Argentina virou 'Mulher-Maravilha' dos vinhos por acaso e coleciona prêmios
42 anos de carreira, primeira enóloga profissional da Argentina, pioneira no mercado de exportação de vinhos argentinos e embaixadora da viticultura no mundo: esta é Susana Balbo.
A lista de prêmios e honrarias é enorme: em 2008, foi escolhida pela BeM Management Escola de Bordeaux como mentora para o programa de MBA em vinhos; em 2012, foi a única argentina a ser reconhecida pela revista britânica "The Drinks Business" como uma das 50 mulheres mais poderosas do mundo do vinho; em 2015, esta mesma revista distinguiu-a como a "Mulher do ano"; em 2020, o jornalista britânico Tim Atkin a descreveu como "Lenda da Enologia".
Este ano, Susana Balbo conquistou mais uma importante premiação na carreira: a edição de 2023 do Guia Descorchados, publicação que avalia vinhos e vinícolas na América do Sul, a consagrou como a Vinícola do Ano.
Chegar ao Olimpo enológico, porém, não foi tarefa fácil para Susana, que tinha o sonho de estudar física nuclear na adolescência. O vinho veio em 1981, como uma "segunda opção" diante da instabilidade política que a Argentina enfrentava durante um governo militar.
"Talvez, na física nuclear, eu teria me encontrado em um mundo mais restrito e virado um rato de laboratório, não sei. Na enologia, descobri facetas da minha personalidade e da minha pessoa que certamente não teria descoberto no mundo científico.", conta em entrevista exclusiva a Nossa.
Na adega, na política
Formada primeira enóloga na Argentina teve como sua colega de turma somente mais uma mulher: a brasileira Regina Ferreto.
"Naquela época, as mulheres eram percebidas apenas como capazes de trabalhar no laboratório realizando tarefas analíticas. Então não foi muito fácil".
Abri muitas portas para muitas mulheres enólogas, mas lamento que não existam muitos mais enólogas que se atrevam a iniciar o seu próprio projeto e a arriscar, como eu fiz. Não herdei nada, nem tive capital para me sustentar: foi simplesmente uma corrida de coragem e confiança, conta.
Apesar da evolução na área para profissionais mulheres Susana não nega que ainda existe muito preconceito, mas não trabalha somente pela via da produção. Susana foi presidente em três períodos diferentes da Wines of Argentina (WOFA) e trabalhou até como senadora.
"Aquela ilusão de que as coisas poderiam mudar me fez comprometer. Porém, percebi que a política é uma corporação, e que para fazer parte dela é preciso renunciar a muitas coisas relacionadas a valores pessoais, e não estou disposta a trocar meus valores para ter um cargo", diz.
Por não renunciar à vida pessoal, Susana uniu o pioneirismo no vinho à rotina familiar e hoje sua marca é tocada ao lado dos filhos.
Família é tudo. Acho que é a melhor realização que tenho como ser humano, afirma.
E não foram poucas as vezes em que as diferenças trabalhistas influenciaram o ambiente familiar, conta, "mas hoje posso dizer que estou vivendo um dos melhores momentos da minha carreira, da minha família e da relação com meus filhos".
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Quero receberVinícola premiada e vinhos "perfeitos"
Susana não nega: a consagração pelo Descorchados como Vinícola do Ano foi "uma carícia à alma", como ela mesma afirma.
"Esse reconhecimento é fantástico para todos nós que trabalhamos há muitos anos. Falamos de qualidade 360°, porque fazemos vinhos e procuramos oferecer produtos com a máxima qualidade que podemos oferecer em cada colheita, mas também oferecemos serviços que devem ser igualmente perfeitos", conta.
Ou seja, um container deve sair no horário, a papelada deve estar em ordem, tudo deve estar em bom estado para que o cliente não tenha reclamações. Um dia que se perde num escritório não é apenas um problema para nós, mas também para o cliente que está à espera daquele vinho.
A qualidade também é demonstrada por ter rastreabilidade desde o vinhedo até a garrafa e trabalhar com padrões de qualidade de exigência internacional para os quais somos auditados externamente.
Não estamos descansando sobre os louros, isso é um risco. Quando as coisas estão indo bem, não é sinal de que não há nada para melhorar. Há sempre algo para melhorar, afirma.
O futuro não é (sempre) tinto
Susana vislumbra um futuro que muitos entusiastas do vinho argentino podem estranhar. "Queremos ser clássicos, mas ao mesmo tempo inovadores", crava.
Nesse sentido, a adega de Susana é a que mais inova nos vinhos brancos e rosés, que mais exporta brancos em relação aos tintos. Para se ter uma ideia, dos vinhos que a Argentina exporta, 87% são tintos e apenas 13% são brancos. Já a empresa exporta 54% dos vinhos tintos e 46% dos vinhos brancos e rosés.
Nossa intenção é que quando alguém pensar em um bom vinho argentino, pense em nossos vinhos, planeja.
E foi com a torrontés, uva branca comum na Argentina, que a vinícola conquistou ouro em sua categoria no Descorchados 2023 com seu Susana Balbo Signature Limited Edition Torrontés de Raíz Naranjo.
Segundo Susana, tudo fruto de um trabalho de mais de 40 anos. "De certo modo, me deixou triste ver alguns vinhos laranjas elaborados com torrontés que eram defeituosos e que não eram uma expressão de um bom vinho laranja, que é aquele branco fermentado com as cascas", afirma.
Provavelmente sou da velha escola, na qual engarrafar vinhos com defeito não era uma opção. Para mim, os vinhos têm que ter qualidade, porque é uma forma de respeitar o consumidor, afirma.
Apelidada de Rainha do Torron-té (que seria traduzido como torron-chá), Susana se derrete ao falar da uva que ainda ganha desconfiança de alguns por sua exuberância frutada.
Para ela, a torrontés oferece versatilidade, como poucas: de sumos sem álcool a vinhos pouco alcoólicos com aromas interessantes, ou vinhos naturalmente doces para jovens e até mesmo vinhos um pouco mais sérios e fermentados em barricas de carvalho. "Suas possibilidades são infinitas", diz.
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