Aqui nasceu o biquíni: a incrível história da piscina do hotel Molitor
Na terceira temporada de "Emily em Paris", a protagonista de Lily Collins curte um legítimo dia de verão à parisiense, tomando drinques e sol à beira da piscina com Mindy (Ashley Park).
O local escolhido para a cena é cheio de significado para a cultura e a sociedade da Cidade Luz: a piscina Molitor, no 16º arrondissement da capital francesa. Hoje parte de um hotel — Hôtel Molitor Paris, que pertence à rede Sofitel —, suas águas possuem um passado reluzente.
Inaugurada em 1929, ela surgiu como parte do complexo esportivo "Piscine Molitor Grands Etablissements d'Auteuil", próximo ao Parc des Princes (a casa do Paris Saint-Germain), o estádio Jean Bouin e Roland Garros.
A estrutura triangular de concreto, com estilo Art Déco, oferecia dependências para a prática de natação, patinação no gelo, golfe, entre outros.
Como parte da iniciativa de estreia, o pentacampeão olímpico Johnny Weissmuller foi convidado não apenas para a cerimônia de abertura, mas também para servir de salva-vidas durante todo o verão de 1929.
Paris era uma festa a essa altura, como concluiu Ernest Hemingway em suas memórias homônimas do período, publicadas em 1964.
Logo, no entanto, ele não seria o único nome célebre circulando pela Molitor: os parisienses transformaram a iniciativa esportiva em ponto de encontro badalado, atraindo celebridades e eventos para os seus deques.
Em 1934, a piscina se tornou o local da anual "Fête de L'Eau" (Festa da Água, em tradução livre), onde acontecia a competição de beleza de banho.
Mas não era só no verão que a Molitor brilhava: logo foi construída uma piscina de inverno, coberta, pelo arquiteto Lucien Pollet, responsável pela piscina original.
De tão cobiçada — um lugar para ser visto, mais do que para nadar —, não é de se espantar que tenha sido nela que nasceu o biquíni.
Em 1946, dias após uma bomba atômica ter sido lançada na Ilha de Bikini, o designer Louis Réard decidiu fazer um lançamento também explosivo, de certa forma.
Ali, no concurso da Molitor, ele mostrou pela primeira vez o biquíni, como batizou sua criação desfilada no dia 5 de julho pela modelo e dançarina do Casino de Paris, Micheline Bernardini, revelou reportagem de Nossa sobre a origem das duas peças.
Hoje um modelo comum, a peça inovou por seus dois triângulos pequenos presos por fios para a parte superior dos seios e um retângulo que deixava as nádegas de fora. O umbigo "foi descoberto" nessa revolução.
"Aquele foi certamente o melhor período da minha vida. O ambiente era maravilhoso, trabalhávamos das 7h da manhã às 7h da noite, éramos quatro garotos e nos dávamos fantasticamente bem. Além disso, ganhávamos bem, o que não era pouco. A gente não tinha um salário, mas juntávamos dinheiro do aluguel das cabines e das gorjetas, que iam para um pote que dividíamos entre nós. Havia muitos clientes fieis que chegavam cedo de manhã para reservar suas cabines, sempre as mesmas", conta Dominic Thomas, um dos garotos da Molitor para o livro de Claude Weill em "Molitor: As piscinas e o rinque de patinação". E completa:
A ferramenta do nosso negócio era a chave que abria as cabines, eu guardei a minha como lembrança. Estávamos tão acostumados a trabalhar lá que, só batendo na porta da cabine, podíamos imediatamente dizer se estava vazia e livre pra uso ou se havia roupas dentro." Dominic Thomas
No entanto, na década de 70, a era de ouro do centro esportivo Molitor já havia ficado para trás com o fechamento da pista de patinação, que havia substituído a piscina de inverno mas não empolgou o público.
Depois de um mês e meio de trabalhos de instalação da novidade, ela só conseguiu operar por cinco meses — e um enorme prejuízo financeiro se instalou.
Com as constantes falhas no sistema de filtração das águas, a erosão do cloro no concreto aumentando há 50 anos e o desgaste de vidros da estrutura, o complexo Molitor precisava urgentemente de reformas. No entanto, a prefeitura de Paris se recusou a renegociar os contratos de gerenciamento do local, que fechou as portas em 1989.
Em desuso, não demorou para que a Molitor fosse redescoberta por artistas de rua, que fizeram da sua estrutura Art Déco a tela perfeita para muitos graffites.
Porque era histórica, clandestina e de difícil acesso, ela só se tornava cada vez mais interessante, e se tornou um desafio a ser conquistado pelos principais nomes do meio na França.
Na contramão do abandono das instituições, em 1990, um grupo de parisienses fundou o grupo SOS Molitor, que conseguiu mobilizar as autoridades para que a piscina fosse declarada monumento histórico francês e, uma vez tombada, não pudesse ser demolida.
Nada disso impediu a as invasões, no entanto. Colorida pelos artistas, ela se tornou uma arena de shows, festas e desfiles de moda eventuais, organizados pela Compagnie des Maîtres-Nageurs.
Em 2001, por exemplo, o grupo de música eletrônica Heretik deu uma festa dentro da piscina para 5 mil pessoas que chegou a virar notícia na rede de tevê TF1.
Algumas ideias sobre como a Molitor poderia ser retomada preocupavam os parisienses, que temiam a descaracterização do espaço, antes cheio de vitrais preciosos, e foram frequentemente notícia ao longo dos anos.
Em 2007, a Câmara de Paris aprovou sua restauração — e a entrega do complexo esportivo ao grupo Accor, dono da rede Sofitel.
As obras começaram em 2011, mas havia tanta destruição a este ponto que a piscina teve que ser demolida, assim como boa parte da estrutura. Ela, no entanto, foi reconstruída por uma equipe de arquitetos, historiadores e artesãos, respeitando o projeto original — que recebeu a aprovação da filha de Lucien Pollet, segundo a Accor.
Em 2014, o Hôtel Molitor Paris abriu as portas sob o mesmo espírito de fanfarra da piscina original. Com design de Jean-Philippe Nuel, ele possui 124 quartos e suítes rodeando a piscina externa, com a proposta de lembrar ao visitante a experiência de estar em um grande cruzeiro no meio da capital francesa.
Ainda são parte dos seus entornos um restaurante, um bar e um terraço aberto onde são servidos doces e pratos sazonais à base de produtos frescos, da estação, pelo chef da casa.
O hotel também conta com um spa de 1.700 m² assinado pela marca de beleza de luxo Clarins, com seu próprio banho turco, sauna, salão de chá e de leitura.
A rede ainda mantém dentro do Molitor um clube que organiza eventos culturais e esportivos e o Street Artwork, uma espécie de galeria dentro de cabines, no lobby e nos corredores onde são exibidos novos grafites feitos por alguns dos artistas que fizeram parte da história da piscina.
Deslize a galeria abaixo para ver mais imagens do hotel Molitor:
Para usar a piscina como Emily, sem se hospedar no hotel, é preciso ser membro do Club Molitor, ou ter horário marcado para um tratamento no Spa by Clarins da casa. Para isso, é preciso desembolsar a partir de 290 euros ou R$ 1.598 e fazer reservas com antecdência.
Já hóspedes podem usar a piscina à vontade. O hotel tem quartos amplos, que acomodam até sete pessoas. As diárias custam a partir de 310 euros ou cerca de R$ 1.700, mas podem chegar facilmente a mais de 1.300 euros ou R$ 7.300 por noite, dependendo dos serviços inclusos. Mais informações e orçamentos estão disponíveis no site.
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