Vai pra Cuba? O cantinho de resorts de luxo que pode salvar ilha da crise
Que Cuba possui uma grande influência na América Latina não é preciso dizer.
As polêmicas e o uso político da ilha socialista ressoam por aqui, principalmente em épocas em que a parte da sociedade utiliza o "medo" do comunismo para mandar "para Cuba" quem pensa diferente.
Quem vai à ilha caribenha a turismo, no entanto, pode experimentar tipos distintos de uma indústria vital ao país que enfrenta um período difícil no pós-pandemia.
Destinos prioritários dos viajantes de todo o mundo, as cidades de Havana e Varadero mesclam dois tipos de turismo distintos.
A capital Havana é destino ideal para quem quer sentir de perto a realidade dos cubanos. Em meio ao clichê dos carros antigos e prédios literalmente caindo aos pedaços, cubanos agora abrem pequenas vendas, restaurantes e bares privados em grande quantidade.
Já a paradisíaca Varadero traz as belezas naturais como prioridade. Grandes hotéis all inclusive (sem muita variedade, é verdade) recebem uma massa de canadenses e europeus de classe média, em busca de sol, preços justos e nem um pouco interessados em qualquer polêmica política.
Em Havana, experiência 100% cubana
Quando se pensa em Cuba, talvez a primeira imagem na mente seja da capital Havana, que possui mais de 500 anos da sua fundação pelos espanhóis. É ali que carros da década de 1950, anteriores à Revolução, e prédios antigos formam uma paisagem única.
A cidade, com cerca de dois milhões de habitantes, possui diversos bairros bem diferentes entre si. Afinal, como afirmam os locais, há diversas Havanas dentro de Havana.
No bairro de Habana Vieja, o mais turístico de todos eles, ruas com asfalto precário dão acesso aos prédios históricos. Na lista do Patrimônio Mundial da Unesco, o bairro é composto por mais de três mil edifícios, que abrigam cerca de 50 mil pessoas.
Por lá, os moradores dividem prédios que se parecem com cortiços, com diversas residências no mesmo local. São nesses edifícios que o governo cubano autoriza a reforma e o aluguel de quartos para estrangeiros. Basta olhar pelas placas brancas e azuis penduradas nos prédios para saber se há a oferta de quartos nas residências particulares.
Enquanto os turistas se dividem entre visitar os locais que o escritor norte-americano Ernest Hemingway frequentava ou conhecer os meandros da revolução feita por Fidel Castro, Ernesto Che Guevara e Camilo Cienfuegos nos museus da cidade, moradores locais aproveitam para ter um aumento na renda no mundo socialista.
Com a retomada do turismo em Cuba, o principal benefício à população é na renda familiar, que, como a rede de hotéis é precária e estatal, muita gente faz refeições e aluga quartos de famílias locais. Então essa é uma fonte de acesso a uma moeda forte, como o dólar e o euro, por exemplo. Simão Silber, professor de economia internacional da Universidade de São Paulo (USP)
É dessa forma que Marina, que preferiu omitir seu sobrenome, moradora do local desde que nasceu, recebe os turistas que buscam uma experiência 100% cubana. De acordo com ela, a alta da inflação faz os salários perderem valor rapidamente e, por isso, passou a buscar uma forma de renda extra.
"É uma ótima forma de conseguir mais dinheiro para podermos viver uma vida mais confortável. Trabalhamos muito, estudamos muito, mas de uns anos para cá a vida tem se tornado mais difícil. Receber turistas é o meio que encontramos para melhorarmos", disse.
No ano passado, Cuba registrou uma alta oficial de 70% nos preços em 2021 e de cerca de 40% em 2022.
Normalmente, eu recebo muitos alemães, italianos e franceses. Em sua grande maioria, eles vêm para passar dias da mesma forma como nós, cubanos, vivemos. E, na minha impressão, eles gostam muito de viver tal experiência.
Se a vivência é local, não há como esperar grandes ostentações de bens materiais. Afinal, Cuba vive um bloqueio comercial desde a década de 1960 imposto pelos EUA. Portanto, os cafés da manhã ofertados por moradores locais (a preço de cinco euros, cada) não contam com grandes variedades de pães ou frutas. Não há, contudo, qualquer séria restrição de alimentos ou produtos de higiene pessoal.
Além disso, em meio à pandemia, o governo de Miguel Díaz-Canel implementou uma série de reformas econômicas, que acabou com as duas moedas existentes e facilitou a abertura de pequenos comércios privados e novos restaurantes e bares podem ser vistos pelas ruas da capital.
Segundo as brincadeiras locais, se o estabelecimento possui música ao vivo e diversas opções de bebidas, provavelmente ele é particular. Caso não tenha, é estatal.
As dificuldades vêm piorando a emigração em massa e criam diferenças em uma sociedade antes igual. Na microeconomia, como a população ainda é iniciante na administração de pequenos negócios e na precificação de produtos, não é incomum ver, na mesma rua, preços até quatro vezes maiores em um mesmo item.
Para Luiz, que possui uma pequena birosca na frente de sua casa onde vende água e café, os turistas que passam por ali buscam vivenciar uma forma diferente de organização da sociedade, independentemente se concordam ou não com os termos.
Há alguns saudosistas, que vêm pelos carros antigos, pelo charuto e pelo rum. Mas a grande maioria dos estrangeiros quer entender como funciona um outro modo de vida, que é o nosso cubano. Eu não acredito muito no molde da Revolução atualmente, mas entendo quem quer ver de perto como as coisas funcionam.
Varadero: Na busca pelo sol
Se em Havana passar desapercebido pelos aspectos históricos da política e economia cubana é impossível, na cidade de Varadero, que abriga praias paradisíacas e hotéis de grandes redes europeias, é (quase) possível esquecer que o turista está em um país socialista.
Distante cerca de 150 quilômetros da capital cubana, Varadero é marcada pelas belíssimas praias. Por isso, na principal estrada que corta a cidade, os 20 mil metros são repletos de grandiosos resorts.
Desde que o então líder cubano Fidel Castro declarou que o turismo seria prioridade em Cuba, na década de 1990, as grandes redes europeias, como Meliá e Iberostar, se uniram ao governo cubano para lançar hotéis, em parceria, que pudessem abrigar turistas.
A cidade, desde então, possui quase uma centena de hotéis, que totalizam milhares de quartos disponíveis. Se não fosse por alguns outdoors espalhados na estrada entre Havana e Varadero ou por faixas estendidas por funcionários em homenagem a Fidel, seria difícil acreditar que é a mesma Cuba.
Por ali, o sistema all inclusive de comidas e bebidas é o mais comum. De certa forma, o luxo cubano se difere dos hotéis na Jamaica ou no México. Não há variedade de frutas e é comum faltar itens básicos em um hotel acima das três estrelas, como copos plásticos, cerveja ou qualquer drinque feito de vodca.
Frutas são apenas as produzidas na ilha, assim como o peixe, frango ou carne de porco. Apenas o rum cubano é abundante por ali. Mas, nada que atrapalhe quem busca relaxar nos quase 30º C da temperatura média do local.
Além disso, os prédios, em sua grande maioria, também precisam de uma reforma (ao menos uma nova pintura). Não há TVs modernas e o ar condicionado ainda é analógico. Detalhes que parecem não incomodar os hóspedes das grandes redes, contudo.
Nós sabemos pouco sobre Cuba. Claro que já li algo sobre a revolução, mas não me parece algo grandioso. Pousamos aqui em Varadero e viemos direto para o hotel fugindo dos -15º C que fazia no Canadá. Para nós é perto e também mais barato do que outros locais. Dorath Lee, 42, professora aposentada canadense
Se o tempo e as praias de um azul-turquesa com areia branca e muito sossego agradam, o pseudo-luxo cubano não faz com que os turistas percam o bom humor. Grupos de russos, que após a guerra da Ucrânia não são recebidos em diversos locais do mundo, passaram a fazer parte das excursões que desembarcam no país.
"Nos últimos anos os russos vêm visitando cada vez mais Cuba. Eu não sei os dados oficiais, mas é nítida a percepção de que a gente está recebendo mais russos por aqui", disse Rafaela, agente de turismo de uma agência estatal.
Apesar de não fazer distinção entre países, o governo de Cuba exalta a tentativa de recuperação da ilha. De acordo com a mídia oficial cubana, os últimos dados disponíveis mostram que, em janeiro deste ano, cerca de 246 mil visitantes foram a Cuba, uma alta de 186% ante os 86 mil do mesmo período do ano passado. Mas, apesar da história e da influência da ilha caribenha no Brasil, os brasileiros ainda são tímidos por lá.
Dados da CVC, a maior operadora de turismo do País, mostram que em 2019, antes da pandemia, a companhia embarcou 221 passageiros para Havana, o que representa apenas 0,23% do total dos embarques internacionais. Ao que parece, os brasileiros ainda se limitam a visitar o país graças às polêmicas políticas de Cuba por aqui.
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