Brasileiro conta como é voar na 'pior companhia aérea do mundo'
A entidade da aviação Skytrax é responsável por divulgar um ranking onde aponta as melhores e as piores companhias aéreas do mundo.
Em diversos anos, a empresa aérea estatal da Coreia do Norte, a Air Koryo, ocupou a última posição dessa lista. E até hoje foi a única a receber apenas uma estrela na avaliação — em uma escala que vai até cinco e considera, por exemplo, a qualidade dos serviços de bordo e a estrutura de seus aviões —, feito que cristalizou no ideário dos viajantes o título de "pior companhia aérea do mundo".
Mas, indo além da avaliação da Skytrax, como é ser passageiro da Air Koryo? É uma experiência traumática voar com aérea norte-coreana?
O brasileiro Mike Weiss (@mikeweissaonde) já realizou duas viagens com a empresa norte-coreana, com um bilhete de ida e volta entre a China e Pyongyang, a capital do país de Kim Jong-un.
Com uma extensa vivência no mundo da aviação (ele já esteve em mais de 150 países e pegou centenas de voos em sua vida), Mike passou por experiências únicas com a Air Koryo.
"A rota de ida foi entre Pequim e Pyongyang, com o voo realizado com uma aeronave Tupolev fabricada na Rússia em 2009", descreve o brasileiro. "E o voo de volta foi entre a capital norte-coreana e Xangai, em um avião Antonov fabricado na Ucrânia em 2013".
Mike conta que poderia ter ido à Coreia do Norte de trem desde a China, como muitos viajantes têm feito nos últimos anos. Mas preferiu pegar a rota aérea.
Fiz questão de ir de avião, pois tenho paixão pela aviação e não queria perder a oportunidade de conhecer de perto a Air Koryo. Eu já sabia das classificações ruins da empresa, mas voar com eles seria como conseguir uma figurinha rara para meu álbum"
"A duração de cada voo foi de aproximadamente 2 horas. E, durante esse tempo, fiquei de olhos bem abertos para vivenciar cada momento da viagem", diz.
Tensão e cuidado com o jornal
Mike Weiss viveu uma experiência atribulada com a Air Koryo antes mesmo da viagem.
O bilhete aéreo da empresa foi adquirido junto com um pacote turístico completo para a Coreia do Norte, que também incluía o visto de entrada no país, hospedagem, traslados, alimentação e serviço de guia na nação de Kim Jong-un.
Porém, alguns dias antes do embarque, a Air Koryo cancelou, sem nenhuma explicação, o voo de volta de Mike, entre Pyongyang e a China.
Isso gerou uma grande preocupação, pois ele provavelmente não conseguiria entrar no país caso não tivesse uma passagem para ir embora de lá depois que sua viagem terminasse.
A Air Koryo só me conseguiu um novo voo três dias antes do meu embarque na China. Foi uma sensação de alívio"
As tensões pré-embarque, entretanto, não acabaram aí.
"O visto é outra questão que gerou suspense, pois ele seria entregue para mim somente no dia do embarque, logo antes do check-in. E eu não sabia se o visto tinha sido aprovado até aquele momento", relata. "Mas deu tudo certo. Quando cheguei ao aeroporto de Pequim, lá estava um funcionário chinês da agência de viagens que me vendeu o pacote. Sorridente, ele me entregou o visto".
Após passar por um check-in rápido e ordenado, o brasileiro se dirigiu ao avião da Air Koryo que o levaria à Coreia do Norte.
Na entrada da aeronave, os passageiros podiam pegar, gratuitamente, exemplares em inglês do "The Pyongyang Times", jornal controlado pelo regime norte-coreano e que costuma trazer manchetes como "King Jong-un visita fazenda de legumes".
E a publicação deveria ser manuseada com extremo cuidado.
"Fui informado que não se deve dobrar o jornal nas páginas onde figuras importantes da Coreia do Norte aparecem. E não devemos jogar a publicação no lixo", explica, dizendo que isso pode ser visto como uma atitude de desrespeito contra os representantes do país.
Propaganda e hambúrguer misterioso
Ao embarcar, Mike achou bastante ordenado o ambiente do avião que iria levá-lo para a Coreia do Norte.
"O Tupolev estava limpíssimo, com música clássica de trilha sonora. Cordiais com os passageiros, as comissárias eram todas mulheres e estavam com blazer vermelho, camisa branca, cabelos presos e maquiagem discreta".
Nos monitores a bordo, por sua vez, foram mostrados vídeos com cara de propaganda a favor do regime norte-coreano.
"Após a decolagem, começou um vídeo mostrando crianças brincando felizes na praia e em um jardim da Coreia do Norte. E, depois, foi exibido um show do grupo norte-coreano Moranbong, uma das bandas favoritas de Kim Jong-un que tem diversas canções patrióticas sobre o próprio Kim Jong-un", conta o brasileiro.
Mike afirma que o avião era confortável, mas que as luzes de leitura individuais e o botão para chamar as comissárias não funcionavam.
E, na hora da refeição, foi servido aos passageiros um misterioso hambúrguer.
"Não consegui identificar do que era feito aquele hambúrguer. Eram duas fatias de pão insossas, uma única folhinha de alface escuro, uns três fiozinhos de repolho roxo e uma carne fria que não tinha gosto de nada. Não dava para saber se era de frango ou porco. Ou uma mistura dos restos de ambos. Para ajudar a engolir o hambúrguer de procedência não identificável, me deram um copo de água e talheres de plástico, além de uma toalhinha umedecida, que pareceu um item de luxo naquele contexto".
Viagem com segurança
Mike chegou com segurança à Coreia do Norte, onde visitou, sempre conduzido por um guia local, lugares que promovem a grandeza do país asiático, como o Grande Monumento de Mansudae, onde há estátuas, com 20 metros de altura, de Kim Il-sung e de Kim Jong-Il, os falecidos líderes norte-coreanos que são, respectivamente, o avô e o pai do atual governante do país, Kim Jong-un.
A casa onde Kim Il-sung teria passado a infância e um museu dedicado à Guerra da Coreia (que exibe armas americanas capturadas no conflito que, nos anos 1950, opôs os Estados Unidos à Coreia do Norte) também fizeram parte do percurso.
Tanto no voo de ida quanto no de volta, porém, o brasileiro não teve a sensação de estar na pior companhia aérea do planeta, apesar dos problemas vividos na viagem.
"Em nenhum momento achei justificável a classificação de pior empresa aérea do mundo", avalia.
A maioria das comissárias nos Estados Unidos, por exemplo, tem muito a aprender sobre cordialidade com as norte-coreanas. E já estive em empresas de aviação bem piores"
"Já voei na Somália com bagagens empilhadas na fileira da saída de emergência. E, em Moçambique, recebi a minha bagagem despachada encharcada de sangue de cabra" conta. "A Air Koryo me pareceu mais organizada e segura do que muitas companhias por aí".
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