Sem nudes, com Naomi: Calendário Pirelli celebra África surreal e colorida
Quando se fala em Calendário Pirelli, é inegável que ainda resiste o imaginário de 12 meses ilustrados por belíssimas mulheres com pouca ou nenhuma roupa. Para a edição 2024, assim como em outras recentes, a proposta é diferente. Desta vez, coloridíssima e vinda direto da África.
Pela segunda vez estrelado por um elenco totalmente negro, o "The Cal" agora também trouxe a diversidade para o outro lado das câmeras.
Se em 1987, Terence Donovan trouxe a nudez de Naomi Campbell com 16 anos, pelas lentes do fotógrafo ganês Prince Gyasi (o primeiro africano dos 60 anos de história do calendário), a top model é a musa maior em um cenário inspirado em Salvador Dalí.
"Minhas referências são as artes plásticas, não a fotografia. Se você ama ambos, vai adorar meu trabalho. Quero estar no meio disso tudo e ressignificar as imagens com significado", conta o fotógrafo aos jornalistas que estiveram no lançamento do calendário essa semana em Londres.
Aos 28 anos, Prince foi revelado ao mundo com fotos feitas pelo smartphone e ganhou o coração de nomes como Virgil Abloh por suas fotos sinestésicas, em que cores fortíssimas têm um significado crucial - o fotógrafo tem na ponta da língua, por exemplo, que o pink é 'esperança' e que seus últimos três anos foram azul.
Sua Gana colorida é também um chamado para o país mais pacífico do continente. "Para mim, nossas marcas são a paz e a hospitalidade".
Da realeza da ficção à real
Além de Naomi, outros "super heróis atemporais" de Prince estampam a publicação, como o artista visual Amoako Boafo, a escritora Margot Lee Shetterly, o jogador de futebol Marcel Desailly e as cantoras Tiwa Savage e Teyana Taylor.
Mas há também reis e rainhas, como a atriz Angela Bassett - a rainha Ramonda de "Pantera Negra".
"Quando eu era criança, não havia uma celebração da identidade negra e a nossa contribuição cultural. Porém, fui aquela que procurou essas referências. Até que veio o dia em que surgiu essa celebração, ainda que ameaçada muitas vezes", revelou na rodada de entrevistas a jornalistas.
Prince tem uma sensibilidade diferente e moderna. É um ar fresco, diz a atriz.
Um outro enorme destaque do calendário é um rei, desta vez de verdade. Em um gesto inédito, o Rei Otumfuo Nana Osei Tutu 2° do Império Ashanti aceitou posar para as lentes de Prince, a quem chama de neto e contou em um vídeo gravado por um emissário que vê o trabalho do fotógrafo uma oportunidade de mostrar a cultura e os valores ganeses.
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Aos brasileiros que acompanham ano a ano o lançamento do icônico calendário, um aviso: o Brasil pode não estar presente em paisagem e elenco, mas o espírito está garantido.
"Por que é proibido pisar na grama?", é sorridente e cantarolando Jorge Ben Jor que ele diretor e multiartista britânico Jeymes Samuel conta que seu primeiro contato com o calendário de 2003. Irmão do cantor Seal, prestigiou a presença da ex-cunhada Heidi Klum nas fotos.
"O processo criativo para a minha participação foi todo de Prince. Ele me imaginou como este visionário, meio cientista maluco. E acho que ele acertou em cheio. Fiquei cool", diz. "Foi uma liberdade ser dirigido por outra pessoa e estar totalmente livre", conta.
Apesar de ser surrealista, o calendário com a visão de Prince oferece uma visão apurada do mundo. O mundo é super colorido e nós que dessaturamos as cores e nos dividimos em brancos e negros. Tornamos tudo tão mundano e chato, filosofa.
O futuro é preto, colorido, mas não por IA
Outra musa inspiradora de Prince é a poetisa Amanda Gorman, que ficou famosa após seu discurso na posse de Joe Biden.
Uma mulher das palavras, ela se vale do ditado "uma imagem vale por mais de mil palavras" para explicar porque aceitou o desafio de ser modelo por algumas horas.
"Adoro que na foto representamos 'The Blueprint' (O Projeto), que para mim é um céu azul, o futuro. Azul para mim é a cor da esperança. Adoro a linguagem das cores que Prince propõe", se derrete.
Há tanto que pode ser dito em moda e imagem que não é revelado em poesia. Espero demonstrar nas minhas roupas e na minha imagem também o que eu quero dizer, diz.
Ativista, Amanda acredita que a abordagem global do calendário pode se sobressair à nuvem caótica das redes sociais e apresentar para o mundo a identidade da África e da diáspora do continente.
O debate "semiótico futurista" também é tema para Marco Tronchetti Provera, CEO da Pirelli, que defende a evolução do calendário com os temas e discussões atuais - "a África é o futuro", afirma.
Provocado se o "The Cal" poderia ser feito por inteligência artificial nas próximas edições, ele é categórico: "Faremos tudo para evitar. São pessoas fazendo coisas para outras pessoas".
*A jornalista viajou a Londres a convite da Pirelli
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