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Como é morar na 'ilha dos estrangeiros' no Qatar, onde vale short e biquíni

Ao acordar em seu apartamento, a carioca Roberta Dantas de Paula abre as janelas e, imediatamente, enxerga o mar no horizonte. Com o calor intenso lá fora, ela pode colocar um biquíni, vestir roupas curtas de verão e ir até a praia, para curtir o sol e um céu livre de nuvens. Na volta para casa, a brasileira saboreia uma tigela de açaí enquanto observa famílias passeando em um calçadão ao lado da água.

Não, Roberta não está no Rio de Janeiro, mas no Qatar.

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Conhecido por seus conservadores costumes ditados pelas leis do islamismo, o Qatar tem um local que constitui quase um mundo paralelo à sua realidade religiosa e tradicionalista.

Trata-se de The Pearl, uma ilha artificial com 4 milhões de m² localizada em Doha, conectada à cidade por uma enorme avenida e que abriga um luxuoso e ocidentalizado ambiente urbano habitado majoritariamente por estrangeiros — e onde muitos deles, como Roberta, se sentem mais perto de seus países de origem.

The Pearl tem aproximadamente 33 mil moradores e 25 mil unidades residenciais, divididas entre prédios de alto padrão, casas espaçosas sem muros e mansões.

Parte das edificações fica em uma área conhecida como Porto Arabia, onde Roberta vive e que abriga apartamentos sofisticados e residências que chegam a ter 900 m², além de uma marina recheada de iates e um calçadão cercado por restaurantes, lojas de grife e cafés vendendo os mais variados tipos de comestíveis, incluindo açaí.

Ali perto, a região de Viva Bahriya é composta por enormes edifícios dispostos ao redor de uma praia, onde as pessoas podem aproveitar o mar e o calor com pouca roupa.

E, no meio de tudo isso, se espalham paisagens que parecem uma mistura de Miami com cidades mediterrâneas da Europa, com modernos arranha-céus e espaçosas avenidas dividindo espaço com casas coloridas à beira-mar e vias com jardins intimistas.

"Moro no Qatar há 15 anos. Vim viver aqui depois de ser contratada para trabalhar como comissária de bordo na companhia aérea Qatar Airways. Fiquei sete anos na empresa, me casei e vim morar em The Pearl", conta Roberta.

Para mim, The Pearl é o melhor lugar para viver em Doha. Me sinto em casa aqui" Roberta Dantas de Paula

A brasileira diz que, no ambiente internacional da ilha, "me sinto livre, pois posso vestir o que quiser".

"O Qatar está bem mais aberto do que era há 15 anos, quando cheguei. Porém, fora de The Pearl, ainda é um país onde você não pode ir com um shorts mais curto no shopping, pois as pessoas ficam encarando e você não se sente bem. Em The Pearl, ninguém está nem aí. A maioria das pessoas se veste do que jeito quiser e os casais andam de mãos dadas e trocam carinho em público. É tudo mais tranquilo", avalia ela.

Meu marido já quis mudar para uma casa fora da ilha. Mas acabamos ficando. Prefiro morar em um apartamento em The Pearl do que em uma casa maior em outro lugar de Doha" Roberta Dantas de Paula

E, além da liberdade, Roberta gosta das facilidades de movimento que a ilha proporciona para seus habitantes.

"Aqui, consigo fazer quase tudo a pé. É um lugar com vias que facilitam as caminhadas. Posso andar até um restaurante, café ou loja. E isso é muito bom. Doha é uma cidade enorme onde você precisa de carro para fazer quase tudo. Mas, em The Pearl, dá para caminhar".

Europa no Qatar

Se a carioca Roberta se sente em casa com as paisagens litorâneas e o ambiente mais relaxado de The Pearl, os europeus que vivem na ilha também têm razões para curtir uma sensação de lar neste pedaço de terra de Doha.

Isso porque a ilha tem áreas que imitam o ambiente de famosos destinos do Velho Continente.

A área de Qanat Quartier, por exemplo, é uma réplica de Veneza, com uma rede de canais de 1,6 quilômetro de extensão que passa entre edifícios e sob pontes construídos como as edificações da cidade italiana — há até uma réplica da Ponte de Rialto no meio da paisagem.

O local parece o cenário de estúdio de um filme, mas é real: os prédios de estilo veneziano abrigam centenas de unidades residenciais, além de butiques, mercados, academias de ginástica e restaurantes.

A região de Medina Centrale, por sua vez, tem edificações inspiradas na Andaluzia e ruas batizadas com nomes de cidades espanholas como Sevilha, Málaga e Córdoba.

Medina Centrale é o centro pulsante de The Pearl: com lindas praças, fontes com formas artísticas e ruas arborizadas, o local conta com uma grande quantidade de concorridos restaurantes, cafés e lojas de grife.

É um lugar onde endinheirados (sejam moradores da ilha ou de outras partes de Doha) vêm se exibir: carros de marcas como Lamborghini e Ferrari são presença constante nas vias de Medina Centrale, passando lentamente entre as calçadas da área e implorando por um olhar dos pedestres.

O sul-africano Shaheed Dendar morou em The Pearl por quatro anos e, assim como Roberta, gostava da facilidade de caminhar por diversas partes da ilha, visitando constantemente áreas como Medina Centrale e o Qanat Quartier.

Eu adorava ir a Qanat Quartier e sentir que estava em Veneza, com o canal e os prédios coloridos. Gostava muito de toda a atmosfera internacional da ilha" Shaheed Dendar

"E os apartamentos são muito confortáveis. Muitos deles já vêm mobiliados e estão em prédios com piscina", conta.

Shaheed classifica The Pearl como "um lugar vibrante, onde sempre há coisas para fazer". Mas se incomodava quando a ilha ficava vibrante demais, principalmente no final da semana, quando festas com shows e dança até o chão ficam lotadas.

"Nas noites de quintas e sextas-feiras, muita gente de outras partes de Doha vêm até The Pearl, para curtir o ambiente animado da Medina Centrale", conta.

E isso gera muito trânsito na ilha, dificultando que a gente chegue em casa. Para mim, este é o ponto negativo do lugar" Shaheed Dendar

Alto custo de vida

The Pearl foi construída a partir da primeira década do século 21, já predestinada a ser um complexo de moradia e lazer de altíssimo padrão no Qatar — e com imóveis que poderiam ser comprados por estrangeiros.

Desde então, a ilha ganhou, além de suas residências, diversos prédios corporativos, hotéis cinco estrelas, shopping centers e até uma enorme escola internacional — a United School International, que comporta 2.500 alunos e segue o sistema de ensino britânico.

Para morar na ilha, é preciso ter um emprego bem remunerado e, em grande parte dos casos, uma conta bancária cheia.

O aluguel de um estúdio de 42 m² em Medina Centrale, por exemplo, chega a custar 7.000 QAR (mais de R$ 10 mil) por mês. Já o aluguel de um apartamento de dois quartos de 129 m² em Qanat Quartier sai por 13.000 QAR (mais de R$ 18.600) por mês.

E o preço de compra de um apartamento de três quartos e 166 m² em Qanat Quartier chega aos 2,5 milhões de QAR (mais de R$ 3,5 milhões).

Muitos dos habitantes da ilha são profissionais do alto escalão de empresas multinacionais que têm escritório no Qatar — e há também os milionários que não têm vínculo empregatício no país, mas querem investir nos imóveis de The Pearl.

A ilha tem tantas camadas de exclusividade que, dentro de seu território, existem outras ilhas menores que fazem parte de uma região chamada Isola Dana, um ambiente de entrada restrita, e abrigam palácios e portos para iates. O complexo é servido por um canal com 4 metros de profundidade para facilitar a passagem de embarcações particulares de maior porte.

"The Pearl tem muitos moradores estrangeiros porque oferece lindas paisagens, ótimos restaurantes e propicia um estilo de vida que diversas pessoas querem ter, com acesso fácil a praias e bons shoppings", diz Kiara Jai, norte-americana que vive na ilha.

The Pearl é como se fosse uma cidade dentro da cidade de Doha. E todos gostam de estar aqui" Kiara Jai

Como visitar

The Pearl fica a aproximadamente 15 quilômetros do centro de Doha. Caso você não esteja com carro na cidade, saiba que é possível visitar facilmente a ilha com transporte público.

É só pegar a linha vermelha do metrô de Doha e ir até a estação Legtaifiya. Ao lado da saída da estação, há um ponto de ônibus. Os ônibus M109 e M110, que saem do local, entram em The Pearl e dão uma volta no interior da ilha, passando perto de locais como a Medina Centrale e a réplica de Veneza (Qanat Quartier).

Não se preocupe se estiver muito calor: os pontos de ônibus da ilha são cabines fechadas com ar-condicionado.