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Torcida, palmas e bolão: como foi ver o jogo do Brasil dentro de um avião

A piloto Larissa Bernardo e a co-piloto Helena Louback: equipe totalmente feminina no voo que transmitiu o  jogo da seleção - Luciana Bugni/UOL
A piloto Larissa Bernardo e a co-piloto Helena Louback: equipe totalmente feminina no voo que transmitiu o jogo da seleção Imagem: Luciana Bugni/UOL

Luciana Bugni

Colaboração para Nossa, do Recife (PE)

24/07/2023 13h10

Se durante a Copa do Mundo masculina a ansiedade pré-jogo começa horas antes da partida, o mesmo não se podia dizer da manhã de segunda-feira, no aeroporto de Congonhas, em São Paulo.

A seleção feminina do Brasil entraria em campo pela primeira vez na Copa, que acontece na Austrália e Nova Zelândia, às 8 horas, mas os passageiros e funcionários que caminhavam apressados pelo saguão principal não pareciam lá muito preocupados com Ary Borges e Bia Zaneratto em campo, nem mesmo com Marta no banco.

Executivos com suas pastas de trabalho dividiam a fila do raio-x com famílias em férias antes das 6 horas da manhã — não se via ali nenhuma camiseta canarinho.

"Quem não está empolgado com esse jogo está maluco", eu leio no Instagram da Sportv.

À minha volta, o cenário típico de uma sala de embarque: pais fotografam crianças, crianças choram porque querem o celular do pai, adultos fazem fila para obter um café, funcionários das lojas começam seus turnos, comissárias impecavelmente penteadas sorriem. Nada que faça alusão aos gramados. Não se vê empolgação, mas também não dá para dizer que pareça maluquice. É só mais uma segunda-feira.

O cenário começa a mudar na fila do embarque para Recife, onde três moças usando uniformes da seleção esperam na fila. Elas gravariam uma ação de marketing da companhia aérea Azul.

O voo, com uma tripulação toda composta de mulheres, da piloto às comissárias, transmitiria a estreia da seleção feminina.

O avião, no entanto, estava mais para Barbie Core do que para canarinho: as asas, turbinas e lateral haviam sido pintadas de pink em um ação para a conscientização sobre o câncer de mama em outubro passado.

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O avião da Azul pintado de rosa para a campanha de conscientização sobre o câncer de mama
Imagem: Luciana Bugni/UOL

Nos monitores instalados em frente às poltronas, era possível escolher o que cada um queria assistir entre diversos canais da Sky. O entretenimento competia com as redes sociais: com wi-fi liberado, várias cabeças abaixadas scrollavam a telinha.

Pouco a pouco, as tevezinhas eram ligadas nos canais de esportes, que ainda mostravam o pré-jogo — um tipo de efeito manada que ia empolgando os passageiros.

Um passageiro pediu um fone de ouvidos, mas foi informado de que estavam em falta. A torcida teria que assistir o jogo no mudo. Uma garota fotografou a tela quando Marta apareceu no banco. Ela postou um story do momento. Quando a jogadora entrou em campo, no meio do segundo tempo, ela fez nova foto.

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Sem fones, o jeito foi ver o jogo no mudo
Imagem: Luciana Bugni/UOL

Acho emocionante

A engenheira mecânica Huysla Silveira, 25 anos, estava torcendo para ter TV no voo e poder ver as jogadoras. "Acho emocionante para a gente que é mulher ver a Marta voltar a jogar com as outras meninas. Eu me planejei para ver todos os jogos e, quando estiver de volta a São Paulo, vou acordar cedo para torcer", contou ela, que ia ao Recife para trabalhar em um evento.

O avião ainda estava na pista de decolagem quando Ary Borges fez o primeiro gol, aos 19 minutos do primeiro tempo. Gritinhos empolgados e aplausos foram contagiando a galera. O rapaz que havia pedido os fones lamenta uma bola que foi para fora e praticamente faz a sua própria narração para compensar a ausência de fones.

Aos 39 minutos do segundo tempo, Ary marcou de novo. "Uhuuuu", dizia um grupo de mulheres comemorando a escolha acertada num bolão.

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Aos poucos, as telinhas sintonizaram no jogo
Imagem: Luciana Bugni/UOL

O gol de Bia, aos 3 minutos do segundo tempo, pegou os passageiros distraídos com a movimentação das comissárias, que faziam um pronunciamento sobre a tripulação feminina e o fato da companhia ser a única a transmitir os jogos da seleção.

Quando Ary Borges marcou, aos 25 minutos do segundo tempo, as palmas foram mais discretas. Goleada é assim mesmo, dá uma desanimada nas comemorações quando sai muito gol. O pessoal parecia agora estar entretido com o lanche: biscoitos de polvinho, muffin de laranja e suco.

Um passageiro faz um hang loose para a tirar uma foto da tela, já nos acréscimos. Outros abrem o notebook e adiantam alguns e-mails para começar o dia. O juiz apita. "Ary foi bem demais, fiquei emocionada de vê-la falar ao fim do jogo", contou Huysla.

O avião pousa em Recife depois de 1 hora em que o entretenimento fica por conta de séries nos pequenos monitores.

A piloto Larissa Bernardo não conseguiu ver o jogo durante a viagem: "Quanto foi? Ia perguntar mas nem deu tempo", ela disse. Ficou empolgada de saber da goleada de 4 a 0. "Que coisa boa".

Ela e a co-piloto Helena Louback costumam fazer a parceria na cabine com frequência: "A gente sempre trabalha juntas", disse Helena.

O Brasil agora enfrenta a França no sábado (29), às 7 horas da manhã. O ingrato fuso da Oceania não opera a favor da torcida que quer dormir mais cinco minutinhos, seja no ar ou no solo.