Maior colecionador de uísque escocês do mundo, brasileiro já odiou a bebida
Imagine castelos escoceses seculares — com o de Balmoral, onde a rainha Elizabeth recentemente deu seu último suspiro. Fabulosos, palcos de grandes jantares, festas e recepções apinhadas de realezas por metro quadrado: condes, duques, barões, e seus correspondentes femininos.
Bem, foi nesse ambiente da nobreza de Escócia que o empresário paulista Claive Vidiz viu-se reverenciado como um par, ao ser admitido na grande e seletíssima confraria do uísque escocês. Tão prestigiado e bem recebido a ponto de, algum tempo depois, vender sua inestimável coleção de garrafas de scotch whisky — não por acaso, a maior do mundo — para uma gigante mundial de bebidas. Mas a história, hoje exposta na capital Edimburgo, começou muito lá atrás, na Pauliceia.
Anos antes de ser o único brasileiro aceito entre os Keepers of the Quaich (algo como "os guardiões da taça"), titulo da referida confraria, Vidiz era executivo de uma multinacional do ramo farmacêutico. Não bebia. Certa feita, por questão profissional, aceitou bebericar um uísque — um scotch — pela primeira vez. Tinha 33 anos. Abstêmio convicto, não gostou. Odiou, na verdade. Inclinado a não repetir a experiência, ouviu de um colega de trabalho: se quisesse ir longe na profissão, era melhor tentar aprender a beber.
E assim foi. Com o tempo, educou o palato e passou a enxergar virtudes onde, no começo, só via falhas. E, sim, passou a beber scotches. Como ele mesmo costuma brincar, "recuperou o tempo perdido": lançou-se com destemor de encontro aos aromas e sabores dos grandes rótulos das Highlands ("Terras Altas") escocesas, templo da bebida-símbolo do país. Apaixonou-se. Virou geek antes do termo existir. A ponto de espartanamente colecionar garrafas dos inúmeros rótulos que conhecia e provava.
Tesouro em casa
E colecionou tanto, por tanto tempo (35 anos), a ponto de tornar-se o maior colecionador de uísques escoceses do planeta, fenômeno auditado e atestado pelo próprio Guinness Book. Sem critérios específicos salvo serem escoceses, os "itens" iam de whiskies básicos e conhecidos a raridades de valor inestimável.
Quando não adquiria ele próprio, era presenteado por — ou reembolsava — amigos e companheiros de trabalho que, em viagem, lhe adquiriam "exemplares" nos duty frees mundo afora, em uma era de importações ainda na Idade do Bronze, no Brasil.
Costumo dizer que ter uma coleção dessas aqui era algo tão raro como um escocês ter a maior coleção de cachaças do planeta", brinca.
Com tanto uísque em casa, a confortável residência na zona sul de São Paulo transformou-se em um santuário onde, em um enorme e solene pub todo trabalhado em carvalho, chegaram a repousar perto de 3500 diferentes garrafas, praticamente nunca abertas, a não ser em ocasiões ritualísticas pra lá de especiais, e em havendo um "dublê" do rótulo em questão. E não apenas whiskies das Highlands, mas também dos diferentes terroirs escoceses.
Exceção à regra, ainda havia espaço para alguns poucos Irish whiskies (uísques irlandeses) — e só. Uísque americano — bourbon e suas derivações —, nem pensar.
Uísque americano, apenas para beber. Na coleção, nunca teve espaço".
Rei do scotch
Seu feito ganhou notoriedade e causou tamanha repercussão no Olimpo do scotch que Vidiz acabou convidado a integrar o seletíssimo Keepers of the Quaich, entidade voltada à difusão e promoção do uísque escocês. Mais que isso: com o tempo, galgou inclusive a austera hierarquia interna, tornando-se um dos diretores dos Guardiões, sempre participando dos grandiosos eventos da congregação, nos castelos da Escócia.
Em 2008, em lance ousado, a multinacional britânica de bebidas premium Diageo arrebatou a coleção completa, a valores ainda hoje tão trancados quanto armaduras medievais. Um ano depois, renomeada The Diageo Claive Vidiz Whisky Collection, a coleção era apresentada ao público literalmente como a joia da coroa do The Scotch Whisky Experience, mostra permanente interativa localizada em nobre endereço, a turística Royal Mile). no coração da capital Edimburgo. E lá permanece, visitada anualmente por milhares de turistas e locais.
Hoje aposentado, à época da troca de guarda de seu impressionante acervo, Vidiz comentou a jornalistas britânicos:
Não escolhi colecionar. Fui escolhido. Temos um conhecido ditado no Brasil: 'o bom filho, à casa torna'. Foi isso o que aconteceu, é maravilhoso ver a coleção voltar à Escócia".
Os destaques da coleção
Conheça algumas das raridades da The Diageo Claive Vidiz Whisky Collection, de acordo com o portal Scotchwhisky.com
Dimple Pinch 1969
Na época de sua aquisição por Claive Vidiz, era dos mais caros scotch whiskies provindos de raras edições limitadas assinadas pela histórica destilaria Dimple, no mercado há mais de 120 anos.
Lagavulin 12 Years Old
Engarrafado circa 1960, o exemplar que integra a coleção é dos raríssimos ainda existentes da destilaria homônima, e tido por especialistas como não apenas extremamente raro, mas histórico, até.
Highland Park 12 Years Old
Como o nome indica, vindo das Terras Altas de Escócia. Também extremamente raro. Em 2017, outro exemplar foi encontrado (e degustado) em Orkney, arquipélago no norte do país, provando ainda conter a "assinatura" dos sabores e aromas da destilaria St. Magnus, que o engarrafou nos anos 40.
Glen Grant 1950 22 Years Old
Fundada em 1840 e indiscutível grife mundial de grandes scotches, no passado a Glen Grant engarrafava edições especialmente destinadas ao mercado de Tio Sam, hoje disputadas por colecionadores.
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