Visto de nômade digital: os estrangeiros que escolhem o Brasil como morada
A norte-americana radicada na França Cynthia Vergon fazia uma viagem de 14 meses pela América do Sul quando, exausta de mudar do México para a Argentina, da Argentina para o Brasil e do Brasil para a Bolívia, resolveu que era hora de se estabelecer em um país.
Meditou perguntando-se onde deveria estar, e tudo o que via era praia, palmeiras, samba e a brisa do mar balançando os cabelos. "Eu pensava que me estabeleceria em Salta, na Argentina, mas aquele cenário definitivamente não era Salta. Era o Brasil".
Durante a viagem pela América do Sul, a ideia era ficar um mês e meio no Brasil, o mesmo tempo que havia ficado na maioria dos outros países. Mas Cynthia gostou tanto que estendeu a estadia por mais um mês e meio, totalizando três meses, o máximo permitido para turistas europeus.
Só foi embora do Brasil no dia exato em que venceria o visto. Proprietária de uma agência de traduções na França, Cynthia é integrante do grupo do Facebook "Digital Nomads Around the World", e foi ali que ela descobriu então uma forma de seguir o que literalmente a sua mente pedia: voltar ao Brasil para morar.
Os 157 mil nômades digitais participantes do grupo foram convidados a assistir a uma palestra online da consultora para migração Mélanie Montinard, que apresentou o visto de nômade digital, concedido atualmente por 43 países — e o Brasil é um deles.
Enquanto Indonésia, Curaçao e Portugal atiçam os home-officers brasileiros com seus vistos de nômade digital, os gringos também têm seus motivos para sonhar em morar no Brasil com o visto de nômade digital (oficialmente, o chamado visto temporário VITEM XIV), regulamentado pelo governo brasileiro há pouco mais de um ano, em 24 de janeiro de 2022.
Destino divertido, comida boa, praias, Carnaval, floresta tropical e vida noturna são algumas das vantagens listadas pelo site Global Nomad Guide para os estrangeiros que pensam em morar no Brasil com o visto de nômade digital. Já o site Visa Guide World adiciona ainda como vantagem o baixo custo.
Uma pessoa solteira pode viver no Brasil com 490 euros por mês. Comida, moradia e até vida noturna têm preços acessíveis.
Mas será mesmo?
O que é preciso para ficar no Brasil?
Mesmo para nômades digitais, não é só chegar e ficar. Para o visto, é preciso estar empregado em uma empresa do exterior (ainda que seja em uma empresa própria), mostrar uma declaração atestando a possibilidade de fazer o trabalho remotamente, e receber pelo menos US$ 1.500 mensais ou apresentar saldo na conta de pelo menos US$ 18 mil.
Segundo a francesa Mélanie, proprietária no Brasil da consultoria para migrações Mawo, o processo leva em torno de três meses e 81% dos nômades digitais no Brasil estão no Rio de Janeiro.
No rol de 43 países que oferecem o visto de nômade digital, o Brasil está entre os que pedem as mais baixas comprovações de renda: o valor representa quase um salário mínimo para os norte-americanos e para europeus da Alemanha, Holanda e França.
Na Costa Rica, por exemplo, que divide o mesmo clima tropical, os interessados devem receber pelo menos US$ 3.000 por mês. Já a Tailândia, sonho de consumo de tantos brasileiros, pede comprovação de renda de pelo menos US$ 80.000 ou, caso o estrangeiro tenha saldo entre US$ 40.000 e US$ 80.000, é necessário apresentar certificado de mestrado e outros investimentos.
Nem tudo são flores
O visto de nômade digital no Brasil tem validade de um ano, e pode ser estendido por mais um ano. Entretanto, esse é um impasse para que o estrangeiro alugue um apartamento no Brasil. Já que os contratos de locação residencial devem ser de no mínimo 30 meses de locação, Cynthia conta que os estrangeiros têm sido recusados pelos proprietários por morar no País com o visto temporário.
O jeito foi alugar um apartamento por longo período pelo Airbnb, por um preço mensal mais alto do que o previsto. Um apartamento de dois quartos na Glória, no Rio de Janeiro, custa cerca de 900 euros pela plataforma, preço de apartamentos pequenos em cidades como Lisboa e Colônia, na Alemanha.
"Para uma pessoa que ganha um salário mínimo na Europa, esse preço de aluguel no Brasil seria inviável. Ela gastaria metade do salário com o aluguel", conta Cynthia, mostrando a disparidade entre a renda exigida e os preços no Brasil.
A vida é cara no Brasil. É um dos países mais caros da América do Sul.
É assim que cai por terra a descrição do site Visa Guide World sobre os baixos custos no País. Mas ao mesmo tempo é assim que a proposta do visto atinge seu objetivo.
Mélanie, que há 12 anos mora no Brasil, explica que diferentemente de alguns outros países que oferecem o mesmo visto, o Brasil não exige o pagamento de impostos.
O estrangeiro está empregado por uma empresa do exterior, por isso o dinheiro é de fora para fora e não de fora para o Brasil. Mas vai ser gasto aqui.
Embora as paisagens, o calor, a simpatia dos brasileiros e a cultura ao redor música sejam vantagens que o Brasil tem de sobra, o site Global Nomad Guide deu ao País a segunda nota mais baixa na comparação entre 11 vistos de nômade digital, atrás apenas da Geórgia.
Segurança e estado de direito contribuíram para a pouca pontuação. Apesar disso, Cynthia nunca teve problemas.
"As pessoas sempre me avisam: 'não faça isso, não faça aquilo'. Mas eu não sou uma turista estúpida. Eu sou atenta e é preciso ser assim em todas as grandes cidades do mundo. Em Paris é o mesmo. É a mesma regra em todas as grandes cidades", analisa essa estrangeira que graças ao visto de nômade digital conseguiu ficar no país que a alegra especialmente pela simpatia dos brasileiros e pela música.
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