A história da pipoca: como o ingrediente milenar chegou às festas juninas
Não há cardápio junino completo sem uma boa porção de pipoca, tão atrelada às festas deste período quanto bandeirolas e fogueiras. A ligação do alimento com as comemorações vem de longa data e é herança das tradições indígenas, associadas aos costumes europeus.
O milho, que rende a pipoca tão adorada, chegou por aqui muito antes dos colonizadores portugueses. Segundo o pajé Auadju, da aldeia Tabaçu Reko Ypy, em Peruíbe (litoral paulista), foi com seu povo, o guarani, que o alimento começou a ser explorado. "Inclusive, não é pipoca que fala; é pipocá", observa.
Eram eles que cultivavam variedades nativas de milho, sobretudo para alimentação. Com a colonização de Portugal a partir do século 16, o cereal foi introduzido na agricultura brasileira de maneira ampla.
"Os portugueses perceberam o potencial agrícola e passaram a cultivá-lo em grande escala, como alimento para a população local e abastecimento das colônias", aponta Spindola Alcântara, professor de gastronomia da Faculdade de Educação Paulistana (Faep) e chef de cozinha.
Ainda no período colonial, o milho desempenhou papel importante como sustento básico dos africanos escravizados trazidos para trabalhar nas plantações de cana-de-açúcar. Tal cultura alimentar influenciou a culinária brasileira.
Festa pelo novo ano
Dentro das tradições indígenas brasileiras, o 5 de junho coincidia com o nascer helíaco das plêiades, um conjunto de estrelas visível em todo o céu. Tal movimento tornou-se referência para os primeiros povos contabilizarem o início de mais um ciclo anual.
Na região de São Paulo, o evento celeste acontecia simultaneamente ao início da safra de milho.
Os povos indígenas faziam uma grande festa para comemorar a ocasião, preparando comidas típicas à base de milho, como curau, canjica, farofa de milho com amendoim, pamonha e, também, a pipoca", diz Silvia Muiramomi, socióloga e ativista indígena.
Com a chegada dos jesuítas, a festa foi transformada em comemoração católica, homenageando Santo Antônio, São João e São Pedro. "Mas trata-se de uma memória ancestral dos povos indígenas que, em São Paulo, eram os guayana-muiramomi, descendentes diretos dos líderes Tibiriçá e Piquerobi", completa Silvia.
A fusão entre elementos das culturas indígena, europeia e católica resultou nas festas juninas como conhecemos hoje.
Técnicas para estourar
De acordo com o professor Spindola Alcântara, existem evidências arqueológicas mostrando como os indígenas utilizavam técnicas rudimentares para estourar os grãos de milho. Assar as espigas diretamente no fogo, até que os grãos estourassem e se transformassem em pipoca, era uma delas.
Também eram usadas panelas de cerâmicas em braseiros, até que os grãos se transformassem, assim como adotavam técnicas de aquecer a pedra e colocar sobre ela um recipiente com milho, causando o estouro dos grãos.
A pipoca era muito valorizada pelos povos indígenas por sua praticidade e sabor. Fornecia uma fonte de alimento resistente e duradoura, podendo ser armazenada por longos períodos", argumenta.
Há relatos, ainda, de que a pipoca foi descoberta ao acaso nos Estados Unidos, por volta do século 19. Conta-se que, após os grãos de milho caírem na fogueira, começaram a estourar.
"Com o tempo, as pessoas começaram a fazer isso como uma forma de diversão em rodas de amigos", relata Dawilson Fonte, professor do curso de Gastronomia da Anhembi Morumbi.
Consumo aumenta em junho
Cabe aos Estados Unidos o título de maior produtor e consumidor mundial de pipoca. Nebraska e Indiana são especialistas no plantio dos grãos ideais para a produção do milho-pipoca. O termo, aliás, tem origem indígena: no tupi, "poka" quer dizer aquilo que estoura, rendendo a interpretação de milho arrebentado.
O Brasil não fica muito atrás na produção, ocupando o segundo lugar entre os grandes produtores. Já quando o assunto é consumo, a região Sudeste sai na frente, sendo a que mais compra pipoca (56%), seguida pelo Sul (16%), Nordeste (13%), Centro-Oeste (9%) e Norte (5%)."Agora, na época das festas juninas, os números aumentam em 15%", cita Dawilson Fonte.
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