destronou a etiqueta comandada por Demna Gvsalia.
Para entender como isso aconteceu, voltaremos um pouco no tempo.
Nos três trimestres anteriores a mais recente pesquisa, a Balenciaga dominava o ranking a partir de estratégias inteligentes e, sobretudo, conectadas ao universo do entretenimento e ao digital: teve Kim Kardashian e Kanye West como embaixadores e colaboradores, respectivamente, de suas criações, levou Homer Simpson para as passarelas e fez parceria com um dos jogos mais populares do mundo, o Fortnite.
Junto a tudo isso, o lançamento de algumas peças fez com que o diretor criativo Demna Gvsalia atraísse polêmicas e, consequentemente, o engajamento dos usuários nas redes sociais: o tênis sujo e rasgado, vendido por R$ 10 mil no Brasil; o Crocs com estéticas inusitadas, como a versão plataforma e a de salto alto; e os looks de alta-costura que desafiavam o padrão de luxo da moda francesa, impulsionados por Rihanna e Kim Kardashian vestindo-os em eventos como o Met Gala, o mais aguardado do ano.
Durante esse período, situado entre os meses de abril de 2021 e março de 2022, foi praticamente impossível não ouvir e ler o nome Balenciaga. Gostasse ou não com do que a etiqueta estava fazendo, o "absurdo e sombrio" de Gvsalia conquistou um devoto grupo de fãs, desde os millennials até a Geração Z — os principais responsáveis por movimentar o lucro e popularidade do mercado de moda atual.
Enquanto isso, a Gucci "comia quieto". No melhor do dialeto mineiro. A última vez que a grife italiana esteve em primeiro lugar foi no primeiro trimestre de 2021.
À época, a grife, sob a responsabilidade do diretor criativo Alessandro Michele, lançava uma linha de roupas para o homewear, impulsionada pelo confinamento da pandemia da covid-19 e a tendência do conforto, além de apresentar um dos desfiles mais icônicos da moda contemporânea para seu aniversário de 100 anos: a coleção "Aria", uma não-colaboração que "hackeava" elementos e silhuetas da Balenciaga.
Aqui, vale destacar que ambas pertencem ao Grupo Kering, holding francesa com sede em Paris, especializado em artigos de luxo e detentora de ambas as marcas.
Posteriormente, estagnada no segundo lugar do ranking elaborado pela Lyst, a Gucci crescia ainda pela tangente com outras iniciativas que, assim como a Balenciaga, flertavam com o entretenimento.
Dominou o guarda-roupas de Harry Styles, já eleito o maior ícone fashion entre as celebridades globais, e ganhou holofotes com o lançamento do filme "Casa Gucci", estrelado e protagonizado por Lady Gaga — que usou e abusou das criações de Michele nos eventos para a divulgação do longa-metragem.
Agora, depois de um longo tempo, a Gucci finalmente ocupa o primeiro lugar. Pelo menos neste segundo trimestre de 2022. Como citado pela própria Lyst Index, parece uma "briga" de dois conceitos completamente opostos: "A estética das marcas [Gucci e Balenciaga] não poderia ser mais diferente. A utopia colorida e maximalista de Alessandro Michele contrasta fortemente com a visão sombria e distópica de Demna".
Tal "utopia colorida e maximalista" inclui a coleção Resort 2023, nomeada "Cosmogonie". Nessa, a magia das cores e proporções de Alessandro Michele foram escancaradas. Tudo com uma dose de sensualidade e sem deixar de lado o estilo boho pelo qual a casa de moda é conhecida.
"Hoje, 'fazer moda' não significa apenas ser alfaiate, ou narrar apenas uma narração unidimensional. Montar uma coleção tem a ver com falar da sua ideia de mundo, porque a moda está profundamente ligada à vida e à humanidade", disse ele sobre o processo de criação das peças. "A moda não é apenas um hieróglifo que só as elites podem entender. É sobre a vida. Fala uma infinidade de idiomas, é como um enorme coro do qual ninguém deve ser excluído. É como estar no mar, no oceano, e expulsar alguém ou alguma coisa não é ser justo com a complexidade da vida."
Além dessa, outras duas colaborações alancaram a grife italiana: a primeira delas a junção com uma das maiores marcas esportivas do mundo, a Adidas — que repercutiu em um aumento de 286% de buscas nas 48 horas posteriores ao lançamento. O que, ironicamente, também foi feito pela Balenciaga. Vale lembrar que as uniões entre a alta-costura e o sportswear vêm dominando o mercado da moda. Outro exemplo a se destacar é o "casamento" entre a francesa Jacquemus e a Nike.
Pontos para a Gucci.
Já para a segunda collab, Alessandro Michele investiu forças com o queridinho Harry Styles. Juntos, eles desenvolveram a linha "HA HA HA" — já revelada, mas com previsão de lançamento só para o final deste ano. Dessa forma, a casa de moda atrai não só os seus típicos fãs, mas os inúmeros adoradores do astro britânico.
Só no Spotify, o artista acumula 71 milhões de ouvintes mensais. No Brasil, onde tem show marcado, o local onde se apresentará já tem barracas de camping montadas a sua espera. Ou seja, um fenômeno, na música e na moda.
Com tudo isso dito, não surpreende a Gucci ter "destronado" a Balenciaga. As duas marcas apresentam abordagens distintas para o retorno da moda, economicamente e socialmente dizendo, para o pós-pandemia. Enquanto a etiqueta de Gvsalia aborda o absurdo, a Gucci revive um fantasioso esperançoso. Ambas têm relevância e fazem sucesso com suas interpretações.
No entanto, até o momento, a "utopia colorida e maximalista" está um passo a frente.
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