Proibido para turistas: lugares lindos que você não pode visitar (ou quase)
A trilogia "O Senhor dos Anéis" é vista, desde que foi lançada, em 2001, como uma grande propulsora do turismo na Nova Zelândia, onde ela foi filmada. A fama se estendeu com a segunda trilogia do universo, na década seguinte, e a série, lançada em 2022. Ambas apresentaram as paisagens neozelandesas nas telonas e nas telinhas para novas multidões de espectadores.
A popularização do país graças a essas megaproduções é notória. Mas ela talvez não seja tão direta e avassaladora quanto o impacto de um único filme, bem menos audacioso que os de Peter Jackson, sobre uma praia na Tailândia.
Dirigido por Danny Boyle (de "Trainspotting"), com Moby na trilha sonora e Leonardo DiCaprio no papel principal, "A Praia" é um retrato, hoje nostálgico, tanto do ano em que foi lançado (2000) quanto da paisagem estupidamente paradisíaca que ele escancara.
O filme apresentou ao mundo a Baía de Maya, na ilha de Ko Phi Phi Le. A partir de então, turistas de tudo que é lugar queriam ver de perto aquela praia.
Pequenina, com apenas 250 metros de extensão, ela acabou tragada pela própria popularidade. O rastro de lixo e plantas danificadas era o saldo das turbas munidas de gritaria, paus de selfie e poses de Instagram que fizeram da praia um símbolo do turismo excessivo.
Acredita-se que metade dos corais de Maya estava danificada pelas âncoras dos barcos de passeio em 2018, quando estimados 6 mil turistas visitavam a baía todos os dias. Pressionada pela população tailandesa, a administração do parque nacional onde fica a ilha decidiu proibir o acesso temporariamente.
Era para durar só quatro meses, mas o estrago era tão grande que a natureza precisaria de mais tempo sem interferência humana para se regenerar. Além disso, seria necessário construir uma infraestrutura que não afetasse a fauna e a flora locais. A administração estendeu o período de isolamento para quatro anos, o que acabou coincidindo com a pandemia.
- Status: Você pode até visitar, mas nunca será como antes
No comecinho do ano passado, a Tailândia reabriu as fronteiras para vacinados e, pouco depois, sua praia mais famosa estava pronta e renovada para o turismo. Maya ganhou um calçadão, para limitar o contato dos pés humanos com as plantas e os bichos que dependem da areia para sobreviver.
O acesso se dá por uma plataforma flutuante por trás das falésias, porque os barcos de passeio estão definitivamente proibidos de ancorar. Quem quiser nadar só pode em uma área específica da baía. Por fim, o número de visitantes é limitado a 3 mil pessoas por dia, divididas em turnos de até 300 indivíduos.
Tudo em prol do equilíbrio entre preservação e exploração comercial. Alguns resultados já apareceram: ano passado, uma câmera registrou a presença de 100 tubarões-galhas-pretas na baía. Em 2018, eram apenas seis.
Confira agora outros lugares que, por causa da exploração ou da mera presença humana, se tornaram inacessíveis. Ou quase isso.
Caverna de Lascaux, na França
Com cerca de 600 pinturas pré-históricas representando animais, caçadas e outras atividades que os humanos de 17 mil anos atrás faziam, o conjunto de Lascaux foi descoberto por um jovem de 18 anos que passeava com seu cachorro, em 1940, na cidadezinha francesa de Montignac. Em 1948, a caverna foi aberta ao público e já na década seguinte os problemas eram visíveis.
Calor, umidade, gás carbônico e a contaminação provocada por 1.200 visitantes diários danificaram as pinturas. Fungos cobriram paredes, e em 1963 a caverna foi fechada.
Cientistas restauraram as obras, mas o público queria ver de perto as famosas pinturas dos "homens das cavernas". Abrir novamente era arriscado demais, então a caverna ganhou uma vizinha em 1983. Lascaux II tem uma cópia exata do "Grande Salão dos Touros", a seção mais famosa da caverna. As novas pinturas foram feitas com o mesmo tipo de material que se acredita que os artistas originais usaram, como óxido de ferro e carvão.
Em 2012, Lascaux III foi inaugurada com cinco reproduções. Diferentemente da primeira cópia, ela é uma exposição itinerante, que desde então passou por países como China, África do Sul e Estados Unidos.
- Status: A original está fechada, mas há ótimas alternativas
Se visitar a caverna original está fora de cogitação, as cópias estão aí para suprir a curiosidade. Tanto em Montignac quanto onde quer que a exposição itinerante esteja. Em 2023, Lascaux III está no belo Museu da Ciência de Trento, na Itália.
Por fim, há a Lascaux IV, inaugurada em 2016 e mais moderna que as antecessoras. Com tecnologias digitais integradas para aumentar a imersão, ela fica em um museu dedicado, o Centro Internacional para a Arte Parietal, dentro de um morro em Montignac.
O então presidente François Hollande, ao visitar a nova Lascaux, declarou que não se tratava de uma réplica, mas de uma obra de arte. O projeto do badalado escritório de arquitetura norueguês Snøhetta custou cerca de 66 milhões de euros, ganhou prêmios e elogios do público. É o mais próximo da caverna original, com o acréscimo que milhares de anos de conhecimento humano podem oferecer.
Uluru, na Austrália
Uluru é uma formação rochosa sagrada para os povos anangu, que habitam os desertos da Austrália. Localizado no centro do país, no Território do Norte, ele não é particularmente alto: tem uma elevação de cerca de 350 m. Mas é um colosso de mais de 9 quilômetros de perímetro que se destaca na vastidão desértica. Além disso, o Uluru tem uma capacidade de mudar de cor que poucas montanhas conseguem, pois fica mais avermelhado a depender da posição solar.
Com nascentes, cavernas, pinturas rupestres e descobertas arqueológicas de 10 mil anos atrás, o sítio é patrimônio da humanidade e um destino turístico famoso desde os anos 1930. Nos 1980, as redes hoteleiras chegaram, e em 1985 o governo australiano devolveu o controle da região aos povos originários. Desde então, o parque investiu na conscientização, com placas e informes pedindo que as pessoas não escalassem o rochedo.
Além de sagrado, o Uluru é perigoso. Em 2018, um turista japonês foi a 37ª pessoa a morrer ali desde a década de 1950. Às tragédias do tipo se somavam os relatos de pessoas nuas, jogando golfe e até fazendo striptease no local, o que aumentou a pressão pela proibição.
- Status: Você pode visitar, mas não escalar
Em 2019, por unanimidade, a administração do Parque Nacional Uluru-Kata Tjuta proibiu a prática de escalada no Uluru. Profissionais do turismo na região ficaram receosos, porque montanhistas são grande, se não a maior, parte do público que visita o parque, que por sua vez fica um tanto isolado (a cidade importante mais próxima, Adelaide, está a 1h40 de avião). Ou seja, sem eles o fluxo de visitantes poderia despencar.
Segundo a rede de notícias australiana ABC, a ideia agora é investir na cultura, na natureza e na história locais. "O foco tem que ser menos em experiências egoístas turísticas ('ande nesta rocha, tire algumas fotos, leve uma lembrança') e mais nos benefícios para as pessoas que estão recebendo visitantes", disse Andrew Peters, um especialista em turismo indígena. "Bali é um grande exemplo, em que os australianos são grandes responsáveis por remodelar e, de certa forma, estragar a cultura balinesa pela forma que nos comportamos como visitantes", exemplificou.
Por falar em Bali...
Nusa Penida, na Indonésia
A cultura balinesa, apesar de exposta à indústria do turismo na região mais badalada da Indonésia, ainda não motivou banimentos ou restrições relevantes. Mas três praias na ilha de Nusa Penida, em Bali, proibiram o mergulho recentemente por motivos de segurança.
No verão, dois turistas europeus e uma malaia morreram afogados na praia Diamond. Como casos semelhantes ocorreram em outros pontos da ilha, nadar não é mais permitido em outras duas praias de Nusa Perida, Kelingking e Angel's Billabong, segundo o site "Coconuts Bali".
Status: Pode visitar, mas não nadar
Diamond e Kelingking estão entre as praias mais bonitas da Indonésia. Mas há uma porção de outras, mesmo. Afinal, estamos falando da Indonésia, o maior arquipélago do mundo. Então, se fizer questão de um mergulho, procure alguma praia com mais segurança.
Heart Reef, na Austrália
É um recife de apenas 25 metros, mas seu formato de coração faz dele uma das paisagens mais desejadas - e inacessíveis - do mundo. Ele fica em uma lagoa na Grande Barreira de Corais, a cerca de 90 km de Hamilton, nas Ilhas Whitsunday, no nordeste da Austrália.
A fama começou a se espalhar em 1975, quando o recife foi avistado por um piloto de avião. Naquele mesmo ano, com a criação do parque marinho para proteger a enormidade da barreira de corais, Heart Reef ficou ainda mais distante para o cidadão comum.
- Status: Dá pra chegar bem perto (e como luxo)
Em 2019, dois empreendimentos surgiram para levar turistas com mais folga nos bolsos ao recife mais instagramável do mundo. Uma empresa de táxi aéreo de Hamilton passou dez anos investindo em tecnologia (e burocracia) para manter um pontoon a 300 metros de Heart Reef. Pontoon é um tipo de embarcação com flutuadores sob o convés. Relativamente pequeno e largo, ele favorece a socialização, parece uma espécie de balsa chique.
No caso, ostentação braba. A Cruise Whitsundays tem um pontoon com 12 suítes submarinas, com vista para os recifes, além de voo panorâmico sobre Heart Reef (pagamento à parte). Diárias a partir de R$ 3,5 mil, por pessoa.
Já a empresa de táxi aéreo Hamilton Island Air oferece a seus clientes um passeio de dia inteiro a partir da branquíssima praia de Whitehaven, em Whitsunday. Meia hora de helicóptero depois, você está ao lado do recife em forma de coração, em um pontoon com fundo transparente. O passeio, que inclui uma volta de barco e mergulho, além de bebidas, sai por cerca de R$ 4,2 mil por cabeça.
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