Camarão-tigre-gigante custa R$ 598 o quilo e chega a restaurantes do Brasil
Flávia G. Pinho
Colaboração para Nossa
16/02/2024 04h05
Imagine um camarão gordo e carnudo, de casca listrada, que pode passar dos 30 centímetros de comprimento e pesar quase meio quilo. Esse crustáceo tamanho família, popularmente conhecido como camarão-tigre-gigante, começou a aparecer no mundo da gastronomia no fim de 2023.
Desembarcou timidamente, sem muito alarde, nos cardápios dos restaurantes Adega Santiago e Taberna 474, que pertencem ao empresário Ipe Morais, com unidades em São Paulo e Rio de Janeiro.
Pela raridade, nem sempre está disponível —oferecido como sugestão, aguarda pelo cliente ainda cru, na vitrine, para ser preparado na hora do pedido. A intervenção é mínima. Assado inteiro na grelha, com cabeça, casca e rabo, é finalizado apenas com azeite e flor-de-sal.
Ele é muito diferente, bonito. A gente vê muito em Portugal, mas aqui é novidade. Tem bastante carne, branca e muito saborosa, por isso usamos o mínimo de tempero.
Ipe Morais, empresário
Pela iguaria, vendida por unidade, paga-se bem caro: R$ 59,80 por cada 100 gramas, uma unidade custa em torno de R$ 120. Em função do preço alto, os restaurantes do grupo estão comprando apenas os crustáceos de tamanho médio, que pesam entre 180 e 230 gramas —ainda assim, eles ocupam todo o diâmetro do prato.
O preço nem está assustando tanto a clientela, garante o gerente operacional Fabio de Araújo Costa. "Apenas em janeiro, que é um mês fraco de movimento, as cinco casas do grupo venderam 180 quilos. Em fevereiro, esperamos dobrar o volume."
Vem do Maranhão
Segundo Khadun Lima, proprietário da Khadun Pescados e fornecedor do grupo Adega, os camarões-tigre-gigantes vêm do litoral do Maranhão. Têm sido encontrados a uma profundidade um pouco maior do que o camarão-rosa, mas não chegam a águas tão profundas quanto o camarão-carabineiro, aquele bem vermelho, que virou moda em 2023.
O camarão-tigre-gigante não depende de barco-indústria para ser capturado. É pescado pelas mesmas embarcações de pesca de camarão, mas cada barco traz uma quantidade bem pequena.
Khadun Lima, comerciante.
Segundo ele, o grupo Adega tem ficado com 80% do estoque. O restante é vendido congelado, no varejo, mas só por encomenda. Sai pela bagatela de R$ 320 o quilo —o que significa de quatro a cinco unidades.
Quem fizer uma busca rápida pela internet pode ficar bastante confuso, porque há duas espécies diferentes com o mesmo nome. O camarão-tigre-gigante pescado no litoral maranhense é o Penaeus monodon, de água salgada, enquanto seu homônimo, que vive em água doce, é da espécie Macrobrachium rosenbergii.
Para piorar, ambos são apelidados de camarão da Malásia, referência à sua origem. De acordo com o Centro de Pesquisas Ambientais do Nordeste (Cepan), seu habitat natural é o oceano Indo-Pacífico, que banha o sudeste e o sul da Ásia, o leste da África e a costa norte da Austrália.
Como ele veio parar aqui
Os cientistas concordam em relação à origem, mas diferentes versões explicam como o camarão-tigre-gigante veio parar aqui. Há quem atribua sua presença a um acidente —os espécimes teriam vindo na água de lastro de navios, água essa que foi descarregada sem tratamento, deixando por aqui os bichinhos.
O mais provável, no entanto, é que a espécie tenha sido trazida para ser criada aqui, em cultivos, na década de 1970 —há registros comprovando o fato. Com o fracasso da experiência, os animais teriam sido liberados, ou fugido dos viveiros, e acabaram se reproduzindo naturalmente no nosso litoral.
De uma forma ou de outra, não faz uma década que o camarão-tigre-gigante começou a dar as caras pelo Brasil. Nos últimos 15 anos, pipocaram relatos no Piauí, Pernambuco, Maranhão, Alagoas, Sergipe, Pará e Amapá. Na internet, fotos mostram pescadores orgulhosos segurando o camarão gigante, ou exibindo seu peso assombroso.
Atração turística
O mais sortudo deles, até agora, foi o pescador Gabriel Silva, de Tibau, no Rio Grande do Norte. Em 2021, ele ficou famoso ao puxar a rede e encontrar um exemplar turbinado —tinha cerca de 50 cm de comprimento e pesava mais de 400 gramas. Para provar que não era história de pescador, seu Gabriel fez circular a foto do crustáceo em cima da balança —e sua casa virou até atração turística.
Embora o camarão-tigre-gigante não esteja classificado oficialmente como uma atividade de pesca pelo Ministério da Pesca e Aquicultura, não é difícil encontrá-lo nas comunidades tradicionais pesqueiras da região norte.
Segundo o biólogo Alex Klautau, coordenador do Centro Nacional de Pesquisa e Conservação da Biodiversidade Marinha do Norte (Cepnor), localizado em Belém (PA), o crustáceo é vendido em beira de estrada. "Como ele parece uma lagosta, os pescadores colocam bem em cima dos outros. O preço é por litro - R$ 50 por quantos camarões couberem dentro da garrafa. Por ser grande, devem caber uns dois apenas."
Fez as contas? Dá R$ 25 por cada camarão-tigre-gigante, uma pechincha que vale a viagem.