Com Uno 'velhinho', brasileiro sai do interior de São Paulo e chega aos EUA
De Nova Odessa a Nova York. É esta rota terrestre épica entre o município do interior paulista e a metrópole norte-americana que o brasileiro Luiz Torelli está percorrendo neste momento a bordo de um Uno 2002.
Em 2020, sem grana para comprar um motorhome tradicional, Luiz resolveu transformar seu popular carro da Fiat em uma casa móvel, removendo todos os assentos (menos o do motorista) e equipando o interior do veículo com cama, geladeira portátil, pia, armários e itens de cozinha.
Após realizar algumas viagens com seu "Unohome" pelo Brasil, ele estabeleceu uma meta ambiciosa: dirigir entre Nova Odessa, sua cidade, e os Estados Unidos.
E o objetivo foi cumprido: neste mês de julho, depois de quatro meses cruzando as estradas das Américas, ele chegou triunfante à Terra do Tio Sam, ao atravessar o posto fronteiriço que separa o México do Texas.
"Demorou para cair a ficha que consegui chegar tão longe, em uma viagem feita com meu Uno velhinho, que eu usava para rodar pela minha cidade", diz ele. "Tenho a noção de que realizei algo realmente incrível e que, a partir de agora, nada é impossível para mim. O que eu quiser na minha vida, vou conseguir".
A jornada rumo aos Estados Unidos, entretanto, esteve longe de ser fácil.
Altitude e traficantes
Depois de deixar o Brasil, no último mês de março, Luiz cruzou por terra a América do Sul, passando por Paraguai, Argentina, Bolívia, Peru, Equador e Colômbia.
No território colombiano, precisou colocar o Uno em um contêiner e enviá-lo de embarcação para o Panamá (a fronteira entre os dois países é intransponível para carros, devido à presença, na região, de uma hostil selva conhecida como Tapón del Darién).
Na América Central, o brasileiro dirigiu através do Panamá, Costa Rica, Nicarágua, Honduras e Guatemala. E, em seguida, foi necessário cruzar todo o México para atingir os Estados Unidos.
Até chegar à fronteira do Texas, foram quase 16.000 quilômetros rodados, passando por praias, desertos, cidades grandes e pequenas, montanhas e áreas de selva.
"Foi uma viagem linda, mas muito desafiadora", diz Luiz.
"A primeira grande dificuldade foi enfrentar os efeitos da altitude na América do Sul. Na Bolívia, cheguei um dia a 4.300 metros de altura e comecei a passar mal na estrada. Já no Peru, peguei uma rodovia que atinge quase 5.000 metros de altitude, no meio dos Andes. Tinha muito gelo na pista.
O Uno ameaçava falhar e eu também estava falhando, passando mal. Precisava parar toda hora para tomar um fôlego e continuar".
Na Colômbia, por sua vez, o brasileiro enfrentou outro tipo de problema: o narcotráfico.
Ele se encontrava na região de Antioquia, onde fica a cidade de Medellín, quando a justiça colombiana resolveu extraditar para os Estados Unidos um chefe do tráfico local. E, como represália contra esta decisão, outros traficantes começaram a queimar veículos, atacar forças policiais e gerar um clima de medo nas estradas da Antioquia.
"A situação ficou muito tensa", lembra Luiz.
Para chegar até o norte do país, eu tinha que cruzar a área onde estavam ocorrendo estes ataques. Lembro de, um dia, pegar uma rodovia que estava completamente deserta por causa dessa situação. Fiquei com medo de ser sequestrado, pois não havia polícia por perto".
Por sorte, nada de ruim aconteceu com o brasileiro, mas ele relata que chegou a dirigir 600 quilômetros em um único dia, quase sem parar, para sair o mais rápido possível dessa região colombiana. "Senti que estava dentro da série 'Narcos'", brinca.
Belezas da viagem
Os momentos bonitos da viagem foram mais numerosos do que os perrengues.
A bordo de seu Uno, Luiz visitou o surreal Salar de Uyuni (na Bolívia), atravessou o lago Titicaca sobre uma embarcação, cruzou o litoral do Peru, chegou a Quito (a capital do Equador) e desbravou cidades históricas da Colômbia, como a linda Popayán, célebre por seu enorme conjunto de edifícios coloniais brancos.
Na América Central, foi a vez de curtir as paisagens dominadas por praias, vulcões, lagos e florestas que existem na região. E, na área, o brasileiro se encantou especialmente com as belezas da Costa Rica e Nicarágua.
"A Costa Rica é incrível. É um país seguro e com praias lindas", descreve.
E a Nicarágua foi uma surpresa. Todo mundo me falava que era um lugar perigoso. Mas me senti seguro lá. As pessoas são amáveis e o país é lindo. Tem um vulcão a cada esquina. E a capital, Manágua, é interessantíssima".
Já, no México, ele explorou grandes cidades (como Tampico) e o incrível sítio arqueológico maia de Palenque.
No trajeto, o Uno foi seu verdadeiro lar: o brasileiro dormiu dentro do veículo em praias desertas, no deserto e em campings cercados por montanhas, fazendo sua própria comida com a estrutura de cozinha que ele montou no carro. E também foi convidado a se hospedar na casa de muitas pessoas que conheceu na estrada.
E o Uninho não deixou o brasileiro na mão: precisou de alguns reparos pontuais no meio do caminho, mas não enfrentou nenhuma quebra séria.
Homenagem a Jesse e Shurastey
Quando saiu de Nova Odessa rumo aos Estados Unidos, Luiz tinha 19 mil seguidores em sua conta no Instagram (@um.a.uno).
Com seus relatos em vídeo e fotos da jornada com o Uno, ele começou a ganhar uma legião de seguidores (hoje, está com mais de 230 mil).
E uma das pessoas que começou a acompanhar a viagem foi o brasileiro Jesse Koz, que ficou famoso na internet por percorrer as Américas de Fusca junto com seu cachorro, chamado Shurastey.
"O Jesse foi uma das minhas inspirações para viajar. Por isso, fiquei muito feliz quando nos conectamos no Instagram e começamos a conversar com frequência", relata Luiz. "Ele já estava nos Estados Unidos e, quando cheguei à América Central, recomendou que eu visitasse, sem falta, uma praia da Costa Rica chamada Punta Uva, dizendo que era o lugar mais lindo que ele tinha conhecido na vida".
Seguindo o conselho de seu novo amigo, Luiz cruzou a Costa Rica para ir a Punta Uva. Mas, lá, recebeu a pior notícia de sua viagem.
"Cheguei a Punta Uva e passei a noite com o carro naquele lugar lindo. Mas, no dia seguinte, abri meu celular e me deparei com as notícias dizendo que o Jesse o Shurastey tinham morrido em um acidente em uma estrada do Oregon", lembra o brasileiro.
Minha cabeça deu um nó. Chorei o dia inteiro. Eu estava sozinho na praia preferida do Jesse e pensei em abandonar a viagem. De repente, todo este projeto de chegar aos Estados Unidos me pareceu perigoso e sem sentido.
Mas muita gente me mandou mensagem, falando para eu não desistir. Que eu tinha que completar a viagem por mim e pelo Jesse e o Shurastey. Precisei criar forças para continuar".
E Luiz conseguiu chegar aos Estados Unidos.
"Estou neste momento no Texas e, daqui, pretendo ir para a Flórida e subir a Costa Leste do país. Um dos meus grandes objetivos é dirigir até Nova York e parar o Uno na Times Square".
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.