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Por que jantar com estranhos é a nova moda em restaurantes de Lisboa

Um dos jantares do TimeLeft de Lisboa - Reprodução/Instagram
Um dos jantares do TimeLeft de Lisboa Imagem: Reprodução/Instagram

Letícia Sorg

Colaboração para Nossa

02/07/2023 04h00

Está viajando só mas sente falta de companhia para jantar? Quer ir a restaurantes bacanas da cidade, mas não sabe bem quais são ou sempre se esquece de reservar? Se você está em Lisboa ou em Paris, há uma nova solução para isso.

Um site chamado TimeLeft quer promover jantares semanais com pequenos grupos de pessoas em restaurantes interessantes das duas capitais europeias — uma ideia que, em breve, pode chegar a outras cidades do mundo.

A ideia da nova ferramenta, criada pelo empreendedor francês Maxime Barbier, é reduzir ao mínimo o esforço das pessoas para conhecer outras e viver uma nova experiência. "Não é preciso mandar nenhuma mensagem, escolher as companhias, o lugar nem fazer reserva", explica Barbier. "É só aparecer no horário e no local indicados e aproveitar a experiência".

A tarefa dos convidados é se cadastrar na ferramenta, responder a um questionário sobre características pessoais (inclusive que idiomas fala) e preferências (restrições alimentares, bairro em que vive), e pagar uma taxa pelo serviço. Se decidir ir a um jantar, o convidado paga 9,90 euros (cerca de R$ 52). A mensalidade para ir toda semana é de 14,90 euros (cercade R$ 78). Isso não inclui, claro, a conta do restaurante, que é dividida entre os convidados. A plataforma sugere dividir por igual o custo da comida e calcular à parte as bebidas.

Como é a experiência

Vista do Javá, um dos restaurantes da experiência TimeLeft - Letícia Sorg - Letícia Sorg
Vista do Javá, um dos restaurantes da experiência TimeLeft
Imagem: Letícia Sorg

Vivendo há alguns meses em Lisboa, fiquei sabendo do TimeLeft pelo Instagram e fui a um jantar no Javá, um rooftop disputado na zona do Cais do Sodré — chamada também de "Caos do Sodré" dada a concentração de bares, restaurantes e pessoas de todo o mundo. O lugar escolhido é super disputado e a reserva é fundamental, como em vários lugares da cidade. Pensei que, na pior das hipóteses, conheceria um lugar bonito, com uma bela vista para o Tejo.

Não deixa de ser curioso chegar a um lugar e ser encaminhado a uma mesa com cinco desconhecidos. No meu caso, o grupo era composto por um francês, uma portuguesa, um português, uma sueca e uma britânica com idades que variavam de pouco menos de 30 a pouco mais de 40 anos. Mas não é preciso se preocupar em entabular conversinhas ou enfrentar silêncios incômodos. A TimeLeft deixa um envelope com perguntas em cima da mesa.

Mesa de um dos jantares do TimeLeft de Lisboa - Reprodução/Instagram - Reprodução/Instagram
Mesa de um dos jantares do TimeLeft de Lisboa
Imagem: Reprodução/Instagram

Barbier conta que teve a ideia de incorporar as cartas com perguntas depois de um date em que a mulher levou o jogo "We are not strangers" para guiar a conversa. "Somos muito rápidos em julgar as pessoas, nos baseamos muito na aparência", diz o empreendedor. Por isso, ele decidiu organizar jantares, para que as pessoas tenham tempo para criar uma conversa mais profunda — o que não acontece em cafés ou drinques. "Conhecer pessoas, para mim, é tão enriquecedor quanto ler livros".

De fato, foi uma experiência interessante. Logo na primeira pergunta, fomos desafiados a dizer o que tínhamos aprendido sobre o amor com nossos pais. E as respostas foram surpreendentemente sinceras, o que quebrou o gelo e abriu espaço para uma troca menos superficial. Também falamos sobre o que temos curiosidade de fazer, mas nunca fizemos, e o que nos faz sorrir sempre. E foi uma surpresa e um alívio ter um papo profundo que passou ao largo das questões políticas.

Enquanto isso, pedimos cinco pratos do menu para dividir e provar e quatro sobremesas. Foi uma noite para conhecer um pouquinho de gastronomia e de pessoas.

Uma delas foi Anya, que ficou sabendo do TimeLeft por um amigo e decidiu testar. "Não há como errar com um toque de mistério e um jogo", diz ela, que é britânica e já viveu em vários lugares do mundo, inclusive no Brasil. "De maneira geral, demos muitas risadas e tivemos algumas conversas interessantes. Foi estimulante também pular as conversas vazias e entrar no jogo".

Piotr participou de um jantar no Comadre — um restaurante com decoração fantástica, escondido atrás de uma antiga estante envidraçada. Para ele, parte da graça está em conhecer um lugar novo, embora não tenha gostado muito da comida, e topar com pessoas diferentes que, de outro modo, jamais cruzariam seu caminho.

"Quero repetir a experiência, mas foi angustiante ver uma das meninas da mesa tão nervosa para responder às perguntas", disse. De fato, para alguém muito tímido e reservado, pode ser traumático.

Parece, porém, que há muitas pessoas dispostas a experimentar esse novo jeito de conhecer a cidade, os lugares e novas pessoas. Segundo Barbier, na primeira quarta-feira da operação, foram 25 pessoas apenas. Agora, já há mais de 1000 inscritas para participar dos grupos, que são distribuídos por 15 restaurantes lisboetas.