Encontrei um tesouro perdido. Posso levar para casa ou é do país?
A história do milionário americano Carl Allen repercutiu recentemente e despertou uma curiosidade. Ele passou 20 anos investindo em buscas a um navio espanhol afundado nas Bahamas em 1656 e, apesar de todos os esforços, não teve direito a ficar com o tesouro.
Mas, afinal, o que acontece quando alguém acha um tesouro perdido no fundo do mar? A quem pertence esse achado?
Para entender melhor essa dinâmica, é preciso observar que há regras de âmbito nacionais e internacionais que regem a propriedade de tesouros encontrados no fundo do mar, sua proteção cultural e histórica. No Brasil, esse direito de propriedade é regulado pelo Código Civil, como explica Wagner Lucas, membro da Comissão de Direito Marítimo, Portuário e Aduaneiro da OAB São Paulo.
Segundo ele, o código não faz distinção quanto ao local onde o tesouro foi achado, se é público ou particular, se em terra ou no fundo do mar.
"A princípio, um tesouro achado no fundo do mar por terceiro, cuja propriedade é de origem desconhecida, deve ser dividido entre o autor do achado e o proprietário do terreno onde ele foi localizado. No caso do fundo do mar, o proprietário é a União, já que, pela Constituição Federal, o mar e os territórios subaquáticos, aqueles que ficam abaixo no nível do mar pertencem à União", esclarece o jurista.
Há apenas uma exceção em que o tesouro encontrado pertence somente ao dono do local. Quando ele contrata uma equipe de buscas para localizá-lo. Nesse caso, não se aplica a divisão.
Além do Código Civil, há ainda a Lei nº 3.924/1961, que protege o patrimônio histórico, caso esse material tenha elementos importantes do ponto de vista do interesse arqueológico ou pré-histórico, histórico e artístico de uma forma geral.
"Nesse caso, o achado deve ser comunicado para o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional que vai decidir sobre seu caráter e destinação. Enquanto isso, a União fica responsável pela conservação provisória".
No âmbito internacional, a propriedade é regida pela Unesco para a Proteção do Patrimônio Cultural Subaquático e pela Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, atualmente vigente no Brasil pelo decreto nº 1.530/1995.
"Para ambas as convenções, tratando-se de achado com valor histórico, artístico ou cultural, deverá o Estado promover sua preservação em favor de toda a humanidade", explica o advogado.
No entendimento do jurista, a questão de propriedade independe do valor monetário, pois o que está em jogo nesses casos é o patrimônio histórico, que não pode ser dissociado desse tipo de achado.
"Quando se trata de tesouro achado no fundo do mar, casos de naufrágios famosos, por exemplo, a partir do momento em que se torna conhecido, entra no imaginário popular é difícil dissociar qualquer valor do caráter histórico, em se tratando de um tesouro. Inclusive, esse é o termo usado pelo código civil'.
No caso do tesouro encontrado nas Bahamas, é um exemplo disso, diz o jurista.
"Naufrágios famosos têm uma potencialidade de encontrar um tesouro, objetos de valor monetário. A área do Caribe era de vigente trânsito de navios espanhóis e ingleses que levavam ouro e que vem associado com um conteúdo histórico", argumenta.
Wagner Lucas usa outro caso para exemplificar a importância histórica do achado de um tesouro, o de um navio com ouro brasileiro, com bandeira da Alemanha Nazista, do final da década de 30, que foi localizado na Islândia. O ouro estava avaliado em 406 milhões de euros.
"Nesse caso, não é possível avaliar pelo valor econômico da carga, mas uma carga com um conteúdo envolvido na Segunda Guerra Mundial, um navio afundado no âmbito do regime nazista na Alemanha", explica.
O que fazer ao achar um tesouro no fundo do mar
Mesmo que você não planeje procurar nenhum tesouro no fundo do mar, depois de saber que não vai poder ficar com ele, e ainda assim achar algum, o membro da Comissão de Direito Marítimo, Portuário e Aduaneiro da OAB São Paulo, Wagner Lucas, indica o que deve ser feito.
"Não se pode perder de vista que sempre que se trata de patrimônio histórico cultural, é considerado meio ambiente, para fins de crimes ambientais. Desse ponto de vista, entendo que sendo localizado o tesouro, deve-se comunicar primeiramente o Iphan, pelo seu evidente caráter histórico".
Caso isso não seja feito, o fato pode ser considerado crime contra o meio ambiente, de acordo com Wagner Lucas, mais especificamente contra o patrimônio histórico.
"Há vários níveis de responsabilização caso não seja feita essa comunicação, que podem ocorrer nos âmbitos cível, administrativo e criminal".
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