Topo

Fênix do turismo: ilha do Caribe arrasada por furacão renasce dos escombros

Foram tempos duros e de resiliência desde o furacão de 2020, que arrasou a ilha colombiana. Hoje, as cores voltam a Providência - Anadolu Agency via Getty Images
Foram tempos duros e de resiliência desde o furacão de 2020, que arrasou a ilha colombiana. Hoje, as cores voltam a Providência
Imagem: Anadolu Agency via Getty Images

Priscila Carvalho

Colaboração para Nossa, de Providência, Colômbia

01/08/2023 04h00

Conhecida por ter um mar de água cristalina e praias quase inóspitas, a ilha de Providência, na Colômbia, ficou fechada por quase dois anos após ser atingida por um furacão de categoria máxima em novembro de 2020.

Com pouco mais de seis mil habitantes, o local ainda se recuperava dos estragos da pandemia da covid-19 e, aos poucos, alguns moradores tentavam encontrar, por meio da pesca ou outras atividades, sustento para suas famílias.

O país enfrentava uma temporada de chuvas, principalmente no Caribe, onde há um número grande de turistas todos os anos. No entanto, a ilha colombiana não era tão visitada pelos brasileiros, já que muitos quando pensam em conhecer o mar "de sete cores" ainda escolhem como primeira opção a vizinha San Andrés.

No dia em que foram surpreendidos pelo furacão Iota, muitos dos moradores ficaram surpresos com os ventos que chegaram a mais de 100 km/h e com ondas de mais de três metros de altura.

Após esse desastre natural, a ilha teve 98% de sua infraestrutura destruída.

Terra arrasada: quase toda a ilha de Providência foi destruída pelo furacão - Getty Images - Getty Images
Terra arrasada: quase toda a ilha de Providência foi destruída pelo furacão
Imagem: Getty Images

"Ficamos 15 pessoas em um banheiro"

Mesmo com muita chuva e ventos fortes, Jan Michael, morador da ilha caribenha e de 46 anos, não acreditava que o fenômeno natural chegaria a essa força.

Trabalhando com turismo há 23 anos, ele conta que Providência já havia passado por um ciclone antes, alguns anos atrás, mas nunca nesta proporção.

Ele relembra que no dia do ocorrido estava em casa com sua esposa e filhos, pois precisa ficar isolada devido à covid-19. "Chovia muito no dia e não pensamos que ia chegar com aquela força. Era uma da manhã e meu amigo disse que ia chegar na categoria 5", conta.

Em poucas horas, o cenário mudou na cidade, e a chuva e o vento ficaram cada vez mais fortes. Já era madrugada quando eles foram surpreendidos pelo furacão Iota que fez com que o teto de sua casa se desprendesse e saísse voando. Como a residência não tinha tanta estrutura, ele tentou se abrigar na casa do irmão.

A distância da minha casa para a dele durava um minuto. Por causa do vento e da chuva, levamos meia hora. Minha esposa também foi atingida na cabeça, por algo que se soltou e a golpeou"

Noite de terror: além dos ventos, ondas de mais de três metros atingiram a ilha - Getty Images - Getty Images
Noite de terror: além dos ventos, ondas de mais de três metros atingiram a ilha
Imagem: Getty Images

Quando estava no local, as ondas do mar também já estavam altas e começaram a invadir a casa. Para se abrigar do vento e do mar, eles foram para o banheiro, que era uma estrutura de concreto.

Ficamos 15 pessoas em um banheiro com a água no pescoço. Achando que íamos morrer e que aquilo seria o fim"

Por volta das seis horas da manhã, a chuva já tinha parado e os ventos estavam perdendo força. Até que resolveram sair e se depararam com o cenário de guerra. Segundo Jan, parecia que uma bomba atômica havia passado pela ilha.

Albergues e pousadas destruídos

Como a ilha vivia exclusivamente do turismo, pessoas que tinham pousadas no local também foram prejudicadas. O casal Kildren Roinson Bryan, de 36 anos, e Sumaya Brett Lever, 35, moravam na mesma parte em que tinham um albergue e, depois do furacão, quase tudo ficou destruído.

Pousadas, hotéis, restaurante e casas foram abaixo com o furacão em Providência - Sumaya Brett - Sumaya Brett
Pousadas, hotéis, restaurante e casas foram abaixo com o furacão em Providência
Imagem: Sumaya Brett

No dia do fenômeno, eles não acreditaram que o ciclone chegaria à categoria 5. Poucas horas depois o cenário mudou completamente. Todos da família desceram para o primeiro andar da casa e ficaram juntos.

Eles chegaram a acreditar que morreriam naquela noite: "Estava chorando muito e minha filha também. Ficamos todos juntos e abraçados", relembra Sumaya.

No dia seguinte, quando conseguiram sair do pouco que havia sobrado de suas casas, o cenário foi de impacto. "Estava tudo abaixo, casas desapareceram", diz Kildren.

Cena após o furacão, em 2020: muitos moradores passaram mais de um ano morando em tendas improvisadas  - Sumaya Brett - Sumaya Brett
Cena após o furacão, em 2020: muitos moradores passaram mais de um ano morando em tendas improvisadas
Imagem: Sumaya Brett

Depois da passagem do Iota, eles precisavam recomeçar e reerguer sua casa. Porém, como era muito difícil chegar materiais de construção e outros serviços, precisaram ficar quase um ano vivendo com tendas de plástico servindo como paredes, além de se alimentar com comida enlatada. Segundo Kildren, essa foi a fase mais difícil ao longo dos dois anos em que a ilha permaneceu fechada para o turismo.

"Algumas pessoas dormiram em barracas por um ano e não tinham dinheiro para reconstruir as casas. Nós recebemos a ajuda de alguns amigos e também tínhamos um pouco de dinheiro", diz o morador, que hoje conseguiu reconstruir sua pousada chamada Ashanty.

Novembro de 2020: moradores evacuam a ilha de Providência após o furacão Iota - Getty Images - Getty Images
Novembro de 2020: moradores evacuam a ilha de Providência após o furacão Iota
Imagem: Getty Images

Reabertura da ilha

O processo para limpeza da ilha começou alguns dias depois do Iota chegar ao local. Caminhões e soldados do exército eram responsáveis pela limpeza e reconstrução desse território colombiano.

Eles recolhiam os entulhos e levavam para os caminhões, mas ainda ficou escombro na região. Era impossível receber algum turista dessa forma. Demorou muito para tudo ficar de pé outra vez" Kildren Roinson Bryan

Algumas pessoas receberam doações do governo e de amigos para reerguer suas casas. Mesmo o turismo sendo a principal fonte de renda do local, a preocupação era recuperar primeiro seus pertences e depois o espaço para turismo.

E foi somente depois de dois anos que a ilha, de fato, abriu para receber alguns turistas que queriam conhecer Providência. Muitos deles estavam interessados em visitar o espaço por causa do mergulho, que é uma das principais atrações do lugar, além das praias.

As empresas de mergulho já voltaram a se restabelecer na ilha de Providência, preparadas para os visitantes - Anadolu Agency via Getty Images - Anadolu Agency via Getty Images
As empresas de mergulho já voltaram a se restabelecer na ilha de Providência, preparadas para os visitantes
Imagem: Anadolu Agency via Getty Images

"Tivemos que reconstruir a ilha. Eu trabalho com turismo há 23 anos e, aos poucos, fomos cuidando das casas, da fauna e dos pescadores. Fizemos o parque nacional de observação, e estrangeiro gosta de Providência e muitos buscavam por causa do mergulho", diz Jan , que trabalha cuidando do parque e região de Cayo Cangrejo.

Kildren também conta que, no meio do ano passado, a ilha pretendia fazer uma festa típica, como se fosse um Carnaval local, o que atraiu muitos turistas de San Andrés. Mesmo com pouca infraestrutura, eles conseguiam disponibilizar alguns quartos para quem buscava se hospedar na ilha, que eram em maioria gringos.

"A ideia é melhorar aos poucos e que o governo entenda que precisamos investir em turismo sustentável", opina Jan.

Pescadores, guias de passeios e proprietários de estabelecimentos turísticos passaram dois anos reconstruindo a vida na ilha de Providência - Anadolu Agency via Getty Images - Anadolu Agency via Getty Images
Pescadores, guias de passeios e proprietários de estabelecimentos turísticos passaram mais de dois anos reconstruindo a vida na ilha de Providência
Imagem: Anadolu Agency via Getty Images

Providencia precisa de turistas

Depois dos danos causados pelo furacão, Providencia ainda tenta se recuperar por completo.

A ilha já tem restaurantes, hotéis e pousadas para atender os turistas. Alguns serviços, em baixa temporada, são um pouco limitados, mas nada que uma pessoa local não o ajude ou informe onde há o melhor lugar para comer, um mercado próximo ou outros lugares.

Mas não vá esperando resorts ou hotéis de luxo, pois isso —mesmo antes do furacão— não era oferecido ao viajante que chegava ao arquipélago.

Aos poucos, os turistas estrangeiros estão voltando a Providência - Anadolu Agency via Getty Images - Anadolu Agency via Getty Images
Aos poucos, os turistas estrangeiros estão voltando a Providência
Imagem: Anadolu Agency via Getty Images

A região é conhecida por ter uma pegada "mais roots" e de muita calmaria. Além de ser mais vazia do que a famosa San Andrés, a ilha é pequena e com turismo responsável o que, para alguns, pode ser um atrativo.

A brasileira e coordenadora de marketing Jessica Rodrigues visitou o local em maio deste ano e confirma o diferencial da região:

Me surpreendeu muito positivamente no quesito belezas naturais. Para quem gosta de praia é um dos locais mais lindos que eu já vi e com mar mais límpido e cristalino"

Segundo a jovem, a hospitalidade e gentileza dos moradores também faz toda diferença. "Apesar de sermos turistas, nos trataram muito bem tanto nos restaurantes, barracas da praia e hotéis. Todos são muito solícitos e eles mostram que estão felizes de fato por estarmos lá e ajudarmos a desenvolver o turismo novamente", destaca.

Providência volta a sorrir: a ilha colombiana retorna turismo com a simpatia habitual - Getty Images - Getty Images
Providência volta a sorrir: a ilha colombiana retorna turismo com a simpatia habitual
Imagem: Getty Images

O único ponto "negativo" para ela foi o deslocamento para chegar até lá e a infraestrutura da ilha que, aos poucos, está voltando a ser como era antes.

"Eu sei que tem bastante coisa que está retomando, mas se eu voltasse ficaria mais perto do centro e mais perto dos restaurantes. Fiquei muito afastada e só tinha uma opção para comer. Essa parte era ruim. Mas acredito que ainda tem muita margem de crescimento", diz.

Os preços ainda são vantajosos, principalmente para turistas brasileiros, já que o peso colombiano é mais desvalorizado frente ao real.

Providência tem como principal atrativo o 'mar das sete cores' e o mergulho - Anadolu Agency via Getty Images - Anadolu Agency via Getty Images
Providência tem como principal atrativo o 'mar das sete cores' e o mergulho
Imagem: Anadolu Agency via Getty Images

Como chegar

Vale lembrar que Providencia está mais perto da América Central do que da costa colombiana.

O jeito mais fácil de chegar a Providencia é indo até San Andrés, outra ilha na Colômbia, e de lá pegar um voo ou ferry boat (catamarã). Neste último, é necessário conferir os dias de partida e horários. Geralmente, há duas saídas em dias específicos e o trajeto leva, em média, quatro horas.

Já para quem deseja ir de avião, o recomendado é comprar um voo que sai três vezes por dia, também em datas específicas. Normalmente, quem opera a rota é a companhia aérea Satena e o trajeto leva 50 minutos. No entanto, vale conferir as regras dessa empresa, pois há restrições com check in online e malas.