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Galvão Bueno 'descobriu' os vinhos na Copa de 82 - e isso é culpa do Boni

Galvão Bueno quer mais tempo para uma de suaa maiores paixões - além do futebol: o vinho - Karime Xavier / Folhapress
Galvão Bueno quer mais tempo para uma de suaa maiores paixões - além do futebol: o vinho
Imagem: Karime Xavier / Folhapress

Tânia Nogueira

Colaboração para Nossa, de Armação dos Búzios*

28/10/2022 04h00

Não há no Brasil quem desconheça a voz de Carlos Eduardo dos Santos Galvão Bueno, mais conhecido como Galvão Bueno. Desde 1982, o carioca de 72 anos narra os jogos da Copa do Mundo pela Globo. Convidá-lo para fazer um talk show num festival de vinhos, portanto, parecia uma aposta ousada da organização do Wine in Búzios no início de outubro. Ainda mais que, ao seu lado, estaria o velho parceiro Arnaldo Cézar Coelho, que declara não entender nada de vinho.

Poucos eventos de vinho no mundo, porém, conseguiriam ser tão divertidos quanto a conversa dos dois com o jornalista Marcelo Copello.

Galvão é produtor de vinhos, tem uma vinícola na região de Montalcino, na Itália, e outra na Campanha Gaúcha, e fala sobre o tema com os mesmos entusiasmo e desenvoltura de suas narrações esportivas.

Quando lançou a primeira safra do Paralelo 31, Galvão conta que foi chamado de pretensioso. Hoje, porém, é um produtor bastante respeitado.

E o Arnaldo? "Eu faço escada", diz o ex-árbitro e comentarista de arbitragem, amigo pessoal de Galvão há mais de 30 anos. "Quem sempre escolheu os vinhos foi o Galvão. Se eu deixar, acaba ficando caro demais. Ele me convidou para a casa dele na Toscana e ficou me apresentando os brunellos... Eu compro o La Valletta (rosso di Montalcino), é mais barato, muito bom e, depois de dois copos, ninguém percebe a diferença".

Galvão Bueno e Arnaldo Cézar Coelho participam de bate-papo no Wine in Búzios - Divulgação - Divulgação
Galvão Bueno e Arnaldo Cézar Coelho participam de bate-papo no Wine in Búzios
Imagem: Divulgação

"Se fosse na Globo, eu cortava o microfone dele", diz Galvão para a plateia. E, assim, a dupla segue. Falam de futebol, é claro. Entre uma história e outra, ensina como são produzidos espumantes ou o que significa terroir.

Diz a hora de servir cada um dos três vinhos da noite: o espumante Bellavista Desirée Blanc de Noir, o Bueno #Moments Vin Rosé e o Bueno Petit Verdot Reserva 2020.

A petit verdot é uma uva maravilhosa meio esquecida. De repente, dou protagonismo e ela brilha. É como o Marquinhos Palmeira e a Dira Paes no 'Pantanal'"

No futebol, a petit verdot pode se comparar com quem? "Com o Rivaldo", diz o Arnaldo. "Tá ficando inteligente, Arnaldo", bate Galvão.

Galvão Bueno e Arnaldo Cézar Coelho no Wine in Búzios - Divulgação - Divulgação
Galvão Bueno e Arnaldo Cézar Coelho no Wine in Búzios
Imagem: Divulgação

Passado das 22h, Galvão se anima ainda mais: "Serve mais vinho pra todo mundo, eu pago". A turma do fundão entra em êxtase: "Galvão! Galvão! Galvão!" O locutor conta a história de uma partida da eliminatória da Copa em Lima em que, com medo de apanhar da torcida, Arnaldo acabou ignorando uma possível falta. Arnaldo, por sua vez, afirma que quem criou o bordão "Pode isso, Arnaldo?" foi ele. "E o Galvão sempre errava. "

O talk show termina. As palmas começam. Galvão se levanta e faz um "L" com a mão direita na direção do público. Mais tarde, questionado se aquilo significava uma declaração de voto no Lula, o locutor desconversa. "Não foi intencional, mas não me incomodo. Sou um democrata."

No dia seguinte, Galvão concedeu entrevista exclusiva a Nossa, que você lê a seguir:

Nossa: O vinho é um negócio ou um prazer?

Galvão Bueno: Tenho uma paixão, senão não teria dedicado os últimos 14 anos a isso e investido praticamente tudo o que ganhei na vida. Tudo começou com as minhas viagens pelo mundo para a Fórmula 1. Viajava com o Reginaldo Leme. A gente tomava destilado, cerveja... Onde a gente estivesse, em Portugal, na Espanha, na Itália, na França, nos restaurantes, em toda mesa tinha uma garrafa de vinho. Eu dizia: "Ô Regina, tamo errado, cara!. Todo mundo tá tomando vinho."

Galvão Bueno "descobriu" os vinhos por indicação de Boni, na Copa da Espanha - Karime Xavier / Folhapress - Karime Xavier / Folhapress
Galvão Bueno "descobriu" os vinhos por indicação de Boni, na Copa da Espanha
Imagem: Karime Xavier / Folhapress

Nossa: Qual foi o primeiro grande vinho que você bebeu?

Galvão Bueno: Na Copa do Mundo de 1982 na Espanha. Cobríamos quatro cidades diferentes, uma longe da outra, então, arrumamos um hotel no meio do caminho. Na primeira noite, no jantar, pedi a carta de vinhos. Tinha lá um Vega Sicilia. Já tinha escutado o Boni falar desse vinho. Perguntei pro Sérgio Noronha: "E aí, tem coragem?" E tomamos.

Na segunda vez que dormimos nesse hotel, liguei pro Boni: "A culpa é sua. Você fica falando do vinho. Cada noite que dormirmos aqui, vamos tomar esse vinho e levar a nota.". Ele respondeu: "Feito"! O Boni é fantástico, inigualável. Daí para frente, a paixão só aumentou.

Até eu fazer o meu primeiro vinho, o Paralelo 31, se passaram 26 anos. Na verdade, ele foi feito pelo Michel Rolland (enólogo francês) e pelo Adriano Miolo (enólogo da Miolo), mas, para me agradar, disseram que foi feito a seis mãos. Só dei o nome. Hoje participo de tudo. Gosto de dar meus palpites!

A fazenda Bellavista em Candiota na Campanha Gaúcha - Divulgação - Divulgação
A fazenda Bellavista em Candiota na Campanha Gaúcha
Imagem: Divulgação

Nossa: Como o Adriano Miolo entrou nessa?

Galvão Bueno: Conhecia o Darci, o pai dele. Em 2008, comprei a Bellavista, uma propriedade de 150 hectares em Candiota, na Campanha, por indicação do Adriano. Foi ele quem disse que eu devia montar minha própria vinícola. Quando vi, era sócio da Miolo. Já vendi minhas ações de volta para eles, mas meus vinhos ainda são feitos nas instalações da Miolo. Hoje tenho treze rótulos no Brasil e três na Itália. Estamos terminando de construir a cantina na Bellavista.

Nossa: A empresa já se pagou?

Galvão Bueno: Voltar para o meu bolso, o dinheiro investido não voltou. Mas a propriedade valorizou e vende mais do que gasta. Então, estou satisfeitíssimo.

Nossa: Parece haver uma relação entre futebol e vinho. Muitos profissionais da área acabam trabalhando com vinho.

Galvão Bueno:

Vinho é apaixonante. Na Europa, os jogadores se apaixonaram pelo vinho. O Ronaldo Fenômeno, o Hernandes, o Maldini, entre outros, são donos ou sócios de vinícolas. O Taffarel tem uma importadora. Os jogadores ganham muito dinheiro. E precisam fazer um investimento bem feito porque a carreira é curta.

Galvão Bueno produz vinhos na Campanha Gaúcha e na Itália - Karime Xavier / Folhapress - Karime Xavier / Folhapress
Galvão Bueno produz vinhos na Campanha Gaúcha e na Itália
Imagem: Karime Xavier / Folhapress

Nossa: Seus amigos também bebem vinho?

Galvão Bueno: Toda terça-feira, temos uma reunião no Rio, na qual cada um leva uma garrafa de vinho. É numa pizzaria no Jardim Botânico. Somos os queridões. Boa parte da história da Globo senta-se a essa mesa. A gente come pizza, bebe vinho e fala mal da vida alheia. De política, quase não se fala. Mentira! Falamos pra caramba. É uma coisa muito gostosa, né, Arnaldo?

Em São Paulo, tem os jantares de segunda na Cantina do Lellis, depois do Bem, Amigos (SporTV).. O Arnaldo diz que eu tenho a chave do restaurante. Vai todo mundo embora e eu fecho na hora em que a gente sai.

Nossa: Como fica sua vida depois da Copa do Qatar?

Galvão Bueno: O novo contrato é uma coisa menor para não me desligar da Globo, que é a minha casa. Tenho projetos com a Play9. Estou também montando um talk show para ser feito no teatro.

Nossa: Acha que terá mais tempo para o vinho?

Galvão Bueno: É o que eu mais quero. A Desirée, minha mulher, ama. A Bellavista é a paixão dela.

Nossa: Ontem, no final do talk show, você fez um "L'' com a mão apontando para o público. Estava declarando o seu voto no Lula?

Galvão Bueno: Não reparei. Depois, a Desirée me falou que tinha dado essa impressão. Não foi proposital, mas não me incomodo, porque sou um democrata, lutei contra a ditadura militar, fui ativo no movimento estudantil de 1968. Então, não me incomoda que tenha parecido intencional.

* A jornalista viajou a convite da organização do festival Wine in Búzios