Qual a cidade mais antiga dos Estados Unidos? Faça esta 'volta no tempo'
Por Natália Manczyk
Colaboração para Nossa, dos Estados Unidos
07/02/2024 04h05
O forte de pedras Castillo de San Marcos se esparrama em um pequeno morro de frente para o mar protegendo a cidade desde 1695. A uma quadra dali, colunas de pedra dos antigos portões da cidade ainda enfeitam a rua junto de coloridas casas coloniais espanholas com suas sacadinhas românticas e de ruelas tão estreitas a ponto de mal caber um carro que seja.
Poderia facilmente ser qualquer colônia espanhola caribenha — Cartagena, San Juan, Santo Domingo e por aí vai — mas o mais incrível é que esse clima de cidade histórica está na Flórida, à beira-mar, e é tudo real: nada de cidade cenográfica.
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Saint Augustine, a cerca de duas horas de Orlando, é conhecida como a cidade mais antiga dos Estados Unidos. Na verdade, é a mais antiga dos Estados Unidos continental, já que San Juan, a capital de Porto Rico, foi fundada pouco antes, em 1521, enquanto Saint Augustine viu chegarem os espanhóis em 1565. Independentemente de quem ganha o superlativo, Saint Augustine é daquelas cidades graciosas e diferente de qualquer outro pedaço no país.
O centro histórico é mantido com capricho: por lá você não vai ver as avenidas largas norte-americanas. As vias com seis faixas, os semáforos e os prediões ofuscantes parecem coisa de lugar bem longe dali: o que é a cara dessa cidade da Flórida são as ruazinhas que até hoje seguem o traçado original do século 16.
Na rua principal, a St. George Street, não espere esbarrar em Walgreens, CVS, McDonald's e mais todas aquelas lojas americanas de sempre. Ela é rua só para pedestres, com lojas, galerias, cafés, padarias, bares e restaurantes, tudo local.
Para manter o clima e o charme, inclusive foi instituído um padrão de cores, tipografias e símbolos, e, convenhamos, um McDonald's destoaria do ambiente ou teria que mudar toda a sua identidade visual para se adequar ao charme.
A praça principal, a Plaza de La Constitución, também segue essa toada. Não é praça pontuada por prédios monumentais nem coroada por uma loja da Apple envidraçada. O mais antigo espaço público do país merece ser especial: está mantido quase como o original, formado em 1573.
Ou seja, é uma autêntica praça espanhola, com uma casa do governo (inclusive usada ininterruptamente desde 1598) e uma igreja — afinal, a ideia era converter a população local ao cristianismo. A igreja original, do século 16, foi destruída, mas está lá a basílica catedral que enfeita a praça desde 1797.
Além de cidade histórica, Saint Augustine ainda tem sorte com a paisagem. Está entre o Oceano Atlântico e o Rio Matanzas, o que significa que os dias também envolvem aproveitar 68 km de praias praticamente selvagens, um fim de tarde com vinho branco e frutos do mar na beira do rio, trilhas pela mata tropical e passeio de caiaque.
Hotéis especiais
Não existe um prêmio oficial para isso, mas se houvesse, a esquina onde estão o Flagler College e o Lightner Museum ganharia como o ponto mais bonito de Saint Augustine.
O motivo é justamente a arquitetura dessas duas construções. As duas são imponentes e parecem mais palacetes. Foram construídas como hotéis no século 19 por um dos grandes magnatas da época, Henry Flagler, que tinha um projeto ambicioso: transformar a costa de Saint Augustine em uma Riviera Francesa.
Ele é considerado um dos idealizadores da Flórida atual e quem desenvolveu muito da infraestrutura de transporte, turismo e agricultura vista hoje em dia. Ainda que as medidas fossem controversas: ele, por exemplo, destruiu as antigas muralhas de Saint Augustine (as duas colunas de pedras que marcavam a entrada foram salvas) e chegou a planejar construir um campo de golfe no lugar do antigo forte.
Os dois edifícios bonitos feitos por Flagler estão um na frente do outro. O Flagler College, hoje uma faculdade, foi o antigo hotel Ponce de León, que, erguido em 1888, mais parece um palacete mouro do sul da Espanha ou do Oriente Médio.
E não é só pela arquitetura que veio essa importância toda: Flagler era tão influente que o hotel Ponce de León foi um dos primeiros edifícios dos Estados Unidos a ser abastecido com energia elétrica — gerada pela Edison Illuminating Company, empresa do amigo famoso, Thomas Edison, o inventor da lâmpada elétrica. Pode parecer algo comum hoje em dia, mas o hotel Ponce de León foi ainda o primeiro hotel do mundo a ter energia elétrica em cada quarto.
Decidido a desenvolver a região, Flagler, na época o mais rico do país, construiu em 1889 mais um hotel: o Alcázar, como uma alternativa para o Ponce de León, em frente. No Alcázar, o destaque é a estrutura.
Como nos Estados Unidos tem-se um superlativo em cada esquina, o Alcázar chegou a ter a maior piscina interna do mundo no século 19, além de quadras de tênis e banhos turcos e russos. Hoje em dia, virou o Lightner Museum, dedicado a antiguidades e eletricidade.
Mesmo que você não saiba do passado como hotel, não é difícil adivinhar: os objetos estão espalhados pela mesma estrutura, o que significa que você vai passando por exposições entre as portas numeradas das suítes e pelos antigos corredores.
Uma bela proteção
Já deve ter ficado clara a diferença de Saint Augustine para as cidades mais típicas dos Estados Unidos. Mas, para jogar na cara de vez o quão encantadora é Saint Augustine dá para acrescentar algo nessa lista: o centro histórico totalmente andável com suas casas do século 17 — pois é, embora a cidade seja dos anos de 1500, boa parte das casas originais foi queimada em uma invasão dos piratas.
Ao contrário da maioria das cidades do país, é mais fácil e prático deixar o carro na garagem do hotel. Seguindo (a pé, claro) da praça principal pela rua do agito, a St. George, você chegará no símbolo de Saint Augustine: o Castillo de San Marcos, forte com tudo o que se tem direito: ponte, fosso, canhões e a vista para o mar.
O forte não é uma estrutura com um passado e ponto, sem vida. No topo, foram colocados até bancos como os de praças porque não tem quem não queira mesmo passar um bom tempo sobre o forte de pedras só vendo o mar.
A posição escolhida foi estratégica para permitir que os soldados avistassem todo o horizonte e possíveis invasões dos britânicos. Hoje em dia, os turistas têm a mesma visão panorâmica dos soldados de séculos atrás, com a diferença que agora é sem preocupação.
Exposições no forte contribuem para todo mundo imaginar as cenas de outros séculos por lá: mostram a rotina dos soldados, como o alojamento original, objetos e os muros rabiscados por eles com mensagens e desenhos.
Saint Augustine do alto
Embora o Castillo de San Marcos marque Saint Augustine, há mais um forte não tão conhecido, mas com uma visita tão interessante quanto: o Fort Matanzas National Monument. Foi construído em 1740 pelos espanhóis na margem do Rio Matanzas como forma de bloquear mais uma possível entrada dos invasores — ou viriam por mar ou por rio.
Só é acessível de barco e, por isso, a ida até lá acaba sendo também um gostoso passeio, que fica ainda melhor por ser tudo gratuito: tanto o barco quanto a entrada no monumento, sempre guiada.
Como tantas outras construções de Saint Augustine, as paredes são feitas de coquina, uma rocha compactada feita de conchas e fósseis que acaba sendo a cara da cidade. O forte é mais um com um visual lindo para o rio, mas nada se compara à vista do topo do Farol de Saint Augustine, esse mais perto da praia do que do centro histórico.
Você deve ir preparado para subir 219 degraus até o topo do farol de 1874, construído no lugar do original de 1565. Como os americanos sabem fazer turismo, nem dá para sentir a subida: a cada andar eles incluíram placas divertidas com curiosidades sobre o farol.
Do alto, ao ar livre, enfim você vai entender (e, principalmente admirar) toda a geografia de Saint Augustine: a cidade mais antiga dos Estados Unidos continental, construída entre o rio e o mar, entre florestas protegidas e dunas, que se tornou um pedaço tão especial dos Estados Unidos.