Esporotricose em gatos tem cura e posse responsável é chave para prevenção
Juliana Finardi
Colaboração para Nossa
19/10/2023 04h00
Há pouco mais de dois meses, Pietro vive isolado em um quartinho nos fundos da casa da família que o adotou. Apesar de já ter saído do período crítico quando tinha feridas abertas e purulentas e de apresentar um quadro de melhora progressiva, ainda sofre com doses diárias de antifúngicos fortes, antibióticos, além de um remédio protetor para o fígado.
O isolado protagonista dessa história é um simpático gatinho preto em tratamento de esporotricose (a doença causada pelo fungo Sporothrix brasiliensis, atualmente em descontrole em alguns estados do Brasil e países da América do Sul), que acomete não só felinos como ele, mas também cães e humanos e já foi relatada entre equinos, bovinos e roedores.
Pelo fato de o fungo estar presente no ambiente e de forma mais comum na terra e em troncos de árvores é que existe a falsa ideia de ser uma "doença de gatos", já que os felinos têm o hábito de afiar as garras em troncos e de enterrar seus dejetos, adquirindo assim o fungo com mais facilidade nas unhas.
Há uma predileção da espécie brasiliensis pelo felino, mas há esse gênero de fungo em plantas, espinhos de flores, minas. Inclusive, é uma doença considerada ocupacional inclusive pelos jardineiros. O gato é uma vítima da doença e não o culpado, explica a veterinária dermatologista Ana Claudia Balda, diretora da escola de medicina veterinária da FMU e sócia proprietária da clínica Derme for Pets.
Ela também afirma que os gatos não castrados acabam se envolvendo mais em brigas pelas fêmeas e dessa forma inoculam o fungo na pele de outro gato pela arranhadura. A doença pode ser transmitida por arranhadura, mordedura ou contato com a lesão de pele.
Foi o que provavelmente aconteceu com o Pietro antes de ser adotado pela professora Erica de Liandra Salvador, 42 anos, que foi quem notou as primeiras feridas na pele do gatinho, mas achou que fossem machucados comuns. O ritmo acelerado com que as feridas pioraram e o estado de fraqueza repentino apresentado pelo bichano a fizeram procurar um veterinário com urgência.
Após alguns equívocos no início do tratamento e a partir da adoção de um novo protocolo, Pietro voltou a alimentar-se e começou a melhorar (dos 5 kg que pesava saudável, o gatinho chegou a um quadro de fraqueza com 3,7 kg).
Ele chegou a sofrer até mesmo com o toque da veterinária nas feridas mais profundas e infeccionadas. "Eles sentem bastante desconforto, principalmente quando a ferida está infeccionada. Quando comecei a atendê-lo, não conseguia nem encostar nele porque todo lugar ficava com muito pus, estava bem feio e ele reclamava bastante", diz a veterinária especialista em felinos, Thais Santana Sousa, proprietária da clínica Pulo do Gato, em São Bernardo.
Na próxima semana, durante mais uma visita ao consultório da doutora que trata do caso do Pietro, é que a Erica vai saber sobre os próximos passos, principalmente quando vai poder voltar a aproximar o bichano de sua irmã mais velha, a gatinha Fiona, e dos humanos, ansiosos pela convivência tranquila e saudável com o gatinho, sem medo de contaminação.
Posse responsável é o pulo do gato
Veterinários, especialistas e tutores entrevistados nesta reportagem são unânimes em afirmar que a posse responsável é a solução para minimizar consideravelmente o problema.
Não abandone seu animal se ele estiver com esporotricose, o tratamento é longo mas existe. Coloque telas de proteção nas janelas para evitar que os gatos saiam de casa. Às vezes o gato sai e pode brigar com outros gatos, então ajuda também, diz Fernanda Gutierrez, médica-veterinária da DrogaVET, rede de farmácias de manipulação veterinária.
Como a doença acomete geralmente animais não castrados, é importante destacar a castração. "Acho importante falarmos sobre como a castração impede o gato de sair de casa e se expor ao fungo, a posse responsável também é algo importante nesse contexto, já que vai reduzir bastante esse risco", afirma Ana Claudia.
Manter o ambiente sempre limpo, visitas regulares ao veterinário e a investigação de lesões observadas na face, patas, perto das unhas e rabo devem ser prioridades.
Cura é realidade
Normalmente, os gatinhos ficam curados após o tratamento, que pode ser muito bem sucedido na maioria dos casos.
"Existe tratamento, é importante que o tutor leve seu animal o mais rápido possível para avaliação do médico veterinário, pois quanto mais cedo começamos a tratar melhor o prognóstico. Há uma correlação da espécie brasiliensis com resistência fúngica, mas de qualquer forma existem alternativas terapêuticas que o médico veterinário pode orientar e sim, a maior parte dos animais, se tratados da forma correta podem ser curados", finaliza Ana Claudia.
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