A pizza é pop: comida mais vendida do mundo vive glória com série e livro

Ela está nas mesas de São Paulo, de Nova York e de Tóquio, é consumida no almoço e no jantar (há quem não resista em comê-la como café da manhã!) e deve ser talvez a mais popular receita do mundo.

A pizza, essa nossa velha conhecida, conquistou um papel de notoriedade na gastronomia mundial e vive hoje provavelmente a sua melhor fase de difusão: está na TV, no palco, nas prateleiras das livrarias. E mais massivamente nas casas das pessoas: desde a pandemia, a venda de pizzas aumentou significativamente em redes de entrega nos EUA, por exemplo.

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Mas há um interesse sobre elas que supera o ato de comer: as pessoas querem falar sobre a receita. Em novembro, em Madri (Espanha), será realizada a primeira edição do World Pizza Summit, criado para ser ser o maior congresso global do setor.

Recentemente, a Netflix dedicou uma temporada inteira de sua famosa série "Chef's Table" ao prato nascido em Nápoles, na Itália. E muito além de seu país de origem, foi buscar pizzaioli que ajudaram a difundir o seu preparo pelo mundo.

De Portland, no estado americano do Oregon, a Quioto, no Japão, os seis episódios focam em cozinheiros que transformaram a pizza e se tornaram reconhecidos por sua visão muito particular sobre a iguaria.

Enquanto Sarah Minnick busca plantas nativas e flores comestíveis para cobrir — com cor e mais sabor — suas interpretações, Gabriele Bonci revolucionou a pizza romana (comida em fatias) ao buscar uma relação mais próxima com produtores rurais.

Além da tradição

Um dos episódios foca na história de Franco Pepe, considerado um dos melhores chefs de pizza do mundo e cujo restaurante, o Pepe in Grani, foi eleito por três vezes a melhor pizzaria do mundo pelo 50 Top Pizza, o prêmio mais importante do setor — que em 2022 teve brasileiros no ranking.

Na pequena Caiazzo, no interior da Campania, ele provou que podia ser uma referência da pizza frota de Nápoles e mexer na tradição para criar suas receitas modernas — o que, no começo, vistas com desconfiança e maus olhos por seus conterrâneos.

Mas o reconhecimento do público e da crítica ajudou a projetar internacionalmente o nome de Pepe, o que fez muitos italianos (e até mesmo napolitanos) terem que engolir o seu trabalho.

Isso porque, embora sirva suas pizzas de forma mais moderna (em apresentações nem tão planas, onde os ingredientes criam volume), e em sabores inusitados (como o damasco local que usa em uma versão doce), ele é muito ligado às tradições. A massa é toda feita a mão e não usa produtos de fora.

Alta cozinha popular

A modernidade aplicada à gastronomia na Itália sempre foi um desafio. No mundo da pizza ainda mais, já que em Nápoles basicamente existem dois sabores: margherita e marinara.

Pepe quis inovar também aí: sua pizza-assinatura foi batizada de Margherita Sbagliata ("Margharita errada"), em que ele usa técnicas de alta cozinha para recriar a pizza mais vendida no mundo.

Ao invés de colocar no forno as fatias de um tomate tão delicado (como os que ele compra de produtores da região), preferiu criar uma pasta feita com os tomates, que ele só adiciona à pizza depois de saída do forno, em linhas simétricas, intercaladas com uma espécie de pesto de manjericão. Os ingredientes então lá, mas de outra forma.

Pizza modernista

Não por acaso, a pizza icônica de Pepe foi escolhida como capa para o primeiro volume do projeto "Modernist Pizza", a versão focada apenas em pizza da enciclopédia de cozinha modernista criada por Nathan Myhrvold, um ex-executivo do setor de tecnologia.

Se na primeira edição (também com três volumes), ele já tentava entender cientificamente as receitas — às vezes até com cortes transversais de panelas, para mostrar como o alimento reage ao cozimento — nesta ele segue a mesma fórmula.

Recém-lançado, o livro levou quatro anos de análises, viagens, centenas de experimentos, comparações e diálogos com pizzaiolos de todo o mundo. Foram mais de mais de 250 pizzarias visitadas e mais de 1.000 receitas desenvolvidas, em parceria com o especialista Francisco Migoya.

Em 1.708 páginas compostas por 3.770 fotografias (a obsessão de Myhrvold) e pesando 35 quilos(!), há ainda guias de viagem para desbravar pizzarias na Itália, Estados Unidos, São Paulo, Buenos Aires e Tóquio.

Receita global

Uma comprovação do processo de globalização cada vez maior que tem passado a pizza. Se antes ela estava restrita à Napoles e à Itália, depois aos países que receberam grandes fluxos de imigrantes do país, hoje ela é cultuado em cidades com pouco ou sem qualquer herança italiana: Quioto, Lisboa, Denver.

É provavelmente a receita que goza de maior apelo no mundo: as pessoas amam pizza, viajam para comê-la, gostam de saber tudo com muita profundidade", explica Myhrvold na introdução.

Ele próprio é um fanático: criou um laboratório de cozinha chamado de Modernist Cuisine, onde nos últimos anos, com a ajuda de uma equipe de chefs e cientista, estudou técnicas desde a fabricação da massa até o desenvolvimento de molho e novos métodos de cobri-las e servi-las.

Pizza em pó

Mais de 500 experimentos só para tratar a elasticidade que o glúten pode criar na massa, e eles chegaram a um guia detalhado para fazer a pizza perfeita. Na cozinha equipada, um scanner 3D foi usado para analisar pizzas recém-assadas para medir como os ingredientes interagem uns com os outros em cima do molho.

Em um dos experimentos, uma pizza napolitana inteira foi desidratada e transformada em um pó de especiarias para intensificar o sabor da pizza na massa. Também um destilador giratório transformou tomates comuns em um molho fresco cheio de sabor e centrífugas industriais criaram ingredientes novos para serem usados como coberturas, como uma manteiga feita de ervilhas congeladas.

O objetivo mais importante é que as pessoas que amam pizza tenham uma compreensão mais profunda dela, aprendam maneiras de torná-la melhor, para até, quem sabe, aperfeiçoá-la", explicou Migoya em uma entrevista ao portal "Gambero Rosso".

A ciência dos ingredientes, ele diz, é complexa e fascinante, e, além dos produtos que formam a pizza, eles também pesquisaram fornos, equipamentos, todas as peças mais técnicas.

Muitos estilos

Os estudos também tentaram dar conta de entender quantos estilos de pizza há no mundo: além do napolitano, claro, dominante, há a pizza de São Paulo, de Nova York, de Chicago. "São muitos e todos igualmente interessantes", afirma Migoya.

Os autores encontraram os primeiros documentos que falam sobre o consumo de pizza, que datam de 1799, embora, garantam, a receita já era consumida muito antes. Como nasceu como um um alimento de agricultores, de pobres, há poucas referências comprobativas escritas.

O que pretendem, entretanto, é que o livro possa ser uma verdadeira Bíblia para quem quiser consultar tudo sobre pizza no futuro. Incluindo história e tradição, ciência e gastronomia, os testemunhos contados pelos napolitanos e as narrativas "apócrifas". Ou seja, tudo o que cobre a pizza, a comida mais consumida do mundo.