Das finanças para o estrelato na TV: o 'multichef' Carlos Bertolazzi
Desde que se recorda, a cozinha sempre esteve presente na vida de Carlos Bertolazzi. Como o sobrenome evidencia, comida e cozinhar sempre foram atividades centrais no dia a dia da família de raízes oriundi.
Isso vem da minha avó. Em casa, todos cozinhavam, meu pai, minha mãe. Acabei também embarcando nessa".
Quando saiu da faculdade e abraçou o mercado financeiro como profissão, a cozinha também estava lá. "Eu usava a gastronomia para conquistar clientes. Levava-os para almoçar e jantar em lugares bacanas. E dava super certo".
Com o tempo, notou uma inversão de valores. "Percebi que, mais do que clientes e dinheiro, esses almoços e jantares me rendiam grandes momentos ao redor da mesa. Vi que tinha mais prazer em comer do que em fechar bons negócios".
Foi quando a ficha lhe caiu: "Estou fazendo a coisa errada. Devia estar trabalhando com isso e não usando como ferramenta para atrair clientes. E aí resolvi passar para o outro lado".
A virada
Como até então cozinhava só por hobby, Bertolazzi partiu para estudar o segmento. Lançou-se também rumo ao Piemonte, um dos mais admirados terroirs culinários europeus. E não apenas na Itália.
Ao todo, entre Europa e EUA, trabalhei em restaurantes que juntos, somam dez estrelas no Guia Michelin, incluindo o El Bulli, do Ferran Adrià, na Espanha".
Na volta ao Brasil, somou ao empresário Juscelino Pereira (Piselli, etc) em torno do Zena Caffé (com dois efes, mesmo), inaugurado em 2009 nos Jardins, e que em pouco tempo se firmou como grande mesa autoral no escopo gastronômico paulistano.
Televisivo
Mas quem ainda não conhece o Zena certamente pode já tê-lo visto através dos inúmeros projetos de programas culinários na TV.
Porque além de diversificar os negócios — rumo ao sul, com uma rede de hamburguerias de sucesso em cinco cidades catarinenses e um novíssimo bar no centro histórico de Caxias do Sul —, o chef segue surfando a carreira de apresentador de realities.
Por conta das raízes familiares e do histórico à frente do Zena, Bertolazzi sabe: sua imagem é "italiana".
Nesse quesito, ele adianta, a TV é aliada na desconstrução de reducionismos. Afinal, foram vários projetos culinários na telinha, todos diferentes entre si. A ponto de, hoje, ter um pé nas duas frentes.
Essa segurança veio com o tempo. Quando comecei, ficava meio ansioso. Depois, relaxei. E fui adquirindo experiência, fazendo diferentes projetos. Hoje, minha profissão é restaurateur, mas também me vejo como apresentador. Porém, minha vida profissional não acaba, se amanhã eu sair da TV. Tenho meus negócios para tocar".
Bertolazzi afirma saber transitar sem tropeços através dos dois grandes "universos do ego", TV e cozinha. "Já fui mais (estressado com isso). Mas se você vira escravo dessa viagem do 'estar sendo', de ser levar demasiado a sério, acaba mal. Até porque acredito que com ética, respeito, o que é seu está reservado. E se não estiver, é porque não era pra ser mesmo".
"BBQ Brasil: Churrasco na Brasa", "Fábrica de Casamentos", "Hell's Kitchen Brasil: Cozinha Sobre Pressão" — e contando.
Atualmente, o chef pode ser visto em "Minha Mulher Que Manda", quadro do programa semanal da apresentadora Eliana.
"Guardo uma relação particular com cada um deles. O 'Hell's' foi incrível, era um formato que eu já curtia no original, e que tive a honra de ter apresentado no Brasil. O 'BBQ' foi outra grande experiência, até porque amo carne. E com o 'Fábrica', a relação é muito gostosa, emocional: não só nosso time da produção virou uma grande família, como, ao lidar com os sonhos dos participantes, acabávamos conhecendo suas famílias e humanizando o programa. Era muito gostoso gravá-lo".
Já em "Minha Mulher Que Manda", ele afirma, não é preciso fazer muito para extrair o entretenimento.
Nada funciona melhor pra gerar diversão que o relacionamento homem-mulher. Para um reality, esse é um formato naturalmente funcional, um dos melhores que já vi. Só é preciso cuidado pra evitar confusões".
Silvio Santos vem aí
Com larga milhagem em programas do SBT, Bertolazzi acostumou-se com a presença, vez ou outra, de Senor Abravanel nos camarins.
"Às vezes antes de gravarmos era até normal o Silvio dar uma passada no camarim, perguntar como estão as coisas, se todos estão bem. Sempre super tranquilo, solícito".
Houve uma vez, entretanto, que o chef "balançou".
Foi durante participação especial no programa do boss, no quadro "Jogo das 3 Pistas", contracenando com a jornalista Christina Rocha.
"Aí ele começa a apresentar os participantes. E quando chega minha vez, pra minha surpresa, reparo que ele está com meu livro — "IChef: Histórias e Receitas de um Chef Conectado", de 2014 — em mãos. A partir daí, ficou quase dez minutos folheando as páginas e comentando receitas, ingredientes. Tipo, 'olha, essa aqui eu não conheço, alguém conhece'? Foi surreal".
Na hora, pensei: gente, isso é incalculável, não pode estar acontecendo, o Silvio Santos em pessoa apresentando meu livro em rede nacional. Até hoje é um momento meu na TV que guardo com muito carinho".
Outra parte do coração é reservada a frames televisivos como sentar no banco do programa "A Praça É Nossa" e prosear em cena com o eterno Carlos Alberto de Nóbrega, logo a seu lado; ou quando participou do semanal do apresentador Raul Gil. "Até hoje me lembro da música: 'o Raul perguntou, você não acertou'", cantarola.
O chef ainda tem no currículo do SBT participações em novelas — no papel, claro, de chef de cozinha. Foi assim em "Carrossel", folhetim infantil exibido entre 2012 e 2013. "Na TV, acabei realizando muitos sonhos", resume.
Coxinhas (de pato) em Nova York
Alguns anos atrás, uma bem sucedida ousadia do chef culminou na Globo. Mas também causou um despropositado diz-que-diz na internet.
Pioneiro de várias festivais de comida de rua quando o conceito começou a florescer através de "feirinhas", a participação em uma delas acabou rendendo-lhe em 2013 o convite para participar de um grande evento gastronômico na Grande Maça.
E não qualquer festival, mas o famoso Smogasburg, o mais badalado evento de comida de rua do planeta.
"Pensei: o que apresentar em Nova York? Decidi pela coxinha, que é algo muito nosso. Mas como o frango, chicken, para americanos, é coisa tão do dia a dia, optei por coxinhas de pato".
A participação foi um sucesso. Além de não sobrar coxinha pra contar história, a repercussão foi grande e levou a participações na Globo, de Ana Maria Braga ao "Fantástico".
Mas, talvez por conta de dores em uma articulação que liga o braço ao antebraço, Bertolazzi acabou tolamente criticado: primeiro, por apresentar aos ianques uma coxinha que, para muitos, não era legítima, não era suficientemente "raiz", por usar pato.
E em casos isolados, pela própria ida ao evento. Tudo bobagem.
Teve discussão sim. Foi mais ou menos como o caso da caipirinha, que só é legitima se for de cachaça, apesar de ter inúmeras versões. Criticaram porque usei pato no recheio".
Como o tempo sempre é senhor da razão, o chef aponta o atual caleidoscópio de versões do irresistível salgado.
"Hoje há coxinhas mil, uma diversidade que não tinha na época: de bacalhau, de siri, de ossobuco, camarão, pato no tucupi, e por aí vai. Me sinto recompensado como um feliz pioneiro que contribuiu para isso".
Chef "cachorreiro"
Um recente trauma, amplificado pelos noticiários, revelou outro lado do chef. Foi quando adotou o galgo Zino. Infelizmente, ficou com o pet apenas por uma semana.
"Pra mim, a rede de proteção que coloquei era intransponível", Não era. Ao ver-se sozinho, o bichinho a roeu, despencou da sacada no pátio do prédio e não resistiu.
Seu desabafo emocionado, ao vivo, no SBT, e também via Instagram, serviu para alertar tutores de pets — e, por tabela, pais em relação a seus pequenos.
Ao levar Zino para uma despedida digna em um endereço especializado, esbarrou em outro filhote, que correspondeu à atenção. Desde então o Manolo, "o cão mais querido que já vi", bagunça seu apartamento.
Vou estabelecer casas em outras cidades onde trabalho, porque geralmente os hotéis não aceitam cães".
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