Inverno anima vendas de vinhos potentes. Saiba quais você deve escolher
Uma taça de vinho tinto numa noite fria é um dos maiores prazeres que um ser humano pode experimentar. Poucas coisas na vida são melhores. Não é de se estranhar que o consumo de vinho suba nos meses entre junho e agosto, período do nosso inverno.
Um levantamento feito pela Horus Inteligência de Mercado, a partir de todas as notas fiscais que incluíam vinho emitidas no país por lojas de conveniência, supermercados de todos os tamanhos e atacarejos, mostra isso claramente. No período entre junho e agosto de 2021, o ticket médio foi de R$ 39,07. Isso representou uma alta de 17,1% nos gastos com vinho em relação ao período de janeiro a março do mesmo ano.
"As vendas aumentam bastante", afirma Adilson Carvalhal Júnior, presidente da BFBA (Associação Brasileira de Importadores e Exportadores de Vinhos e Alimentos) e diretor da importadora Casa Flora. "Chegam a ser maiores ou iguais às do Natal".
Atrás de aquecimento
Segundo ele, os vinhos que mais vendem no inverno são os tintos, principalmente cabernet sauvignon e malbec. "As pessoas buscam vinhos mais encorpados nesse período", diz.
Para Marina Souza, sommelière da Wine, e-commerce e clube de vinhos, um dos motivos pelos quais o consumidor busca os tintos mais estruturados e complexos nesta época é o teor alcoólico elevado desse tipo de vinho. "Esquenta mais o nosso corpo".
Além do teor alcoólico, no vinho, a quantidade de taninos influencia muito naquilo que o pessoal da cerveja chama de drinkability (facilidade para se beber). Os taninos estão na uva, assim como nas outras frutas em maior ou menor grau, para protegê-las de insetos, pássaros e outros animais.
Enquanto a fruta estiver verde, e a semente ainda não tiver se desenvolvido o suficiente, esses taninos são intragáveis e poucos animais se arriscam a uma mordida. Mesmo maduros, eles não são tão fáceis de digerir. E no verão a digestão é mais difícil.
Daí um vinho com muito tanino ser melhor de beber num dia menos quente. Veja as castas que são ideais para baixas temperaturas:
Cabernet sauvignon
A cabernet sauvignon é a uva principal dos vinhos produzidos à margem esquerda do rio Gironde em Bordeaux, onde estão algumas das vinícolas de maior prestígio da França, os famosos châteaux. A região produz vinhos de várias gamas, alguns mais complexos, outros mais simples, mas, no geral, vinhos potentes, estruturados, mas não muito exuberantes.
A maioria dos vinhos é um blend, ou seja, uma mistura de uvas. Esse blend (cabernet sauvignon, merlot, cabernet franc e outras) tornou-se modelo para a maioria dos vinhos do Novo Mundo. São os vinhos bordaleses. Eles estão no Chile, nos Estados Unidos, na Serra Gaúcha, na Austrália. Todos ótimos para o inverno.
Em boa parte dos casos, a cabernet sauvignon predomina com seus aromas de frutas escuras, tabaco, pimentão (quando tem demais é defeito).
Malbec
Por incrível que pareça, a malbec não é argentina. Sua origem é Cahors, no sudoeste da França, bem próxima a Bordeaux. Lá ela se chama côt. Aliás, a côt é também uma das uvas permitidas na região de Bordeaux. Mas se deu muito bem na Argentina e é muito plantada por lá.
É sempre um vinho encorpado, mas as características aromáticas são diferentes na França e na América do Sul. O malbec argentino é muito mais floral e exuberante no nariz e mais sedoso na boca. Ambos são bastante escuros.
Tannat
A uva mais plantada no Uruguai, a tannat rende vinhos ainda mais encorpados que a malbec ou a cabernet sauvignon. No Uruguai e na Campanha Gaúcha. Esses vinhos costumam ser também bastante alcoólicos. No Brasil, vinhos com mais de 15% de álcool são chamados de vinhos nobres.
Nos aromas da tannat, predominam as frutas negras e o alcaçuz. Seus aromas são mais discretos do que os da malbec e mesmo do que a cabernet sauvignon. Ela também tem origem no sudoeste francês, na região de Madiran, ao sul de Bordeaux, bem próximo da fronteira com a Espanha. Ali, o vinho é um pouco menos encorpado do que no Uruguai.
Muitos dos aromas dos cortes bordaleses ou de varietais de cabernet sauvignon de procedências como a Austrália ou o Vale Central chileno vêm do estágio que esses vinhos fazem em barricas de carvalho
Barris de carvalho
Boa parte dos vinhos citados acima costumam passar algum tempo descansando em barris de carvalho, que, além de aromas como chocolate, baunilha e café, transfere taninos para os vinhos e, com isso, a bebida ganha mais corpo, ou seja, densidade. Ou seja, o vinho fica ainda mais pesado.
Hoje se debate muito a validade do uso da madeira. Há quem ame. Mas há também quem diga que muitas vezes ela é exagerada e rouba demais o protagonismo da fruta, que é a base genuína do vinho.
"As últimas tendências prezam por vinhos com menor aporte de características que se sobreponham à expressão natural dos vinhos, como a passagem por carvalhos de primeiro uso, que aportam mais características à bebida.
Acredito que, com o tempo e maior conhecimento, o brasileiro irá apreciar o perfil de vinhos que exaltem mais as características naturais das uvas e do seu terroir".
Syrah
Dois vinhos feitos com a mesma casta podem ter características completamente diferentes. É o caso, por exemplo, de um shiraz australiano e um Côte de Rotie, no Vale do Rhône, na França. O Côte de Rotie pode ter até 20% da uva branca viognier no seu blend. Mas não é só por isso que ele é mais fresco e elegante do que boa parte dos vinhos feitos a partir da shiraz (sinônimo de syrah).
O estilo de cada um tem a ver com o clima do local onde as uvas são plantadas. A Austrália é mais quente, portanto, as uvas amadurecem com mais facilidade e tendem a ter mais açúcar, o que no fim se converte em mais álcool. E, por lá, durante muito tempo se usou barris de carvalho americanos e novos (dois fatores que costumam resultar em aromas mais fortes e uma transferência maior de taninos)
Amarone
Não é só com uvas ricas em taninos ou o uso de dos barris de carvalho, no entanto, que os enólogos podem produzir vinhos potentes. Há diversos recursos para isso. Um dos melhores exemplos é o Amarone Della Valpolicella. Feito com as mesmas uvas de uma corrente e ligeiro Valpolicella (corvina, rondinella e molinara), o amarone é fruto da fermentação de uvas passas.
O que dá corpo para um vinho não é nada senão a concentração de matéria sólida em água. Uma uva com menos água rende um vinho mais encorpado. Em busca de um tinto muito potente, os produtores da região em algum momento da história tiveram a ideia de colocar as uvas para secar antes de fermentá-las.
Com isso, o vinho ficou mais alcoólico e mais frutado, embora se trate de um vinho seco já que praticamente todo açúcar é transformado em álcool. É um dos vinhos mais caros da Itália. Uma grande opção para uma noite fria de quem tem uns mil reais para gastar.
Harmonização
"Os vinhos mais encorpados, com passagem em carvalho e com ampla frutuosidade, fazem sucesso nesta época", diz a sommelière e consultora de vinhos Eliane Araújo, autora do ebook "Minha primeira adega". "Costumam acompanhar a gastronomia que aquece no inverno". Vão bem com pratos ricos, carnes com molho ou mesmo grelhadas.
"Mas, para não errar na harmonização, procure vinhos com mais versatilidade", diz Eliana. "Tintos de médio corpo, que não passaram muito tempo nos barris de carvalho, entre 6 e 12 meses. Assemblages (ou blends) vão bem com pratos que tenham untuosidade".
Além das festas e frio
A sommelière, no entanto, acredita que o brasileiro cada vez menos precisa de uma noite fria como desculpa para abrir uma garrafa de vinho.
"No passado era visível a alta na venda dos vinhos no inverno, principalmente nos restaurantes. No entanto, com o isolamento social provocado pela pandemia, tivemos dois anos de um crescimento sem precedentes, o consumo per capita de 2 litros passou para 2,8 litros. Atualmente 83 milhões de brasileiros consomem vinho.
O comportamento do consumidor mudou, e a bebida que marcava as datas especiais, e os dias gelados de inverno, para muitos passou a ser uma companhia agradável em qualquer momento".
Ou seja, mesmo que o inverno seja meio de araque como tem sido em muitas regiões do país, você não precisa de nenhuma desculpa para abrir uma garrafa.
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